QUE TAL UMA DUCHA? APLICAÇÃO DE UMA ATIVIDADE DE MODELAGEM MATEMÁTICA NO ENSINO MÉDIO
Fernando Francisco Pereira UTFPR – Câmpus Cornélio Procópio f.nando93@hotmail.com
Lucas Gabriel Ribeiro de Souza UTFPR – Câmpus Cornélio Procópio lukin_has_de200008@hotmail.com
Karina Alessandra Pessoa da Silva UTFPR – Câmpus Londrina karinasilva@utfpr.edu.br
Resumo: A experiência descrita neste trabalho advém da aplicação de uma atividade de modelagem matemática em uma turma de Ensino Médio técnico em Eletrotécnica da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) – Câmpus Cornélio Procópio, direcionada pelos graduandos do curso de Licenciatura em Matemática da mesma instituição de ensino. Visando as competências e habilidades a serem desenvolvidas em Matemática pelos alunos do Ensino Médio, surge a atividade cujo contexto parte do simples ato de lavar um automóvel. Os questionamentos, as observações e a análise das resoluções dos alunos contribuíram para a construção desse relato.
Palavras-chave: Metodologias; Modelagem Matemática; Ensino Médio.
Introdução
A necessidade do uso de diferentes tendências metodológicas em sala de aula já vem sendo discutida há muito tempo e já existem muitos professores utilizando-as em sala de aula, na tentativa de motivar os alunos e criar um ambiente em que os mesmos possam refletir e construir o conhecimento.
Pensando na importância do uso de uma dessas tendências metodológicas nas aulas de matemática — a modelagem matemática — é que propomos e desenvolvemos uma atividade em uma sala de aula do Ensino Médio, contemplando a grade curricular, as competências e habilidades a serem desenvolvidas nesse nível de escolaridade. Tais competências e habilidades são apontadas nos PCN do Ensino Médio (BRASIL, 2000):
Identificar o problema (compreender enunciados, formular questões). Procurar, selecionar e interpretar informações relativas ao problema. Formular hipóteses e prever resultados. Fazer e validar conjecturas, experimentando, recorrendo a modelos, esboços, fatos conhecidos, relações e propriedades. Aplicar conhecimentos e métodos matemáticos em situações reais [...] (BRASIL, 2000, p. 46).
Para tanto, o processo de contextualização, a problemática e o desenvolvimento do modelo matemático da atividade foram desenvolvidos em conjunto com os alunos, utilizando alguns conteúdos matemáticos presentes no nível de escolaridade em que se encontram – Ensino Médio.
A atividade proposta
Tal proposta se edificou durante as aulas da disciplina de Modelagem Matemática em diálogo com a professora, além do fato de um dos autores ter adquirido uma lavadora de alta pressão para fazer a lavagem de seu automóvel.
Levando em consideração as assertivas de Bassanezi (2002) que trata a modelagem como a “arte de transformar problemas da realidade em problemas matemáticos e resolvê-los interpretando suas soluções na linguagem do mundo real”
(BASSANEZI, 2002, p. 16), a atividade que desenvolvemos perpassou por conteúdos matemáticos do Ensino Médio.
Para o desenvolvimento da atividade realizamos pesquisas em livros, artigos, coletamos dados em um supermercado no qual a lavadora a jato de alta pressão tem o valor de R$200,00 e cotamos o valor da lavagem de um carro de passeio em um lava-rápido da cidade (R$35,00). Todo esse desenvolvimento contou com a orientação da professora.
Quadro 1 – Informações sobre lavadoras de alta pressão
Uma Lavadora alta pressão é uma máquina que bombeia água sob pressão através de uma tubulação para a limpeza de superfícies com um jato de água a alta velocidade. Equipamentos como estes operam a pressões de 50 bars (750 psi) até 1.200 bars (30.000 psi) ou mais. Ideal para uso em condomínios, residências, comércios, indústrias, hospitais, clínicas, construção civil. O preço das lavadoras domésticas varia de R$ 200,00 a R$ 800,00 em média.
Fonte: http://www.worldflexmaquinas.com.br/lavadora-alta-pressao-lavadoras-alta-pressoes.php. Acesso em: 12 out. 2013.
