REVISTA
PAULISTA
DE
PEDIATRIA
www.rpped.com.br
ARTIGO
ORIGINAL
Dor
dentária
e
fatores
associados
em
pré-escolares
brasileiros
João
Gabriel
Silva
Souza
a,∗e
Andrea
Maria
Eleutério
de
Barros
Lima
Martins
baDepartamentodeCiênciasFisiológicas,FaculdadedeOdontologiadePiracicaba,UniversidadeEstadualdeCampinas,
Piracicaba,SP,Brasil
bDepartamentodeOdontologia,UniversidadeEstadualdeMontesClaros,MontesClaros,MG,Brasil
Recebidoem17deagostode2015;aceitoem2dedezembrode2015 DisponívelnaInternetem17defevereirode2016
PALAVRAS-CHAVE Dor; Crianc¸a; Cáriesdentárias; Saúdebucal Resumo
Objetivo: Descreveraprevalênciadadordentáriaem pré-escolaresbrasileiros,assim como
seusfatoresassociados,considerandoumaamostrarepresentativadessecontingente popula-cionalnoBrasil.
Métodos: Estudotransversal,analítico,queusouosdadosdoInquéritoNacionaldeSaúdeBucal
(SB Brasil)feito em 2010. Considerou-seuma amostrarepresentativa de pré-escolarescom 5anos.Foramfeitasentrevistas(respondidaspelosresponsáveis)eexamesclínicosnascrianc¸as. Conduziram-seanálisesdescritivas,bivariadasemúltiplas,descritasemoddsratioeintervalo deconfianc¸ade95%(OR/IC95%).
Resultados: Foramincluídos7.280pré-escolares.Desses,1.520(21,1%)tiveramdordentária
nosúltimos6meses.Achancedaocorrênciadedordentáriafoimaiorentreaquelesqueusaram servic¸osodontológicos (1,51/1,02-2,23),comcárie dentária(3,08/2,08-4,56),perceberama necessidadedetratamentoodontológico(3,96/2,48-6,34),osqueospaisrelatavaminsatisfac¸ão porpartedascrianc¸ascomseusdentesesuaboca(1,47/1,04-2,10)eosquerelataramimpacto dosproblemasbucaisnaqualidadedevida(5,76/3,90-8,49).
Conclusões: Aprevalênciadadordentáriaentrepré-escolaresbrasileirosfoirelativamentealta
eassociadaaousodeservic¸osodontológicoseàscondic¸õesnormativasesubjetivasdesaúde bucal.
©2016SociedadedePediatriadeS˜aoPaulo.PublicadoporElsevierEditoraLtda.Este ´eum artigoOpenAccesssobumalicenc¸aCCBY(http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).
KEYWORDS
Pain; Child; Toothdecay; Oralhealth
DentalpainandassociatedfactorsinBrazilianpreschoolers
Abstract
Objective: TodescribetheprevalenceofdentalpaininBrazilianpreschoolers,aswellasits
associatedfactors,consideringarepresentativesampleofthatpopulationgroupinBrazil.
DOIserefereaoartigo:http://dx.doi.org/10.1016/j.rppede.2016.03.002 ∗Autorparacorrespondência.
E-mail:jgabriel.ssouza@yahoo.com.br(J.G.Souza).
0103-0582/©2016SociedadedePediatriadeS˜aoPaulo.PublicadoporElsevierEditoraLtda.Este ´eumartigoOpenAccesssobumalicenc¸a CCBY(http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).
Methods: Cross-sectionalstudythatusedtheanalyticaldataofthenationaloralhealthsurvey (SBBrazil)carriedoutin2010.ArepresentativesampleofBrazilianpreschoolersaged5years wasconsidered.Interviewswerecarriedout(answeredbyparents/tutors),aswellasclinical examinations inchildren. Descriptive, bivariateandmultivariate analyzes were performed, describedinoddsratiosand95%confidenceinterval(OR/95%CI).
Results: 7,280preschoolerswereincluded.Ofthese,1520(21.1%)hadhaddentalpaininthe
last6months.Thechanceoftheoccurrenceofdentalpainwashigheramongthosewhoused dental services (1.51/1.02to2.23), withtoothdecay(3.08 /2.08to4.56),thatrealized theneedfordentaltreatment(3.96/2.48to6.34),whoseparentsreporteddissatisfactionby childrenwiththeirteethandmouth(1.47/1.04to2.10)andthosewhoreportedimpactof oralproblemsonqualityoflife(5.76/3.90to8.49).
