SEMILLEROS www.redi4.net
Artículo No. 07: Andrianjafy, M.; et al. (2015). Proposição de um método de análise de portfólio de projetos e produtos em ambiente de cooperativismo: uma pesquisa-ação em uma cooperativa de gestão de resíduos no Brasil. Semilleros, 2 (3), 85-100.
Proposição de um método de análise de portfólio de projetos e produtos em ambiente de cooperativismo: uma pesquisa-ação em uma cooperativa de gestão de resíduos no Brasil Propose a method of project portfolio analysis and products in cooperative environment: an action research in a waste management cooperative in Brazil
Marie Andrianjafy1, Carolline Amaral Paslauski2, Alejandro Germán Frank3
Resumo. O objetivo deste artigo é propor um método de análise de portfólio de projetos e produtos adequado a realidade de organizações cooperativas a partir de uma pesquisa-ação em uma cooperativa social do setor de gestão de resíduos no Brasil. O trabalho desenvolvido contempla entrevistas individuais e de grupos focados, análise de documentação e observação participante. O modelo obtido compõe-se de cinco fases entre as quais se intercalam momentos que chamamos de Tempo de Capacitação objetivando proporcionar aos tomadores de decisão, ou seja, todos os membros da organização, certo conhecimento específico necessário de acordo com o objeto de cada etapa.
Palavras-chave: Método de Análise de Portfólio; Gestão de Portfólio; Gestão de Cooperativas.
Abstract. The objective of this paper is to propose a method of analysis portfolio of projects and appropriate products the reality of cooperative organizations from a research-action in a social cooperative of the waste management industry in Brazil. The work includes individual interviews and focus groups, document analysis and participant observation. The model obtained is made up of five phases among which are interspersed moments we call training time aiming to provide decision- makers, ie all members of the organization , right expertise necessary in accordance with the object of each stage.
Key Words: Portfolio Analysis method; Portfolio management; Management Cooperatives.
1Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil. marie.andrianjafy@gmail.com
2Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil paslauski@producao.ufrgs.br
3Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil frank@producao.ufrgs.br
SEMILLEROS www.redi4.net
INTRODUÇÃO
A forte concorrência no mercado atual impacta também as organizações de tipo cooperativas e demanda cada vez mais a procura pela eficiência de gestão e por um diferencial competitivo para manter o posicionamento no mercado (Côté, 2007).
Assim, muitas cooperativas tendem a adotar cada vez mais práticas de modelos de gestão das empresas capitalistas clássicas, incorrendo assim, no risco de perder gradativamente a identidade da organização. Segundo Côté (2007), esta tendência se reflete na relação entre o associado e a cooperativa – relação sobre a qual é baseada a lógica do cooperativismo – e a torna similar às relações entre empregado e empregador, ou fornecedor e cliente, prejudicando a essência do modelo organizacional.
Complementarmente, a procura por um diferencial competitivo para cooperativas é dificultado pelo fato de que estas, geralmente, são resistentes a adotar práticas utilizadas em empresas capitalistas enquanto o caminho contrário (empresas capitalistas adotando práticas de cooperativas) ocorre sem hesitação.
Como resultado, as cooperativas podem se tornar menos competitivas e seu modo organizacional já não representa fonte de vantagem competitiva sustentável através do comprometimento social que poderia dar origem à ‘vantagem de cooperativismo’ (Côte, 2007). Ainda, Segundo Zylbersztajn (1994), ao contrário das empresas capitalistas clássicas, cujos processos de decisão estão estabelecidos visando à maximização do lucro, as cooperativas, por outro lado, seguindo o princípio de gestão democrático, induzem altos custos de transação e dificilmente atingem um alto nível de reatividade e flexibilidade para atender o cenário atual.
Assim, ganha importância a área de Planejamento Estratégico, cujas atividades garantem que a empresa ‘faça a coisa certa’, enquanto a atividade operacional permite que ‘a coisa seja bem feita’.
(Muller, 2003). Segundo Muller (2003), a estruturação da condução do Planejamento Estratégico desdobra-se em três objetos diferentes, que são: a Identidade Institucional da organização, a Análise do Ambiente do negócio da organização, e o Delineamento das Estratégias da organização. Inserida neste último tópico, encontra-se a prática de Gestão do Portfólio.
