Medicina Veterinária, Recife, v.3, n.1, p.1-10, jan-mar, 2009 ISSN 1809-4678
Avaliação das concentrações séricas dos minerais, proteínas, enzimas e urinálise em
gatos domésticos com Doença do Trato Urinário Inferior
1(Evaluation in the seric concentration of the mineral, proteins, enzymes and urinalysis in
domestic cats with Lower Urinary Tract Disease)
“Artigo Científico/Scientific Article”
ER LimaA(*), AT VasconcelosB, EL AlmeidaA, MN TeixeiraA, EW RegoA, DG CoutinhoC, MA Rocha JuniorC
AÁrea de Clínica do Departamento de Medicina Veterinária da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Av. Dom Manoel de Medeiros s/n, Dois Irmãos, 52171 900 Recife-PE/Brasil.
BHemope - Recife-PE/Brasil.
CBolsistas da área de Clínica do Departamento de Medicina Veterinária da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Av. Dom Manoel de Medeiros s/n, Dois Irmãos, 52171 900 Recife-PE/Brasil.
Resumo
Foram utilizados 8 gatos, de ambos os sexos, sem raça definida, de 2 a 4 anos, divididos em 2 grupos, com 4 machos e 4 fêmeas, submetidos inicialmente à dieta exclusiva de ração seca industrializada, considerada como responsável de causar Doença do Trato Urinário Inferior (DTUI). Após o desenvolvimento dos sintomas desta enfermidade utilizou-se a ração seca industrializada para controle da DTUI. Os animais foram avaliados através das concentrações séricas dos minerais, proteínas, enzimas e urinálise, mensalmente durante 6 meses. Nos resultados obtidos de acordo com a condição antes e depois da DTUI, os machos, apresentaram diferenças estatisticamente significativas para a creatinina, proteína total e pH urinário e as fêmeas, para o potássio, creatinina, proteína total, AST, magnésio, cálcio, uréia e pH urinário. Conclui-se que o uso da dieta terapêutica para DTUI teve influência nas concentrações séricas dos minerais, proteínas, enzimas, na sintomatologia dos animais, com o desaparecimento da disúria, hematúria, cristalúria e diminuição do pH urinário.
Palavras-chave: DTUI, felino, proteínas, enzimas, minerais, urinálise. Abstract
There were used 8 cats, from both sex, of unknown breed, 2 and 4 years, divided in 2 groups, 4 males and 4 females, initially submitted to an diet industrialized dried food, considered as responsible for inducing Lower Urinary Tract Disease (LUTD). After the development of the clinical signs, it was used the therapeutic industrialized dried food recommended for the control of LUTD. The animals were mensally evaluated by seric concentration of the minerals, proteins, enzymes and urinary exam during 6 months. In the obtained results, in the agreement with the condition before and after LUTD, the males, presented significant statistic differences for the creatinina, total protein and urinary pH and the females, for the potassium, creatinina, total protein, AST, magnesium, calcium, urea and urinary pH. It may be concluded that the use of therapeutic diet for LUTD had influence in the seric concentrations of the minerals, proteins, enzymes, in the sintomatology of the animals, in the absence of the disúria, heamaturia, crystaluria and reduction of the urinary pH.
Key-words: LUTD, feline, proteins, enzymes, minerals, urinalysis.
(1)
Trabalho extraído da Tese de Doutorado da primeira autora apresentado ao Programa de Pós-Graduação em Ciência Veterinária da Universidade Federal Rural de Pernambuco.
(*)Autor para correspondência/Corresponding author (evilda@dmv.ufrpe.br).
Introdução
A Doença do Trato Urinário Inferior
(DTUI) é uma enfermidade que compreende
vários transtornos do trato urinário inferior
dos
felinos.
Os
sinais
clínicos
mais
comumente apresentados pelos gatos são:
hematúria, disúria, polaquiúria, presença ou
não de obstrução uretral. Vários fatores de
risco estão associados à DTUI, como: idade,
sexo, sedentarismo, estresse, confinamento,
hereditariedade e dieta inapropriada que não
possui controle de minerais, de baixa
digestibilidade e/ou administrada em excesso.