Conclusions: TheprevalenceofdentalpainamongBrazilianpreschoolchildrenwasrelatively
high,beingassociatedwiththeuseofdentalservicesandthenormativeandsubjectiveoral healthstatus.
©2016SociedadedePediatriadeS˜aoPaulo.PublishedbyElsevierEditoraLtda.Thisisanopen accessarticleundertheCCBYlicense(http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).
Introduc
¸ão
A dor dentária tem sido considerada o sintoma, ou con-sequência,maiscomumdapresenc¸adeagravosbucais,tais comocáriedentáriaedoenc¸aperiodontal.1---3AAssociac¸ão
Internacional parao estudodaDor (International Associa-tion for the Study of Pain --- IASP) conceitua a dor como umaexperiênciasensorialeemocionaldesagradável, prove-nientedelesõesteciduais.4Dentreasdoresorofaciais,ade
origemdentáriatemsidoreportadacomoamaisfrequente,5
podeafetarainterac¸ãosociale asatividades cotidianas,6
assimcomoterumimpactonegativonaqualidadedevida.7,8
Ressalta-seque a percepc¸ão dadorpode serinfluenciada peloconhecimentoepelacrenc¸asdaspessoasepelo ambi-enteculturalesocialnoqualestãoinseridos.9,10Diferentes
fatorestêmsidoassociadosàpresenc¸aepercepc¸ãodador dentária, tais como: piores condic¸ões socioeconômicas,9
presenc¸a de cárie dentária,11 dificuldades relacionadas à
alimentac¸ãoedistúrbiosdosono.6Além disso,asua
ocor-rência temsidoapontadacomoumdosprincipais motivos dabuscaporassistênciaodontológica.2,9
A prevalência dador dentária varia bastante entre os diferentesestudose faixasetárias. Estudos internacionais abordamaprevalênciadeepisódiosdedordentáriae apon-tamresultadosquevariamde9%noJapão12(11-15anos)a
40%,emdistritosdeManchester(Inglaterra)(até12anos).13
NoBrasil, essaprevalência tambémévariável, comtaxas entre11%e39%(indivíduosde5-60anos).1,5,11,14---16Dentreos
contingentespopulacionaisinvestigadosemrelac¸ãoaesse acometimentodestacam-seascrianc¸as, principalmenteas deidadepré-escolar.8,15
NoBrasil,ascondic¸õesdesaúdebucaldospré-escolares são preocupantes. Apesar das melhorias modestas regis-tradasnos doisúltimos levantamentosepidemiológicosda populac¸ão,feitosem2002/200317e2010,18comooaumento
emcercade6%decrianc¸asdecincoanoslivresdecárie,tal contingentepopulacionalaindaé acometido porumaalta prevalênciade agravosbucais, taiscomo cáriedentáriae má oclusão.18 Tal fatopodeacarretar alta prevalência de
dordentáriae,consequentemente,impactonegativonasua vidadiária.
Noentanto,osestudosdebasepopulacionalcomamostra representativados pré-escolaresbrasileirose que tenham comotemaadordentáriasãoraros.Portanto,opresente estudotevecomoobjetivodescreveraprevalênciadador dentáriaempré-escolaresbrasileiros,assimcomoseus fato-resassociados.
Método
Estudotransversal,que usouabasededadosdoInquérito NacionaldasCondic¸õesdeSaúdeBucaldapopulac¸ão, deno-minadoSBBrasil,feitopeloMinistériodaSaúdeem2010.18
SeguindooscritériospropostospelaOrganizac¸ãoMundialde Saúdeem1997,19umaamostrarepresentativadapopulac¸ão
brasileiranasfaixasetáriasíndicesfoientrevistadae exami-nadaemseusdomicíliosquantoàscondic¸õesdesaúdebucal, demográficas e socioeconômicas, uso de servic¸os odonto-lógicosequestõessubjetivasdesaúdebucal.Nopresente estudoconsiderou-seaamostradepré-escolares,foram ava-liadasnoSBBrasil2010apenasascrianc¸asde5 anos.