O estabelecimento de um portfólio de projetos e produtos relevantes visa estabelecer o mercado alvo de uma organização, tanto para desenvolvimento da Identidade Institucional como para o cumprimento das expectativas do mercado (PMI, 2008). Com a crescente importância da área, modelos genéricos para gestão e análise de portfólio foram desenvolvidos e podem ser encontrados na literatura científica, a fim de preencher essa necessidade de empresas de diferentes portes e áreas de atuação. No entanto, modelos de gestão de portfólio cuja meta principal é “Maximizar a rentabilidade do portfólio” (PMI, 2008) não são compatíveis com um modelo de organização que prioriza o humano em
detrimento do econômico.
Consequentemente, as cooperativas encontram dificuldades em estabelecer um portfólio de projetos e produtos economicamente viável respeitando seu comprometimento com a comunidade e satisfazendo às expectativas do mercado (Lafleur et al., 2004; Côté, 2007; Simonio, 2009).
Considerando o acima exposto, esta pesquisa propõe desenvolver um método
SEMILLEROS www.redi4.net
de análise de portfólio de projetos e produtos adequado às características de cooperativas e realidades do mercado atual. Para tanto, este estudo foi desenvolvido por meio de uma pesquisa- ação com membros de uma cooperativa do setor da Gestão de Resíduos, onde foram aplicadas e testadas as etapas propostas do método. O trabalho se justifica academicamente por suprir uma lacuna teórica identificada e propõe soluções gerenciais para um modelo organizacional crescente.
Referencial Teórico
Nesta seção são apresentados os principais conceitos e resultados existentes na literatura científica relacionada ao temas proposto. Inicia-se com uma revisão da Teoria de Gestão de Portfólio e de sua importância. Em seguida, serão abordados os desafios das cooperativas com relação à gestão estratégica.
Gestão de Portfólio
A gestão de portfólio não se procura com o agrupamento dos melhores projetos, mas com a melhor combinação de projetos que cria um conjunto sinérgico para atender aos objetivos estratégicos da organização (PMI, 2006). Kerzner (2004) complementa com a necessidade do uso correto dos recursos corporativos (tangíveis e intangíveis) através da determinação da exata combinação de projetos e o nível de investimento adequado para cada um deles. De Souza (2011) ainda apresenta o gerenciamento de portfólio como a resposta ao abismo existente entre a estratégia organizacional e a gestão de projeto dentro das organizações representando um meio para fazer a ligação entre a gestão estratégica da organização e sua gestão operacional dos projetos, a fim de garantir uma coerência entre esses dois níveis.
O relacionamento entre Estratégia e Gestão de Portfólio é essencial, pois o primeiro estabelece as premissas para o segundo (Rozenfeld et al., 2006; PMI, 2006). Rozenfeld et al. (2006) define como objetivos básicos da gestão do portfólio: 1) Maximização do retorno financeiro; 2) Alinhamento entre projetos e estratégia; e 3) Balanceamento do portfólio de projetos através da manutenção de uma proporção adequada de inovação, risco e lucratividade, atendendo também, às realidades de curto e longo prazo do mercado. Rozenfeld et al. (2006) ainda sugere ferramentas de avaliação de portfólio como análise do valor comercial esperado, modelos baseados em notas e modelos de gráficos de bolas. Os processos da gestão de portfólio proposta pelo PMI (2006) são apresentados pela Figura 1, onde está desdobrado o Plano Estratégico da organização em dois blocos de alinhamento e de monitoramento e controle.
Dutra (2012) elaborou uma lista de 20 métodos distintos para avaliação e seleção de projetos, classificados quanto sua abordagem (quantitativa e/ou qualitativa) (Figura 2). No mesmo estudo, é estabelecida 35 critérios de seleção de projetos divididos em quatro grupos em relação a freqüência de citação nos artigos do estudo (Tabela 1) (Dutra, 2012).
Destaca-se que os métodos encontrados com mais freqüência na amostra estudada são de abordagem quantitativa e que poucos deles consideram as correlações e a interdependência dos projetos (Dutra, 2012).
SEMILLEROS www.redi4.net
Figura 1. Processos de gestão de portfólio Fonte: The Standard Portfólio Management – PMI, 2006
Tabela 1. Principais critérios de seleção de projetos (adaptado de Dutra, 2012)
SEMILLEROS www.redi4.net
Figura 2. Principais métodos de seleção de projetos
Fonte: Dutra, 2012
Cooperativismo e seus desafios de gestão Esse tipo de empreendedorismo nasceu da seqüência de críticas feitas por grandes pensadores sobre as lacunas do capitalismo que era criticado pelo seu foco sistêmico no econômico em detrimento do humano (LAFLEUR et al., 2004). Segundo Lafleur et al. (2004), uma cooperativa é uma associação autônoma de pessoas voluntariamente unidas para satisfazer suas aspirações e necessidades econômicas, sociais e culturais comuns graças a uma empresa cuja propriedade é coletiva e na qual o poder é exercido democraticamente.