A obstrução urinária gera anormalidades
clínicas e bioquímicas previsíveis que variam
com a duração e grau da obstrução. Contudo,
as anormalidades nos equilíbrios dos líquidos,
do estado ácido-básico e dos eletrólitos
causadas pela obstrução uretral provavelmente
ocorrerão independente da causa (NELSON e
COUTO, 2001; OSBORNE et al., 2004).
A obstrução uretral observada nos
machos
impede
que
os
rins
filtrem
adequadamente o sangue para eliminar as
substâncias tóxicas presentes. Por estarem os
rins impossibilitados de realizarem uma
correta filtração sanguínea, ocorre um
acúmulo de substâncias tóxicas como a uréia,
dificultando o equilíbrio iônico e ácido-básico
no organismo animal. Caso a obstrução esteja
presente começam a ser observados sinais de
uremia como anorexia, letargia, vômitos,
úlceras na boca, desidratação, depressão e
morte (CORNELL, 2003; OSBORNE et al.,
2004). Gatos que não têm obstrução completa
apresentam-se com hematúria, polaquiúria e
estrangúria (DIBARTOLA e BUFFINGTON,
1998). Os machos mostraram tendência ao
desenvolvimento da obstrução parcial ou
completa, devido ao fato de possuírem uretra
longa e estreita, favorecendo a instalação do
processo obstrutivo (CASE et al., 2002;
OSBORNE et al., 2004).
Outro
aspecto
que
deve
ser
considerado na DTUI é a dieta que esses
animais
consomem.
A
maioria
dos
proprietários de gatos os alimentam com
produtos comerciais, que estão disponíveis
sob as formas secas, enlatada e semi-úmida.
Os alimentos na forma seca utilizam
ingredientes de baixa umidade, a sua
desidratação excessiva ou incorreta pode
originar uma diminuição na porcentagem de
nutrientes, inclusive a sua perda total. Os
alimentos secos possuem menor densidade
energética, induzindo a um maior volume
fecal, menor volume urinário e aumento da
concentração de substâncias calculogênicas na
urina (CASE et al., 2002; OSBORNE et al.,
2004).
As concentrações bioquímicas séricas
apresentam mensurações que podem ser
afetadas por fatores metabólicos. Os valores
normais para adultos na espécie felina,
segundo Meyer et al. (1999) compreendem:
magnésio 2 – 4mg/dl; cálcio 8,0 – 10,7mg/dl;
fósforo 1,8 – 6,4mg/dl; sódio 141,0 –
153,0mEq/l; potássio 3,8 – 5,8mEq/dl; cloreto
108,0 – 127,0 mEq/l; proteína total 5,4 –
7,8g/dl; albumina 2,1 – 3,9g/dl; colesterol
90,0 – 205,0mg/dl; creatinina 0,8 – 1,8mg/dl;
uréia 10,0 – 30,0mg/dl; fosfatase alcalina 10,0
– 80,0UI/l; ALT 10,0 – 80,0UI/l; AST 10,0 –
80,0UI/l. Valores referênciais similares são
citados por Coles (1984), Nelson e Couto
(1994; 2001), Wingfield et al. (1998), Bush
(1999).
A elevação dos valores séricos do
cálcio são afetados pela concentração sérica
da albumina e com a filtração glomerular na
insuficiência renal aguda ou distúrbios
metabólicos. A concentração plasmática do
sódio é a mais comumente alterada como
resultado de uma alteração do mecanismo de
equilíbrio hídrico. Uma anormalidade no
potássio plasmático é reflexo dos mecanismos
fisiológicos envolvidos na homeostase do
soluto plasmático. Os pacientes com doença
renal podem reter potássio e desenvolver uma
hipercalemia. A composição de cloreto no
corpo varia inversamente com a concentração
de
bicarbonato
e
as
deficiências
de
bicarbonato podem ocorrer com o avanço de
distúrbios renais. Da mesma forma, a
habilidade de reter o sódio é frequentemente
perdida em doenças renais crônicas (MEYER
et al., 1999; OSBORNE et al., 2004). A
Lima et al. Avaliação das concentrações séricas dos minerais, proteínas, enzimas e urinálise em gatos domésticos...
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podem estar relacionadas com a acidose
tubular renal e a urólitos de fosfatos de cálcio
ou de estruvita (OSBORNE et al., 2004).