Uma lavadora de alta pressão utiliza cerca de 14% de água consumida por uma mangueira totalmente aberta conectada à torneira. A máquina tem um sistema dosador que, aliado à pressão, limita a vazão de água, independentemente da abertura da torneira. As lavadoras domésticas gastam, em média, até 8 litros por minuto. Já a mangueira, mesmo com meia-volta na torneira conectada à rede pública, gasta cerca de 30 litros por minuto.
Levando em consideração a economia de água que a lavadora possibilita e conhecendo o valor que um lava-rápido cobra para fazer a lavagem de um carro de passeio (R$ 35,00), definimos um problema a ser investigado: Em quantas lavagens compensaria
ter comprado uma lavadora de alta pressão, se comparado ao preço que gastaria em
lava-rápido?. Para resolvermos o problema, a lavadora considerada foi a Tekna HLX150V com
valor de R$ 200,00 que possibilita realizar a lavagem de um carro em cerca de 15 minutos.
Para o desenvolvimento da atividade, enquanto estudantes do curso de Licenciatura em Matemática, seguimos os encaminhamentos propostos por Almeida, Silva e Vertuan (2012). Para esses autores, uma atividade de modelagem se configura por meio de fases definidas como: inteiração, matematização, resolução, interpretação de resultados e validação. A inteiração é a busca por informações sobre a situação-problema em que se pode definir o problema a ser estudado bem como as metas que orientam a sua resolução; a
matematização consiste na elaboração de uma representação matemática para a
situação-problema; a resolução compreende a construção de um modelo matemático que consiste
As fases da modelagem matemática caracterizadas por Almeida, Silva e Vertuan (2012) constituem procedimentos necessários para a realização de uma atividade de modelagem. Elas podem não ocorrer de forma linear, pois a dinamicidade deste tipo de atividade possibilita movimentos de ida e volta.
Aplicação da Atividade
A atividade foi aplicada em uma turma do Ensino Médio do curso técnico em Eletrotécnica da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, câmpus Cornélio Procópio. Para o desenvolvimento da atividade, os alunos foram dispostos em dois grupos um com quatro e outro com três integrantes. Foi entregue uma ficha a cada aluno contendo a situação-problema (Figura 1) e estes ficaram encarregados de, em grupo, realizar a definição de hipóteses, variáveis, da dedução do modelo matemático, e da sua validação.
Figura 1 – Informações apresentadas aos alunos
Embora a situação tenha sido proposta pelos estudantes/aplicadores da atividade, os alunos foram os agentes que trabalharam com a situação em estudo, sob orientação configurando o trabalho com modelagem matemática. Tal encaminhamento segue o segundo momento de familiarização com atividades de modelagem matemática como proposto por pesquisadores como Almeida e Dias (2004), Almeida e Vertuan (2011) e Silva, Almeida e Gerôlomo (2011). Tais autores caracterizam três momentos de familiarização: o primeiro no qual o professor apresenta uma situação inicial e propõe aos alunos, tendo assim um papel muito ativo; no segundo momento o professor leva uma situação para que os alunos definam o problema e desenvolvam a atividade com os dados coletados pelo professor; no terceiro momento o professor tem um papel de orientador, já que cabe aos alunos definir a situação-problema, o problema, coletar os dados e trabalhar matematicamente para a resolução do problema definido.
Os alunos foram constantemente orientados por meio de questionamentos direcionados ao grupo. A atividade teve duração de aproximadamente uma hora e meia. Os alunos apresentaram algumas dificuldades para iniciar o desenvolvimento da atividade, principalmente na definição das hipóteses e das variáveis. No entanto, sob a orientação dos estudantes/aplicadores, enfrentaram tais dificuldades (Figura 2).
Figura 2 – Definição de hipóteses e de variáveis
Fonte: Relatório dos alunos.
Com as informações apresentadas na Figura 1 e as hipóteses e variáveis definidas, os alunos se propuseram a investigar o problema apresentado na Figura 3.
Figura 3 – Definição do problema a ser investigado
Para a dedução do modelo matemático, os alunos realizaram cálculos que os possibilitaram chegar à resposta do problema que se propuseram a investigar (Figura 4).
Figura 4 – Dedução do modelo matemático
Fonte: Relatório dos alunos.