Segundo Junqueira (2005), uma cooperativa de trabalho é uma entidade coletiva tendo princípios que influem sobre suas práticas organizacionais, tais como:
participação, gestão democrática e estrutura horizontal.
Junqueira (2005) reforça a noção de capital social, que considera essencial para a sobrevivência da cooperativa, um capital constituído pela existência de uma rede de relações, cooperação e confiança entre atores. Zylbersztajn (1994) salienta o fato de que, nesse modelo organizacional, não
há separação entre a propriedade e o controle, uma vez que os dirigentes são associados. Por outro lado, Côte (2007) e Junqueira (2005) corroboram a ideia de dualidade estrutural do modelo organizacional, envolvido pela dupla realidade enfrentada pelas cooperativas:
associação-empresa; proprietário-usuário;
coletivo-individual; social-econômico, tornando difícil a procura de modelos de gestão adequados.
Côte (2007) propõe um quadro teórico que salienta a importância estratégica da identidade cooperativa. Esta deve demonstrar que é capaz de gerar, através de sua ação econômica, resultados distintos, reconhecidos como valiosos e portadores de um diferencial significativo. O seu modelo de gestão de ‘equilíbrio cooperativo’ visa orientar os princípios cooperativos para práticas de gestão tanto democráticos como corporativos. As práticas associativas preconizadas são resumidas em quatro palavras: informações, formações, consultorias, e decisões.
Lafleur et al. (2004) desenvolve uma teoria da gestão das cooperativas baseada sobre oito ‘desafios cooperativos’ e preconiza para cada um uma série de boas práticas, procedentes tanto da gestão democrática como da gestão corporativas clássicas. O final, composto por todos os anteriores é o desafio do serviço e/ou do produto que objetiva procurar, além de um preço e uma qualidade competitiva, uma série de
‘valores agregadas das cooperativas’ únicos decorrendo do diferencial cooperativa.
Junqueira (2005) sustenta que um forte capital social em uma organização torna mais fácil a atuação dos agentes e permite o alcance de alguns objetivos que não poderiam ser atingidos sem ele.
Participação e corresponsabilidade são, segundo ele, as duas questões centrais para criação, desenvolvimento e sobrevivência das cooperativas. Porém, são confrontadas com um forte problema de participação relacionado às entradas de novos associados, demonstrando a relação direita entre a participação do cooperado e sua
SEMILLEROS www.redi4.net
presença na fundação da cooperativa (Junqueira, 2005). Para solucioná-lo, propõe-se uma educação cooperativista adequada, para difundir os valores e práticas da cooperativa aos novos membros e impedir que outras venham interferir e comprometer a gestão da organização (Junqueira, 2005).
O aumento drástico da concorrência no mercado, além do enfraquecimento das
características originais desse modelo de organização, o ameaçam seriamente. A falta de conhecimento dessa realidade representa um freio para o desenvolvimento do cooperativismo (Lafleur et al., 2004).
Assim, se faz necessário o desenvolvimento de gerenciamento para cooperativas (Côte, 2007) e a disponibilização de instrumentos de gestão adequados (Lafleur et al., 2004).
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Nesta seção, é apresentada a cooperativa na qual se baseia a pesquisa e as suas peculiaridades relevantes para entender as escolhas metodológicas. Em seguida, está caracterizado e detalhado o método de pesquisa utilizado.
Descrição do Cenário
A pesquisa foi desenvolvida na Cooperativa
‘Mãos Verdes’, com dois anos de operação, que atua na área da reciclagem e inclusão produtiva de populações vulneráveis nos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Buscam, no longo prazo, “ser uma cooperativa sustentável, reconhecida como agente transformador da reciclagem em cadeia profissional e sistemática, com inclusão plena, criando condições para o desenvolvimento socioambiental do país”.