A mensuração total de proteínas
reflete uma combinação entre a albumina e as
globulinas. A albumina representa cerca da
metade do total das proteínas (MEYER et al.,
1999). A uréia representa o principal produto
do catabolismo das proteínas nas espécies
carnívoras (NELSON e COUTO, 1994;
OSBORNE et al., 1999; NELSON e COUTO,
2001; OSBORNE et al., 2004). O nível de
uréia pode ser aumentado nos carnívoros com
um aumento no consumo dietético de
proteína. A velocidade de excreção é
influenciada
por
qualquer
anormalidade
orgânica e a sua mensuração no soro é feita
para avaliar a função renal. A creatinina,
formada
durante
o
metabolismo
da
musculatura esquelética, não é influenciada
pela dieta. Com uma redução da taxa de
filtração glomerular, aumenta a concentração
sérica de creatinina. Os mesmos fatores
pré-renal, renal e pós-renal que influenciam a
uréia, afetam a creatinina sérica (MEYER et
al., 1999).
As
aminotrasferases,
alanina-aminotransferase
(ALT)
e
aspartato-aminotranferase (AST) têm distribuição ampla
no organismo, estando presentes no soro em
pequenas quantidades, como resultado de
destruição de tecidos e liberação das enzimas.
A AST não é específica para lesões hepáticas
em gatos. No entanto, a ALT é importante
para
esta
espécie.
O
aumento
dessa
transaminase é específico de destruição
celular e uma elevação discreta tem sido
observada em casos de uremia (COLES,
1984; MEYER et al., 1999).
O
aparecimento
de
cristais
de
estruvita em gatos está na dependência do
grau de saturação da urina com cristalóides
calculogênicos e principalmente do pH
urinário. Em pH urinário menor que 6,
dificilmente ocorre formação desses cristais
(CASE et al., 2002). A urina alcalina pode
conter fosfatos triplos, amorfos e carbonato de
cálcio. A urina ácida favorece a uratos
amorfos, ácido úrico e oxalato de cálcio. A
presença de cristais no sedimento urinário não
reflete, necessariamente, cristalúria, e não se
deve excluir a participação dos cristais na
formação dos tampões (OSBORNE et al.,
2004).
Em geral a reação ácida-alcalina (pH)
para gatos quando normal, é ácida (6 a 7).
Esse dado serve para revelar informações
relativas ao estado metabólico do indivíduo e
como indicadores de condições sistêmicas
(COLES, 1984; MEYER et al., 1999). A
proteinúria
é
importante
quando
está
associada a cilindros. A proteinúria sem
cilindrúria sugere que seja de origem
pós-renal. A proteinúria renal ocorre na nefrite,
em consequência da maior permeabilidade
glomerular (COLES, 1984). A hematúria
acompanhada de disúria e/ou polaciúria indica
enfermidade do trato urinário inferior em
felinos (MORRIS e ROGERS, 2004).
Devem-se considerar a dieta, pH urinário e
conservação da amostra antes da interpretação
desses resultados. Diante da necessidade de
estudos laboratoriais da DTUI, o objetivo,
neste
trabalho,
foi
a
avaliação
das
concentrações séricas dos minerais, proteínas,
enzimas e urinálise em gatos adultos de
ambos os sexos com DTUI.
Material e Métodos
Esta pesquisa foi desenvolvida no
Hospital Veterinário do Departamento de
Medicina Veterinária da Universidade Federal
Rural de Pernambuco, Dois Irmãos, Recife –
PE e na Fundação HEMOPE. Foram
utilizados 8 oito animais, de 2 a 4 anos de
idade, sem raça definida, divididos em dois
grupos, de acordo com o sexo. O grupo I foi
constituído por quatro machos e o grupo II
constituído por quatro fêmeas. Antes de ser
realizada a fase experimental, o projeto foi
submetido à apreciação da Comissão de Ética
do DMV/UFRPE, cujo parecer foi favorável a
realização desta pesquisa.