Foram entrevistados e examinados residentes de
177 municípios, incluindo as 27 capitais, das cinco
macrorregiões (Norte,Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul),selecionadospor amostragemprobabilística por con-glomerados, em múltiplos estágios, com probabilidade proporcionalaotamanhoeconsiderandoumefeitode dese-nho(deff) iguala 2.Os 30 municípios em cada região e 30setorescensitáriosparacapitaiseDistritoFederalforam sorteados pela técnica de probabilidade proporcional ao tamanho.20
Osexameseasentrevistasforamfeitospor cirurgiões--dentistaspreviamentetreinadosecalibradospelatécnica doconsenso,ovalormínimoaceitáveldekappaparacada examinador,grupoetárioeagravoestudadofoiiguala0,65. Asentrevistas foramfeitascomauxílio decomputadorde mão(PersonalDigitalAssistant).20
Napresente investigac¸ão usou-seumrecorte dobanco dedadoseforamincluídosnasanálisesospré-escolaresque responderamaquestãoreferenteàpresenc¸adedor dentá-ria.
A variável dependente --- dor dentária --- foi avaliada pela questão: ‘‘Nos últimos 6 meses o Sr (a) teve dor de dente?’’ (Não/Sim). Por se tratar de uma amostrade crianc¸asde5anos,talrespostafoidadapeloresponsável. Dessaforma,foicaracterizadaapresenc¸adedordentária nospré-escolaresapartirdaresposta‘‘sim’’àquestão.
Asvariáveisindependentesforamreunidasemtrês gru-pos: condic¸ões sociodemográficas, servic¸os de saúde e desfechos de saúde (condic¸ões normativas e subjetivas desaúdebucal).Ascondic¸õessociodemográficasavaliadas foram:sexo,etniaautodeclarada, renda familiare região doBrasil.Emrelac¸ãoaosservic¸osdesaúde,considerou-se o usode servic¸o odontológico ao longoda vida. Ressalta--sequeesseusonãonecessariamenteestárelacionadoaos desfechosemsaúdeoucomaocorrênciadedordentária,é caracterizadoousodoservic¸opelomenosumavezaolongo davida.Nosdesfechosemsaúde,acondic¸ãonormativade saúdebucalavaliadafoi apresenc¸a dedentes comcárie. Essaavaliac¸ãofoifeitaapartirdocomponentecariadodo índiceceo-D,noqualsecontabilizaaquantidadede elemen-tosdentáriosdecíduosacometidosporcárie,comextrac¸ão indicadae restaurados.18,19 Em relac¸ão às condic¸ões
sub-jetivasde saúde bucal, avaliaram-se a autopercepc¸ão da necessidadedetratamento,asatisfac¸ãocomdenteseboca eosimpactosdosproblemas bucaisnaqualidadedevida. Devidoàidadedospacientes,essesdadosforamrespondidos pelosresponsáveis.Talimpactofoimensuradopelo instru-mentoOralImpactsonDailyPerformance(OIDP),queavalia oimpactodascondic¸õesbucaisnahabilidadedoindivíduo emdesenvolveratividadesdiárias,21,22sãoconsideradoscom
impactonopresenteestudoospré-escolaresquerelataram ocomprometimentoempelomenosumdosnoveitensque compõeo instrumento.Portanto,foi usadoo escore OIDP dicotomizado(Sim/Não).
Na análise dos dados, empregou-se o software SPSS®
Statistics 18.0 (SPSS, IBM Company, Hong Kong, China). Comoo estudoenvolveuamostracomplexapor conglome-rados,foifeitaacorrec¸ãopeloefeitododesenhoamostral, levaram-se em considerac¸ão o efeito dos conglomerados eaatribuic¸ão deponderac¸õesaoselementos amostrados. Para variáveis categóricas, a análise descritiva incluiu a distribuic¸ão daamostra, frequência relativa corrigida (%) e erro padrão(EP).Para avaliac¸ão dos fatoresassociados aodesfecho(dordentária)foramfeitasanálisesbivariadae múltipla.Naanálisebivariadaforamestimados oddsratio
brutas(ORbruta)e intervalos de confianc¸a de95% (IC95%),
comacorrec¸ãopeloefeitododesenhoamostral.Asvariáveis independentesqueapresentaramníveldescritivomenorou iguala20%(p≤0,20),nessaetapadasanálises,foram sele-cionadas paraa análise múltipla. Na análise múltipla dos fatoresassociadosaodesfecho,apartirderegressão logís-tica(ORajustada/IC95%),foiadotadoníveldesignificânciade
5%(␣=5%).
Olevantamentoepidemiológicofoiconduzindocombase nos princípios éticos da Resoluc¸ão do Conselho Nacional de Saúde n◦ 196/96 e foi aprovado e registrado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), sob o n◦ 15.498/2010.