Os principais produtos e serviços oferecidos pela Cooperativa são: elaboração estratégica e assessoria a projetos de grande porte com gestão participativa de projetos;
assessoria técnica de longo prazo com acompanhamento e prestação de serviços especializados; captação de recursos com editais públicos e privados e elaboração de cartas consulta; capacitação de equipes em conhecimento e ferramentais de gestão ou/e de processos produtivos e materiais recicláveis; serviço técnico de gerenciamento para empreendimentos de gestão de resíduos; formação de lideranças populares; desenvolvimento de produtos e serviços em gestão de resíduos; produção de conhecimento com pesquisas, estudos técnicos e levantamento de informações e;
desenvolvimento de plano de gerenciamento de resíduos. Atendem o setor público (prefeituras, municipalidades) e privado (empresas, organizações privadas) de áreas diversas (comercial, industrial, indústria química, construção civil, hospitalar, etc) que tenham como objetivo beneficiar sistematicamente e principalmente as unidades populares de reciclagem de resíduos. A cooperativa trabalha atualmente com quatro projetos e busca alternativas para a gestão de portfólio que esteja alinhada com o plano estratégico do negócio.
O principal diferencial da Cooperativa é a multidisciplinariedade de sua equipe constituída por 11 sócio-fundadores com diferentes competências. Essa característica permite responder à alta complexidade dos projetos da área, que articulam setores envolvendo pessoas de realidades muito diferentes, mas gera um grau de complexidade maior na hora das escolhas estratégicas da cooperativa, pois cada associado interpreta os problemas e os cenários potenciais de acordo com sua própria experiência.
Caracterização do método de pesquisa A natureza da pesquisa é aplicada, pois os resultados obtidos beneficiarão diretamente a organização alvo. Sua abordagem é qualitativa, visto que o método de trabalho se baseia em dados subjetivos. O objetivo da pesquisa é exploratório, pois busca preencher a lacuna na área da administração estratégica em ambiente de cooperativismo.
Por fim este trabalho utilizará o método de
SEMILLEROS www.redi4.net
pesquisa-ação, pois o pesquisador desempenha um papel ativo no estudo, buscando solucionar um problema concreto de uma organização, através de uma pesquisa científica.
Caracterização do método de trabalho O método de trabalho do estudo seguirá a proposta de Mello et al. (2013) para desenvolvimento de pesquisa-ação na engenharia de produção que sugere que este tipo de estudo é compostos por diversos ciclos que se repetem (seguindo o princípio da melhoria e aprendizagem contínua). As atividades estão descritas nos tópicos seguintes para cada uma das macro-etapas:
i) Planejar a pesquisa-ação; ii) Coletar dados; iii) Analisar dados e planejar ações;
iv) Implementar ações; v) Avaliar resultados e gerar relatório.
Primeira fase: Planejar pesquisa-ação A primeira etapa consiste em definir se o estudo está dirigido pela pesquisa ou pelo problema. Neste caso, o estudo é dirigido pelo problema, pois foi a identificação de um problema específico em uma organização que motivou à busca na literatura científica, e não o contrário. No caso da pesquisa-ação dirigida pelo problema, as etapas desta primeira fase do ciclo são: definir contexto e propósito (4.1.2), definir estrutura conceitual-teórica (4.1.3) e selecionar técnicas de coleta de dados (4.1.4).
Para contextualizar e fundamentar o problema identificado pela organização, realizou-se a revisão teórica a fim de definir como o problema será inserido na literatura científica, necessitando potencialmente um redirecionamento ou uma reformulação deste. A definição da estrutura conceitual- teórica é desenvolvida em seguida com o objetivo principal de “captar o estado da arte de um campo de conhecimento”
(MELLO et. al, 2013). Essa definição baseia-se sobre uma revisão sólida da
literatura científica sobre o campo em questão.
Segunda fase: Coletar dados
As técnicas de coleta de dados utilizadas foram: i) observação participante, objetivando inclusão e interação no grupo, ganho da sua confiança, demonstração pelos membros dos benefícios potenciais trazidos pela pesquisa; ii) entrevistas coletivas conduzidas no escritório da cooperativa; iii) entrevistas individuais aplicadas de modo aprofundado com os associados. Os dados levantados relacionam-se com o Plano Estratégico da cooperativa, seu ambiente interno e externo e a oferta atual da cooperativa em termos de produtos e serviços.
Terceira fase: Analisar dados e planejar ações
A análise de dados é feita sistematicamente com os associados que compõem o núcleo da cooperativa – constituído pelos seis membros mais presentes no escritório – sob a forma de reuniões de apresentação do andamento da análise e de escolha em conjunto do encaminhamento segundo os resultados obtidos.
Quarta fase: Implementar ações
Foi definido um plano de ações que detalha:
as metas, os prazos, os responsáveis e os indicadores de desempenho. A aplicação ocorreu com o apoio mais intenso dos membros que participaram da análise dos dados.