Apesar de os alunos utilizarem somente registros aritméticos, concluíram o desenvolvimento da atividade, e chegaram a um modelo matemático como caracterizado por Bassanezi (2002, p. 20): "conjunto de símbolos e relações matemáticas que representam de alguma forma o objeto matemático”.
No entanto, realizamos alguns questionamentos com a intenção de representar por meio de uma tabela e de um registro algébrico o modelo matemático da situação.
Fazendo um estudo do valor gasto com a lavadora mais a proporção de água utilizada, bem como os gastos para cada lavagem no lava-rápido, construímos a Tabela 1.
Tabela 1– Quantidade de lavagens com a lavadora de alta pressão e no lava-rápido e os respectivos valores gastos
Quantidade de lavagens Valor em reais com a lavadora de alta pressão (V1)
Valor em reais com lava-rápido (V2)
t1 200,54 35,00
t2 201,08 70,00
t3 201,62 105,00
t4 202,16 140,00
t5 202,70 175,00
t6 203,24 210,00
A partir dos dados apresentados na Tabela 1, escrevemos a expressão algébrica que representa cada valor gasto para cada lavagem com a lavadora a jato e com
lava-rápido, respectivamente, V1= 200 + 0,54t e V2 = 35t.
Após a validação do modelo matemático pelos alunos, utilizando o software Geogebra, fizemos uma representação gráfica dos modelos em mesmo plano cartesiano,
representando o dinheiro gasto com a lavadora (V1) e representando o dinheiro gasto com o
lava-rápido (V2), como mostra a Figura 5. Os alunos observaram que na representação
gráfica havia a interseção entre essas duas funções (A), que corresponde a quantidade de lavagens que representa o valor da lavadora. A partir dessa representação gráfica ficou claro para os alunos a partir de quantas lavagens compensaria ter comprado a lavadora ao invés de levar o carro para o lava-rápido.
Figura 5 – Representação gráfica dos modelos matemáticos para as lavagens de carro com destaque para o ponto de interseção
Fonte: Construída pelos autores com auxílio do Geogebra.
As atividades desenvolvidas pelos alunos foram recolhidas, xerocadas e devolvidas para que possam posteriormente analisar e refletir sobre a atividade.
Considerações Finais
pelo encaminhamento realizado pelos alunos e se “confirmou” ao fazermos a escrita algébrica do modelo matemático.
Segundo Almeida e Dias (2004), o uso da modelagem matemática no contexto de ensino e aprendizagem vai além da ideia utilitarista de aplicar a Matemática para resolver problemas. Nesse caso, como na modelagem matemática é possível matematizar problemas reais, os alunos sentem motivados a estudar essa disciplina.
Acreditamos que a modelagem matemática seja uma alternativa pedagógica interessante para aproximar situações da realidade de conteúdos matemáticos desenvolvidos em sala de aula.
Contudo todos os objetivos com a criação da atividade foram atingidos, haja visto que os alunos compreenderam a relação da matemática com um problema da realidade de todos e tiveram contato com a modelagem matemática.
Referências
ALMEIDA, L. M. W.; DIAS, M. R. Um estudo sobre o uso da Modelagem Matemática como estratégia de ensino e aprendizagem. Bolema, ano 17, n. 22, p. 19-35, 2004.
ALMEIDA, L. W. de; SILVA, K. P. da; VERTUAN, R. E. Modelagem Matemática na Educação Básica. São Paulo: Contexto, 2012.
ALMEIDA, L. M. W.; VERTUAN, R. E. Discussões sobre ‘como fazer’ Modelagem Matemática na sala de aula. In: ALMEIDA, L. M. W.; ARAÚJO, J. L; BISOGNIN, E. Práticas de Modelagem Matemática na Educação Matemática: relatos de experiências e propostas pedagógicas. Londrina, PR: Eduel, p. 19-43, 2011.
BASSANEZI, Rodney Carlos. Ensino-aprendizagem com Modelagem Matemática: uma nova estratégia. São Paulo: Contexto, 2002. 18 p.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros curriculares nacionais: ensino médio – Ciências da Natureza, Matemática e suas tecnologias. Brasília: MEC /SEF, 2000.
NÉRI, C. Z. Competências em avaliação na aprendizagem. Disponível em: http://www.unisa.br . Acesso em: 23 de junho 2012.