Resultados
Foram incluídos no presente estudo 7.280 crianc¸as de 5 anos.Dessas,1.520 (21,1%)tiveramepisódiosdedor den-tárianos6 mesesanterioresàcoletadedados.Amaioria dascrianc¸aseradosexomasculino,jáfezusodosservic¸os odontológicoseeralivredecárie(tabela1).
Aanálisebivariadaidentificouquevariáveis pertencen-tesatodasascategorias(sociodemográficas,usodeservic¸os edesfechosemsaúde)mantiveram-seassociadasàdor den-tária (p≤0,20) e foram consideradas na análise múltipla (tabela2).
Naanálisemúltipla,identificou-sequeadordentárianos últimos 6 mesesem crianc¸as aos5 anos foi associada a: nãouso de servic¸osodontológicos(p=0,037); cárie dentá-ria (p≤0,001); percepc¸ão por parte dos pais das crianc¸as
Tabela 1 Análisedescritiva dador dentária, caracterís-ticassociodemográficas, servic¸os desaúdee desfechosde saúdeentrepré-escolaresbrasileirosem2010(n=7.280)
n % EP
Dordentárianosúltimos6meses
Não 5.760 78,9 Sim 1.520 21,1 1,7 Sexo Masculino 3.643 51,9 Feminino 3.637 48,1 1,4 Etnia Branco 3.259 48,5
Amarelo/Negro/Pardo/Indígena 4.021 51,5 2,1
Rendafamiliar Maisde500reais 5.434 78,1 Até500reais 1.526 21,9 1,8 RegiãodoBrasil Centro-Oeste 1.141 8,1 1,1 Sul 917 13,3 2,1 Sudeste 1.283 50,3 4,3 Nordeste 2.145 17,2 2,0 Norte 1.794 11,1 1,4
Usodeservic¸osodontológicos
Não 3.416 46,7
Sim 3.800 53,3 1,6
Dentescomcárie
0 3.624 52,6
1oumais 3.535 47,4 1,8
Autopercepc¸ãodanecessidadedetratamento
Não 3.027 45,8
Sim 3.962 54,2 2,0
Satisfac¸ãodenteseboca
Satisfeito 4.788 71,5
Insatisfeito 2.066 28,5 1,9
ImpactoproblemasbucaisnaQV
Não 5.510 74,8
Sim 1.770 25,2 2,2
Tabela2 Análisebivariadadosfatoresassociadosàdordentáriaempré-escolaresbrasileirosem2010 Presenc¸adedordentária
% ORbruta IC95% p-valor
Sexo
Masculino 21,6 1,00
Feminino 20,7 0,94 0,72-1,23 0,694
Etnia
Branco 18,5 1,00
Amarelo/Negro/Pardo/Indígena 23,6 1,36 1,06-1,75 0,016
Rendafamiliar Maisde500reais 18,6 1,00 Até500reais 30,0 1,87 1,39-2,51 0,000 RegiãodoBrasil Centro-Oeste 23,4 1,00 Sul 17,4 0,68 0,44-1,06 0,094 Sudeste 19,6 0,80 0,55-1,15 0,237 Nordeste 24,4 1,05 0,80-1,37 0,688
Usodeservic¸osodontológicos
Não 17,6 1,00
Sim 24,4 1,51 1,16-1,96 0,002
Dentescomcárie
0 7,8 1,00
1oumais 35,5 6,48 4,76-8,83 0,000
Autopercepc¸ãodanecessidadedetratamento
Não 5,2 1,00
Sim 35,3 10,02 6,36-15,76 0,000
Satisfac¸ãodenteseboca
Satisfeito 12,9 1,00
Insatisfeito 42,0 4,90 3,76-6,40 0,000
ImpactoproblemasbucaisnaQV
Não 10 1,00
Sim 54,2 10,63 7,58-14,91 0,000
ORbruta,oddsratiobruta;IC95%,intervalodeconfianc¸ade95%;QV,qualidadedevida.
denecessidadedetratamento(p≤0,001);relatopelospais deinsatisfac¸ãodascrianc¸ascomdenteseboca(p=0,029)e impactodosproblemasbucaisnaqualidadedevidasegundo oinstrumentoaplicado(OIDIP---p≤0,001)(tabela3).