Quinta fase: Avaliar resultado e gerar relatórios
Nessa última fase, é feito o controle e o monitoramento do plano de ação estabelecido através de relatórios gerenciais, a fim de avaliar se ele atinge ou não o desempenho esperado e para realizar as tomadas de decisões, ajustes e rearranjos necessários, para incorporação nos próximos ciclos.
Resultados e Discussões
Esta seção apresenta os resultados obtidos, discutindo e justificando as alterações e
adequações adotadas ao longo da pesquisa- ação quanto ao planejamento inicial. O
SEMILLEROS www.redi4.net
método foi construído durante a realização do estudo na cooperativa analisada, apoiando-se sobre a experiência adquirida ao longo do trabalho, bem como em métodos encontrados na literatura. Para um melhor entendimento da construção e do método resultante, será apresentado em um primeiro momento o trabalho aplicado, destacando as etapas chaves e as resistências enfrentadas e, em seguida, será apresentado o método.
Planejamento do estudo
O primeiro passo do estudo foi entender a problemática inicial e os objetivos gerais do estudo. Assim, definiu-se como necessário auxiliar no processo de elaboração e avaliação de um portfólio de produtos e serviços padronizado, a fim de amenizar problemas internos da Cooperativa tais como: divergência de opiniões dos sócios quanto à relevância dos projetos em desenvolvimento; definição do negócio pouco clara, que varia conforme as diferentes visões e; incerteza quanto ao fato de estar, ou não, no caminho certo para atingir a visão institucional de longo prazo da Cooperativa.
O planejamento inicial da pesquisa foi embasado principalmente sobre o método proposto por Cooper et al. (2001). Apesar de ser um método mais adequado à entrada de novo produto, é suficientemente genérico para permitir adequações, muito didático e suas linhas principais são facilmente compreensíveis, o que o torna ideal para aplicar em uma organização cuja maturidade relativa à gestão de portfólio não está desenvolvida.
O plano proposto (Figura 3) revelou-se muito detalhado, em relação ao caráter urgente da situação de acordo com três elementos identificados: falta de capital de giro e a atual dependência de um único projeto. Logo, o estudo tinha como objetivo elaborar planos de ações no curto prazo.
Apesar de ter sido necessário simplificar esse plano inicial, este desempenhou bem o papel norteador e didático esperado.
Outro elemento primordial dessa fase foi a constituição do grupo de membros da Cooperativa que trabalhou no plano.
Compuseram o time: um educador social, consultor sênior em engenharia de produção, possuindo um MBA em gestão de projeto e um aluno de graduação em engenharia de produção. O primeiro é membro recente da Cooperativa e possui uma larga experiência relativa à gestão de projetos colaborativos, tem uma visão geral e objetiva do negócio e está mais distante dos debates internos. O segundo membro foi um dos sócios fundadores da Cooperativa e passou por todas as suas fases evolutivas. Além disso, tem um espírito empreendedor forte e um ponto de vista mais incisivo, tornando-lhe um bom elemento motor, tanto para a Cooperativa como para o estudo. Estas diferentes visões viabilizaram a complementaridade dos resultados.
Desenvolvimento do estudo
Análise de Planejamento Estratégico do Negócio (PEN)
A análise do PEN foi realizada a partir dos arquivos digitais da Cooperativa desde a sua constituição: Identidade Institucional, Análise de Ambiente, Mapa estratégica, Mapa de negócio, Sistematização dos objetivos, Apresentação Institucional, até a Ata do “Primeiro Encontro da Construção de Uma Cooperativa”. Também, foram demandados esclarecimentos ao sócio- fundador do grupo de trabalho.
Essa síntese foi confrontada com a situação atual do negócio realizando a comparação entre os produtos e serviços dos planos originais e os oferecidos atualmente, entre os públicos-alvo visados pelos planos originais e os clientes atendidos, dentre outros. De posse deste material, foi feita uma primeira avaliação do grau de revisão do plano estratégico de negócio necessário.
Preparação da Reunião de apresentação do trabalho
Após essa primeira fase de análise, foi preparado o primeiro encontro com o grupo
SEMILLEROS www.redi4.net
inteiro, a fim de ter claro o pensamento coletivo da Cooperativa e não apenas do grupo de trabalho restrito. Portanto, a participação ativa de todos os membros durante as poucas reuniões do estudo era mais que desejável, e isso dependeu muito da compreensão e da avaliação deles quanto ao estudo conduzido através desta primeira interação.