Foram pesquisados os alimentos
industrializados considerados causadores da
DTUI, disponíveis no comércio especializado
do Recife, através de um processo de
amostragem aleatória simples, bem como os
3alimentos industrializados indicados como
dieta específica para controle da DTUI. Os
animais do Grupo I e II receberam
inicialmente ração seca industrializada de
marca popular, considerada pelos clínicos
como causadora da DTUI. Os animais que
desenvolveram manifestações clínicas da
DTUI foram submetidos a esta dieta
específica e avaliados, tendo como parâmetros
o desaparecimento dos sintomas e o resultado
das análises laboratoriais.
Os animais foram confinados em
boxes de 6,0 m x 4,0 m, onde recebiam água e
ração seca industrializada de marca popular,
ad libitum. Essa ração foi considerada pelos
clínicos veterinários como causadora da
DTUI, cuja composição básica fornecida pelo
fabricante era a seguinte: Farinha de peixe,
farinha de subprodutos de frango, farelo de
glúten de milho, milho integral moído, farelo
de soja, quirera de arroz, levedura seca de
cervejaria, miúdos de aves hidrolizados,
gordura animal estabilizada com tocoferóis
(Fonte de vitamina E). Dmetionina,
L-lisina, cloreto de sódio, cloreto de potássio,
fosfato bicálcico, taurina, ácido fosfórico,
cloreto de colina, premix vitamínico, premix
mineral. Os níveis de garantia fornecidos pelo
fabricante foram os seguintes: Umidade
(máx.) 12,00%; Proteína bruta (min.) 30,00%;
Extrato etéreo (min.) 8,00%; Matéria fibrosa
(máx.) 4,50%; Matéria mineral (máx.) 9,00%;
Cálcio (máx.) 1,90%; Fósforo (min.) 0,90%;
Lisina (min.) 0,75%; Metionina (min.) 0,57%.
Os
machos
desenvolveram
manifestações clínicas da DTUI após 2 meses
de consumo e foram submetidos a uma ração
de
qualidade
cuja
composição
básica
fornecida pelo fabricante era a seguinte:
Fígado de ave, farinha de subprodutos de ave,
carne de ave, ovo em pó, farinha de peixe,
polpa de beterraba desidratada, subprodutos
de carne de aves, farinha de arroz, proteínas
pré-digeridas de aves, gorduras de aves,
cloreto de potássio, DL-metionina, cloreto de
colina, levedura de cerveja desidratada, sal,
vitamina E, óxido de zinco, niacina, ácido
ascórbico, sulfato de manganês, acetato de
vitamina A, biotina, lecitina, pantotenato de
cálcio, mononitrato de tiamina, hidrocloreto
de piridoxina (vitamina B6), sulfato de cobre,
vitamina B12, riboflavina, inositol, vitamina
D3, ácido fólico, iodeto de potássio, carbonato
de potássio. Os níveis de garantia fornecidos
pelo fabricante foram: Proteína bruta (mín.)
32,000%; Gorduras (mín.)15,500%; Fibra
bruta (máx) 2,500%; Umidade (máx.)
10,000%; Cinzas (máx.) 7,200%; Magnésio
(máx.) 0,099%; Taurina (mín.) 0,150%;
Ácidos graxos ômega-6 (mín.) 2,350%;
Ácidos graxos ômega-3 (mín.) 0,280%.
As
fêmeas
desenvolveram
manifestações clínicas da DTUI após 3 meses
de consumo e foram submetidas a uma ração
de qualidade cuja composição básica e níveis
de garantia fornecidos pelos fabricantes foram
os seguintes: Carnes de aves desidratada,
arroz, glúten de milho, milho, gorduras de
aves, fibra de ervilha, fígado de aves
hidrolisado, sais minerais, fibra de milho,
polpa de beterraba, óleo de peixe,
fruto-oligossacarídeos (FOS), óleo vegetal, cloreto
de cálcio, ovo em pó, caseinato de sódio
(caseína),
DL-metionina,
oligoelementos
(dentre
eles,
oligoelementos
quelados),
taurina. Os níveis de garantia fornecidos pelo
fabricante foram: Proteína 30,00%; Gorduras
5,00%;Omega-6/ Omega-3 5,10%; Fósforo
0,68%; Magnésio 0,08%; Cálcio 0,83%;
Sódio 1,00%; Cloro 2,30%; Potássio 1,00%;
pH urinário 5,8–6,2; Energia metabolizável
3950kcal/kg.