Na distribuic¸ão da dor dentáriaentre pré-escolaresno Brasil,deacordocomasunidadesfederativas,percebe-se umamenorprevalênciadesserelatonaquelesresidentesna RegiãoSul(fig.1).
Discussão
Identificou-se uma prevalência de dor dentária elevada entreascrianc¸as de5 anos, comtaxa de21,1%. Tal pre-valênciafoisuperioràidentificadaemoutrosestudosfeitos noBrasilcompré-escolares.15,23Apesardisso,prevalências
superiores foramidentificadasem estudosnacionais11,16 e
internacionais12,13 que consideraram crianc¸as mais velhas
(6 a 12 anos) e evidenciaram a possibilidade de que o avanc¸ar da idade possa influenciar na ocorrência de pro-blemasbucaise,consequentemente,napercepc¸ãodador.
Aprevalência dadordentária entreospré-escolares bra-sileirospossivelmenteé decorrentedaalta prevalênciade algunsproblemas bucaisentreessesindivíduos,como,por exemplo, a cárie dentária.18 No entanto, considerando a
prevalênciadessesproblemas,esperava-seumamaior pre-valênciadedordentária,jáqueacáriedentáriatemsido apontadacomoprincipalresponsávelpelaocorrênciadedor dentáriaemcrianc¸as.24Ressalta-seaindaqueorelatodedor
foifeitopeloresponsável dopré-escolar,quepode subes-timar a ocorrência desse evento. Além das taxas de dor dentária,identificou-seque foiassociadaavariáveis refe-rentes ao uso de servic¸os odontológicos e desfechos em saúdebucal (condic¸ões normativas e subjetivas de saúde bucal).
Identificou-se umamaiorprevalência da ocorrênciade dor dentária entre aqueles que consultaram o cirurgião--dentista. Tal associac¸ão torna-se preocupante ao se considerarqueaconsultaaodentistadeveriaacarretarum maiorcuidadoetratamentodosproblemasbucaiseresultar noalíviodador.Dessaforma,tem-sepor hipótese a pos-sibilidadedenãoresolutividadedosservic¸osodontológicos
Tabela3 Análisemúltipladosfatoresassociadosador den-táriaentrepré-escolaresbrasileirosem2010
ORajustada IC95% p-valor
Usodeservic¸osodontológicos
Não 1,00
Sim 1,51 1,02-2,23 0,037
Dentescomcárie
0 1,00
1oumais 3,08 2,08-4,56 <0,001
Autopercepc¸ãodanecessidadedetratamento
Não 1,00
Sim 3,96 2,48-6,34 <0,001
Satisfac¸ãodenteseboca
Satisfeito 1,00
Insatisfeito 1,47 1,04-2,10 0,029
Impactoproblemasbucaisnaqualidadedevida
Não 1,00
Sim 5,76 3,90-8,49 <0,001
ORajustada,oddsratioajustada;IC95%,intervalodeconfianc¸ade 95%.
usados. Estudo prévio conduzido entre pré-escolares de Montes Claros(MG) identificou uma menor chance douso de servic¸os odontológicos entre aqueles que nunca tive-ram experiência de cárie dentária,25 o que evidencia a
possibilidadedanãoocorrênciadeagravosoudor e, con-sequentemente,nãousodoservic¸o.
Acáriedentáriatemsidoapontadacomoprincipalmotivo para dor dentária.24,26 A prevalência da dor dentária foi
maiorentreospré-escolarescomumoumaisdentescom cáriedentária. Tal associac¸ão era esperada, já quea dor
é um dos sintomas da presenc¸a de cárie dentária. Essa associac¸ão foiidentificada tambémentreadolescentes5 e
adultos.9 Estudoprévio decoortefeito compré-escolares
de 5 anos de Pelotas (RS) identificou que indivíduos com lesõesdecárie têmumamaiorchance (4,8 vezes) deter dordentária.26 Ummaioracesso aservic¸osodontológicos,
assimcomomedidaspreventivasedeeducac¸ãoemsaúde, poderiaimpactarpositivamente nareduc¸ãodosíndicesde cárienessapopulac¸ãoe,consequentemente,naocorrência dedordentária.