A estratégia do roteiro da reunião foi elaborada com a ajuda dos dois sócios definindo o nível de esclarecimento necessário de certos teóricos específicos. A estratégia escolhida é de três tempos, e acabaria ser aquela adotada pelo modelo proposto: 1) Tempo de Capacitação:
Apresentação de conceitos teóricos genéricos sobre os quais se apoiarão as discussões; 2) Tempo de Contextualização:
Aplicação dos conceitos à situação da organização; e enfim 3) Tempo de Encaminhamento: Discussões e tomada de decisões voltadas ao que foi apresentado.
Reunião de apresentação do trabalho:
objetivos e benefícios da Análise do Portfólio
Os pontos abordados no Tempo de Capacitação foram: O que é gestão de portfólio? Porque fazer uma gestão de
portfólio? Como fazer uma gestão de portfólio? O objetivo era nivelar o grupo e padronizar os diferentes entendimentos dos conceitos usados.
Os pontos abordados no Tempo de Contextualização foram: Qual é o PEN atual? Quais são os produtos e serviços componentes do portfólio atual? De qual maneira o PEN e o portfólio se relacionam entre si? Para discutir essas perguntas, os dados coletadas durante a análise do PEN foram reorganizados e condensados sob a forma de: um diagrama destacando o caráter híbrido do negócio da organização (Figura 4), uma análise SWOT (Tabela 2) e um diagrama que relaciona os objetivos estratégicos e os produtos e serviços oferecidos (Figura 5).
Os pontos abordados no Tempo de Encaminhamento foram: Grau de revisão do PEN necessário, identificação de oportunidades de melhorias em termos de produtos e serviços oferecidos, escolha das linhas estratégicas principais para o restante do estudo. À medida que avançou à discussão, desvelaram-se as duas preocupações maiores do grupo: falta de caixa e de capital de giro e atual dependência a um único projeto com baixa estabilidade.
Fisgura 3. WBS (Work Business Structure) do estudio
SEMILLEROS www.redi4.net
Figura 4. Dois ramos da Cooperativa
Tabela 2. Análise SWOT dos dois ramos da Cooperativa
Em seguida, foi realizado uma análise do diagrama apresentado na Figura 5, a fim de avaliar a forma de relacionamento da estratégia e do portfólio (Figura 6). Desta análise identificaram-se as lacunas quanto à necessidade urgente de fluxo de caixa uma vez que não se identificam produtos cuja geração de caixa correspondente é alta para um nível de investimento baixo,
proporcionando certa segurança de caixa, quanto aos objetivos estratégicos de longo prazo, ou seja, falta de iniciativas e projetos para tornar-se o ator integrado à cadeia produtiva que se objetiva. Portanto, foram selecionadas três linhas gerais a seguir pelo restante do estudo: ter entrada de dinheiro no muito curto prazo, impactar a causa no meio prazo e obter renda fixa de longo
SEMILLEROS www.redi4.net
prazo de uma forma integrada à cadeia produtiva e não mais sendo um órgão de apoio, de auxílio ou de consultoria ao sistema. Em decorrência disto, foram selecionados cinco produtos julgados pelo
grupo sobre critérios qualitativos e intuitivos como sendo os com maior potencial para desenvolvimento de planos de ações e conversão em produtos no curto prazo.
Figura 5. Diagrama de relacionamento entre objetivos estratégicos e portfólio
Figura 6. Ferramenta de trabalho da reunião 1: Identificação de lacunas
Encaminhamento: desenvolvimento dos planos de ações e modelos de negócio Conforme o encaminhamento da reunião precedente, os planos de ações dos cinco
produtos selecionados foram desenvolvidos. Em paralelo, foram elaborados três modelos de negócio distintos, usando a ferramenta CANVAS, a fim de incentivar a procura de uma fonte de
SEMILLEROS www.redi4.net
renda fixa de longo prazo via um negócio sustentável, inserido dentro da cadeia produtiva, e servindo melhor a razão de ser da Cooperativa. Na seqüência, foi realizada uma nova reunião com o grupo inteiro, com dois objetivos: contribuir com os últimos reajustes dos planos de ações e distribuir as responsabilidades e discutir sobre os modelos de negócio de longo prazo e escolher quais mereceriam uma análise de viabilidade mais profunda, bem como o responsável em essa tarefa.