Para as análises das concentrações
séricas foram realizadas, em cada animal seis
coletas de sangue durante seis meses por
punção venosa e transferido para um tubo de
ensaio de 10 mL, sem anticoagulante, para
obtenção de soro. Procedeu-se às dosagens de
proteína total, albumina, creatinina, uréia,
fosfatase alcalina, ALT e AST mediante
utilização de Kits comerciais da Marca
CELM, com leitura em analisador bioquímico
semi-automático Modelo SB – 190 CELM. E
as análises de magnésio, cálcio, fósforo,
sódio, potássio e cloreto foram efetuadas
através do seletor de íons CHARIN. As
amostras de urina foram colhidas por micção
espontânea, mensalmente, durante seis meses
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e processadas imediatamente após a colheita,
avaliadas
através
das
Tiras
Reagentes
MULTISTIX SG. O sedimento urinário foi
obtido por meio de centrifugação da urina em
1000 rpm durante 5 minutos. A seguir, o
sobrenadante foi desprezado e o sedimento
examinado em microscópio óptico em
aumento de 400X.
A análise estatística dos dados
quantitativos
obtidos
para
variáveis
relacionadas com as concentrações séricas dos
minerais, proteínas e enzimas e urinálise (pH)
realizou-se através da análise de variância
(ANOVA) considerando as fontes de variação
antes e depois do tratamento dietético para
DTUI, machos e fêmeas, separadamente, uma
vez que as médias referenciais para essas
variáveis diferem quanto ao sexo, e a
comparação entre as médias das variáveis
contínuas estudadas, foi feita através da
Diferença Mínima Significativa (DMS),
calculada através do Teste t.
Resultados e Discussão
Os animais dos Grupos I e II antes de
apresentarem a sintomatologia da DTUI,
recebiam ração seca industrializada de marca
popular, considerada como a causadora da
DTUI. Os achados clínicos avaliados nessa
pesquisa foram: obstrução urinária, disúria,
hematúria,
lambedura
da
genitália
e
polaciúria. Os machos apresentaram maior
tendência ao desenvolvimento da obstrução
uretral, parcial ou completa, presumivelmente
devido ao fato de terem a uretra mais longa e
estreita. Esses achados concordam com as
descrições de que a maior ocorrência de DTUI
nos machos deve-se à conformação anatômica
da uretra, favorecendo a instalação do
processo obstrutivo (CASE et al., 2002;
OSBORNE et al., 2004).
Os animais do Grupo II sem obstrução
apresentaram hematúria, polaquiúria, disúria,
sintomas citados por Dibartola e Buffington
(1998). Provavelmente, esse fato pode estar
relacionado com a maior ingestão do
alimento, quando comparados com rações
para controle da DTUI. Essas observações
concordam com as descrições de Case et al.
(2002) e Osborne et al. (2004), que os
alimentos secos possuem menor densidade
energética, induzindo a um maior volume
fecal, menor volume urinário e aumento da
concentração de substâncias calculogênicas na
urina. Os sintomas foram mais severos nos
machos, mas as fêmeas também foram
acometidas. A obstrução uretral completa
impede que os rins filtrem o sangue para
eliminar as substâncias tóxicas. Desta forma,
ocorre acúmulo de substâncias tóxicas
levando ao desequilíbrio ácido-básico e o
animal pode morrer em 24 a 48 horas
(CORNELL, 2003; OSBORNE et al., 2004).
Os resultados estatísticos obtidos para
os gatos do sexo masculino (Tabela 1),
apresentaram
diferença
estatisticamente
significativa quanto a creatinina (P < 0,001),
evidenciando diferenças entre a condição
antes (A) e depois (D) do tratamento dietético,
enquanto a proteína total apresenta diferença
estatisticamente significativa (P < 0,01). As
demais variáveis, porém, não apresentaram
diferenças significativas (P > 0,05) entre as
condições antes (A) e depois (D) do
tratamento dietético.
As concentrações séricas do cálcio,
fósforo, sódio, potássio, cloreto, proteína total,
uréia e fosfatase alcalina apresentaram valores
elevados antes (A) e depois (D) do tratamento
dietético, exceto o potássio e a proteína total
que apresentaram valores normais após o
tratamento dietético. As concentrações séricas
do magnésio, albumina, creatinina, AST e
ALT estão dentro dos parâmetros de
normalidade de acordo com Coles (1984),
Nelson e Couto (1994; 2001), Wingfield et al.