Identificou-seuma maior chance da ocorrência de dor dentáriaempré-escolaresquepossivelmenteestavam insa-tisfeitoscomsuascondic¸õesdesaúdebucalenecessitavam detratamentoodontológico,deacordocomorelatodos res-ponsáveis.Apresenc¸adedordentáriaéumaconsequência dapresenc¸adeagravosbucais,1---3esses,porsuavez,podem
levaraumainsatisfac¸ãocomasaúdebucaleàpercepc¸ãoda necessidadedetratamento.Ressalta-sequeosdados refe-rentesàsquestõessubjetivasdesaúdebucalforamrelatados pelosresponsáveispelascrianc¸as.Dessaforma,apercepc¸ão avaliadapodenãorepresentartotalmenteoquantoos pré--escolaressesentemafetadospelosseusproblemasbucais. Porém,aoconsiderarapoucaidadedaamostraea dificul-dadedejulgamentodesuascondic¸õesbucais,orelatopor partedaquelesqueconvivemcomessascrianc¸as (responsá-veis)representaumamedidaconfiáveldeavaliac¸ão.Nesse sentido,adordentáriarepresentaumimportantepreditor nabuscapelaassistênciaodontológica.
Considerando o fatode a dor dentária impactar nega-tivamente na vida diária das pessoas6 e comprometer a
qualidadedevida,7,8amaiorchancedadordentáriaentre
aquelescomimpactodosproblemasbucaisnaqualidadede vidaidentificadanopresenteestudoeraesperada. Ressalta--seaquiocarátersubjetivodorelatodedor,assimcomodos impactosnaqualidadedevidacapturados,principalmente
0 Distrito Federal Rio Grande do Sul Santa Catarina Paraná Espírito Santo Rio de Janeiro São Paulo Minas Gerais Goiás Mato Grosso do Sul Mato Grosso Rio Grande de Norte Maranhão Piauí Ceará Paraíba Pemambuco Sergipe Bahia Alagoas Tocantins Roraima Rondônia Pará Amapá Acre Amazonas Nor te Nordeste Centro- Oeste Sudeste Sul % 5 10 15 20 25 30 35
entrecrianc¸as.Assimcomoparaaautopercepc¸ãodasaúde bucal e a necessidade de tratamento odontológico, a avaliac¸ão doimpactona qualidade devidafoi respondida pelosresponsáveispelascrianc¸as epodediferirdoquanto ascrianc¸asrealmentesesentemafetadaspelosproblemas bucais.
Adoréumfenômenomultidimensional,podeser influ-enciadapor diferentesfatores,suaavaliac¸ão objetivaem pré-escolares é um desafio para profissionais de saúde. Portanto, a identificac¸ão da prevalência de dor dentária, assimcomoseusfatoresassociados,podepermitira melho-riae aplicac¸ãodepolíticaspúblicasque visemàmelhoria das condic¸ões desaúdebucal e davida diáriadesse con-tingente populacional. Dentre as limitac¸ões do presente estudo,destaca-se suacaracterísticatransversal,que não permiteaidentificac¸ãodecausaseefeitos,eofatodeos dadosseremprovenientesde2010emodificac¸õesnesse per-fil de acometimento da dor podemter ocorrido ao longo dos anos. Além disso, o relato de dor, assim como as demaisquestõessubjetivasdesaúdebucal, foifeitopelos responsáveis, é uma medida subjetiva e dinâmica. Ape-sar disso, o presente estudo possibilitou a caracterizac¸ão daocorrênciadedordentáriaentrepré-escolares brasilei-ros considerando umaamostra representativa dessa faixa etária. Tal caracterizac¸ão permitiu também identificar a distribuic¸ãodaocorrênciadeepisódiodedordentáriaem pré-escolares brasileiros entreasregiões do Brasil e suas capitais. Ressalta-se uma variabilidade na prevalência de dorentreascapitaisdeumamesmaregião, identificou-se umamenorprevalênciaemgeralnaRegiãoSuldopaís.
Dos pré-escolares incluídos no presente estudo, 21,1% tiveram dor dentária nos últimos seis meses anteriores à coleta de dados. Ressalta-se ainda que a presenc¸a desse fenômeno semanteve associada ao usode servic¸os odon-tológicos, ocorrência de cárie dentária, necessidade de tratamento, insatisfac¸ão com dentes e boca e impacto dosproblemas bucaisna qualidadedevida.Portanto,tais associac¸ões devem ser consideradas noplanejamento em saúde por parte de profissionais e gestores que visem à reduc¸ãodaocorrênciadadordentáriaentrepré-escolares brasileiros.
Financiamento
Oestudonãorecebeufinanciamento.
Conflitos
de
interesse
Osautoresdeclaramnãohaverconflitosdeinteresse
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