Proposta do Modelo
Com base no trabalho desenvolvido com os membros da cooperativa, foi proposto um modelo de quatro fases, além da fase de inicialização, como está ilustrado na Figura 7. Cada fase pode ser intercalada, quando necessário, com o “tempos de capacitação”, que consiste em encontros com todos os membros, para tomada de decisões quanto aos encaminhamentos do trabalho após disseminação dos conhecimentos necessários àquela situação a todos.
SEMILLEROS www.redi4.net
Figura 7. Proposta de Modelo de Gestão de Portfólio
SEMILLEROS www.redi4.net
Preparação do trabalho
Durante essa fase, o pesquisador deve se familiarizar com as rotinas e os processos de trabalho, apreender os costumes e os valores institucionais e compreender os respectivos papéis (explícitos e implícitos) de cada membro. Em seguida, deve compreender rigorosamente as finalidades do estudo proposto, bem como o contexto no qual ele se insere. Para isso, foram realizadas entrevistas individuais, formais ou não, voltadas ao que se espera da contribuição do pesquisador. A tarefa de constituição da equipe restrita de trabalho é importante, pois deve-se buscar uma representação democrática do grupo, ou seja, garantir a consideração de todos os pontos de vista.
Análise do PEN
Essa fase corresponde ao trabalho de campo sobre o qual estão embasadas as etapas subseqüentes. Essa análise envolve uma ampla coleta de dados, através de três fontes complementares conhecidas como triangulação de dados: dinâmicas de entrevistas individuais ou de grupos focados, documentação por arquivos manuscritos ou digitais e observação participante. Neste momento, avalia-se a necessidade de realizar uma revisão do PEN, contemplando o grau de validade dos componentes da versão mais recente, com relação às mudanças observadas no ambiente externo.
Análise do Portfólio atual
Nesta fase, os produtos e serviços que compõe o portfólio atual, serão confrontados ao PEN buscando a identificação de lacunas e oportunidades de melhorias em termos de produtos e serviços. Remetendo ao trabalho que foi desenvolvido, os diagramas da Figura 5 e 7 representaram um material dinâmico de apoio durante as reuniões voltadas à análise de portfólio atual, o que levou a
resultados muito satisfatórios em termos de método (alto grau de participação de todos os membros) e de conteúdo (consistência das conclusões e encaminhamentos e identificação clara de lacunas). Posteriormente, foi elaborada com todos os membros uma lista de novas ideias voltadas a produtos e projetos a serem considerados no processo de avaliação de portfólio.
Preparação da avaliação
Do mesmo modo, seleciona-se com o grupo restrito dois ou três métodos de avaliação a serem submetidos na sequência ao grupo inteiro para seleção do método de avaliação de portfólio. Sugere- se rever a seção 2.1 Teoria de Gestão de Portfólio para sugestões de métodos, dando preferência aos métodos com mecanismos mais sociais e democráticos, e sem ênfase exclusivamente lucrativa.
Avaliação
Enfim, apoiando-se sobre todos os resultados das fases anteriores, essa última fase corresponde à própria aplicação do método escolhido pelo grupo usando os critérios de avaliação e os pesos correspondentes selecionados.
Ressaltamos que, no âmbito do trabalho desenvolvido, certos fatos contextuais impediram a aplicação rigorosa de um método de avaliação de portfólio. De fato, o caráter urgente da situação de caixa levou a selecionar e priorizar os produtos a serem desenvolvidos na seqüência embasada principalmente nas experiências dos membros e nos critérios qualitativos.
Tempos de Capacitação
São reuniões opcionais que seguem a estratégia apresentada na seção 4.2 Desenvolvimento do Estudo: 1) Tempo de Capacitação, 2) Tempo de Contextualização, 3) Tempo de Encaminhamento. O teor delas é fortemente atrelado ao grau de
SEMILLEROS www.redi4.net
conhecimento dos membros, uma vez que, se todos dominam perfeitamente os conceitos relativos ao PEN, por exemplo, o primeiro tempo de capacitação da Figura 7 não precisa ser aplicado. Portanto, são atividades flexíveis personalizáveis de acordo com o conhecimento prévio do time.
Entende-se que o modelo proposto é principalmente norteador e pretende, sobre tudo, organizar as etapas de avaliação de portfólio no contexto específico de uma
cooperativa. O caráter flexível é importante na medida em que as organizações-alvo são híbridas por natureza e, portanto, possuem essa característica intrínseca. Também, se pode ressaltar a relevância do dos tempos de capacitação que permitem atingir um nível maior de interação com o grupo e torna o modelo mais social e democrático, em adequação com as orientações do cooperativismo.