(1998), Bush (1999), Meyer et al. (1999). É
possível que as alterações nas concentrações
séricas da proteína total e do colesterol
estejam relacionadas com o tipo da ração
consumida, com tendências ao excesso de
consumo, pelo confinamento, estresse e
sedentarismo.
A
variação
ocorrida
na
creatinina reflete uma redução funcional ou
orgânica da função do nefron, mas, os seus
valores médios estão dentro da normalidade
segundo relatos descritos por Meyer et al.
(1999).
Tabela 1- Valores médios das variáveis quantitativas relacionadas com os minerais, proteínas e enzimas,
quadrados médios e coeficientes de variação em machos, de acordo com a condição, antes e depois da Doença do Trato Urinário Inferior.
Condição Variável
Antes (A) Depois (D)
Geral (A+D) Quadrados médios Coeficientes de variação (%) Magnésio (mg/dl) 4,0 ± 0,4a 2,9 ± 1,8a 3,3 ± 1,5 4,27ns 45,45 Cálcio (mg/dl) 11,3 ± 1,6a 10,8 ± 3,3a 11,0 ± 2,8 0,93ns 25,45 Fósforo (mg/dl) 6,6 ± 0,6a 7,2 ± 1,0a 7,0 ± 0,9 1,52ns 12,86 Sódio (mEq/l) 170,8 ± 7,3a 166,9 ± 6,9a 168,0 ± 6,9 61,36ns 4,11 Potássio (mEq/l) 6,1 ± 0,7a 5,5 ± 0,6a 5,7 ± 0,7 1,44ns 12,29 Cloreto (mEq/l) 133,0 ± 4,6a 133,8 ± 14,3a 133,5 ± 11,8 2,25ns 8,84 Proteína total (mg/dl) 7,9 ± 0,9 a 5,7 ± 1,4b 6,4 ± 1,6 18,49** 25,31 Albumina (g/dl) 2,6 ± 0,4a 2,6 ± 0,83a 2,6 ± 0,6 0,32ns 24,65 Creatinina (mg/dl) 1,0 ± 0,1b 1,5 ± 0,2a 1,4 ± 0,3 0,97*** 21,99 Uréia (mg/dl) 54,0 ± 20,9a 56,3 ± 15,0a 55,6 ± 16,6 21,78ns 29,85 Fosfatase Alcalina (UI/l) 101,7 ± 45,8 a 95,0 ± 29,7a 97,2 ± 34,6 177,78ns 35,58 ALT (UI/l) 53,2 ± 32,3a 66,8 ± 44,9a 62,3 ± 40,7 747,11ns 65,32 AST (UI/l) 41,0 ± 9,7a 57,1 ± 19,7a 51,7 ± 18,4 1034,69ns 35,58
Para uma mesma variável, médias seguidas de letras iguais, na linha, não diferem estatisticamente ao nível considerado. ns – não significativo(P > 0,05). *Significativo (P < 0,05). **Significativo (P < 0,01). ***Significativo (P<0,001). ALT – Alanina-aminotransferase. AST – Aspartato-aminotranferase.
A hiperpotassemia ou hipercalemia
observada nesta pesquisa pode ter ocorrido
pelo desvio do potássio intracelular para o
espaço extracelular e a sua excreção ser
prejudicada
pela
disfunção
renal,
especialmente pela obstrução uretral ou
acidose metabólica, favorecendo o aumento
do nível sérico de potássio e a disfunção renal
na eliminação do eletrólito e a hipernatremia
pode ocorrer em animais quando perdem água
no organismo, ou em excesso de sódio
(MEYER et al., 1999; OSBORNE et al.,
2004).
As concentrações séricas do cloreto,
antes (A) e depois (D) do tratamento dietético,
permaneceram inalteradas. A concentração
sérica do fosfato se encontrava elevada e os
valores aumentaram após o tratamento
dietético, o que evidencia um possível
desequilíbrio renal ou insuficiência renal
aguda resultante da obstrução, e que necessita
de outros recursos terapêuticos além do
tratamento
dietético.