CONCLUSÕES
O tema geral do trabalho foi a gestão de portfólio de produtos e projetos e seu objetivo central foi desenvolver uma proposta de método de análise de portfólio de produtos e projetos que seja adequada às realidades das instituições de tipo cooperativas, através de uma pesquisa- ação em uma cooperativa da área da Gestão de Resíduos. Ressaltamos que esta pesquisa-ação foi dirigida pelo problema, ou seja, foi a identificação de uma oportunidade de melhoria pela cooperativa alvo do estudo que a motivou. Portanto, a proposta de método foi construída ao longo do trabalho desenvolvido dentro daquela cooperativa, beneficiando-se das experiências adquiridas.
Destacam-se três etapas principais aplicadas no contexto. Primeiramente, a análise do planejamento estratégico, com enfoque específico sobre a forma de condensar as informações a fim de desvelar e caracterizar melhor as divergências de opiniões dos sócios. Em segundo lugar, a seleção em grupo das linhas estratégicas a serem perseguidas no curto prazo, em particular a fim de responder às dificuldades de fluxo de caixa enfrentadas. Por último, a identificação de lacunas em termos de produtos e projetos
que atendem, por um lado, à urgência da situação de caixa, pela qual cinco produtos foram selecionados e trabalhados especificamente e, por outro, aos objetivos estratégicos de longo prazo – pelos quais três modelos de negócios iniciaram a ser desenhados.
Assim, obteve-se como resultado uma proposta de método de análise de portfólio de produtos e projetos que contém como etapa a destacar os tempos de capacitação para os tomadores de decisões, ou seja, para os membros das organizações. Esses tempos de capacitação constituem o principal valor agregado da proposta uma vez que se entende que, em uma cooperativa, todos os membros não possuem sempre uma bagagem profissional suficientemente consolidado, que seja em termos de conhecimentos acadêmicos ou de experiencias profissionais construtivas, para enfrentar todas as situações de decisões. Pode ser ressaltado também que, além dessa característica principal, a referida proposta de método apresenta certo caráter social e democrático que vem completar o método adotado como referência no trabalho, adequando assim os valores do cooperativismo. Sugerem-se, como
SEMILLEROS www.redi4.net
futuros trabalhos, a elaboração de métodos mais estruturados de priorização customizados às realidades das cooperativas.
Referências Bibliográficas
De Souza, Pedro Bruno Barros. Mensuração do Desempenho do Gerenciamento de Portfólio de Projetos: Proposta de Modelo Conceitual. 2011. Tese de Doutorado. PUC- Rio.
Cooper, Robert Gravlin; Edgett, Scott J.;
Kleinschmidt, Elko J.Portfolio management for new products. Basic Books, 2001.
Côté, Daniel. Gestion de l'équilibre coopératif:
cadre théorique. CIRIEC, 2004.
Creswell, John W. Research design:
Qualitative, quantitative, and mixed methods approaches. Sage publications, 2013.
Zylbersztajn, Decio. Organização de cooperativas: desafios e tendências. Revista de Administra&ccdeil; ão da Universidade de São Paulo, v. 29, n. 3, 1994.
Dutra, Camila Costa. Modelo econômico- probabilístico para seleção e priorização de projetos. 2012.
Junqueira, L. Capital Social e cooperativas do trabalho. RAP Rio de Janeiro, vol. 39, n. 2, p.
381-400, Mar./Abr. 2005
Kerzner, Harold. Gestão de projetos.
Bookman, 2006.
Lafleur, Michel; Lopez, Carlos; Bastien, D. I.
O. N. La stratégie de la coopérative basée sur son identité: la théorie des défis coopératifs.
In:Conférence de l’ASAC. 2004.
Muller, Claudio Jose. Modelo de gestão integrando planejamento estratégico, sistemas de avaliação de desempenho e gerenciamento de processos (MEIO-Modelo de Estratégia, Indicadores e Operações). 2003.
Mello, Carlos Henrique Pereira et al. Pesquisa- ação na engenharia de produção: proposta de estruturação para sua condução. Revista Produção, v. 22, n. 1, p. 1-13, 2012.
Rozenfeld, Henrique. Gestão de desenvolvimento de produtos: uma referência para a melhoria do processo. Saraiva, 2006.
Project Management Institute (PMI), 2008 - « The Standard for Portfolio Management», 2ª ed., 146 páginas.
SILVA, Emanuel Sampaio et al. Panorama do cooperativismo brasileiro: história, cenários e tendências. Revita uniRcoop, v. 1, n. 2, p. 75- 102,
2003.