A
elevação
da
concentração sérica da uréia deve-se à
diminuição do fluxo sanguíneo renal e à
redução da excreção de urina como na
obstrução uretral (NELSON e COUTO, 1994;
2001; OSBORNE et al., 1999, 2004) que
resultará em diminuição da excreção de uréia
e consequente aumento na concentração
sérica, como foi observado nos animais antes
e depois do tratamento dietético. Os
Lima et al. Avaliação das concentrações séricas dos minerais, proteínas, enzimas e urinálise em gatos domésticos...
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7
resultados estatísticos obtidos para as fêmeas
na
Tabela
2,
apresentaram
diferenças
estatisticamente significativas (P < 0,001)
quanto ao potássio e a creatinina. As dosagens
da proteína total e AST apresentaram
diferença estatisticamente significativa (P <
0,01) e o magnésio, cálcio e uréia, diferenças
estatisticamente significativas (P < 0,05),
evidenciando que entre as condições, antes
(A) e depois (D) do tratamento dietético,
existem diferenças nos resultados obtidos
dessas
variáveis.
As
demais
variáveis
analisadas
não
apresentaram
diferenças
estatisticamente significativas (P > 0,05).
Tabela 2 - Valores médios das variáveis quantitativas relacionadas com os minerais, proteínas e enzimas,
quadrados médios e coeficientes de variação em fêmeas de acordo com a condição, antes e depois da Doença do Trato Urinário Inferior.
Condição Variável
Antes (A) Depois (D)
Geral (A+D) Quadrados médios Coeficientes de variação (%) Magnésio (mg/dl) 2,9 ± 1,1a 1,6 ± 1,6b 2,3 ± 1,5 11,21* 65,22 Cálcio (mg/dl) 9,2 ± 0,5a 6,8 ± 3,6b 8,0 ± 2,8 32,43* 35,00 Fósforo (mg/dl) 5,7 ± 0,6a 5,1 ± 2,1a 5,4 ± 1,5 2,47ns 27,78 Sódio (mEq/l) 165,7 ± 6,7a 161,3 ± 8,5a 163,0 ± 7,8 117,0ns 4,79 Potássio (mEq/l) 6,1 ± 0,2a 5,4 ± 0,4b 5,7 ± 0,5 2,73*** 8,77 Cloreto (mEq/l) 130,8 ± 4,9a 128,7 ± 9,3a 129,7 ± 7,3 26,04ns 5,63 Proteína Total (mg/dl) 7,1 ± 1,1 a 5,3 ± 1,4b 6,2 ± 1,5 19,27** 24,75 Albumina (g/dl) 1,9 ± 0,3a 2,0 ± 0,3a 2,0 ± 0,3 0,29ns 14,50 Creatinina (mg/dl) 0,9 ± 0,2b 1,2 ± 0,2a 1,0 ± 0,3 0,70*** 23,92 Uréia (mg/dl) 55,4 ± 8,0a 48,4 ± 6,2b 51,9 ± 7,9 294,06* 15,12 Fosfatase alcalina (UI/l) 46,2 ± 19,4 a 42,9 ± 12,8a 44,5 ± 16,2 63,42ns 36,25 ALT (UI/l) 29,3 ± 11,3a 28,3 ± 11,7a 28,8 ± 11,3 5,08ns 39,14 AST (UI/l) 35,2 ± 12,1b 37,1 ± 15,6a 36,1 ± 13,7 22,41** 37,91
Para uma mesma variável, médias seguidas de letras diferentes, na linha, diferem estatisticamente no nível considerado. ns – Não significativo (P > 0,05). *Significativo (P < 0,05). **Significativo (P < 0,01). *** Significativo (P < 0,001). ALT – Alanina-aminotransferase. AST – Aspartato-aminotranferase.
Os resultados obtidos no Grupo II
(fêmeas) estão dentro dos parâmetros de
normalidade, as concentrações séricas do
magnésio, cálcio, fósforo, proteína total,
creatinina, fosfatase alcalina, ALT e AST de
acordo com Coles (1984), Nelson e Couto
(1994), Wingfield et al. (1998), Bush (1999),
Meyer et al. (1999), Nelson e Couto, (2001).
As dosagens séricas do sódio, potássio,
cloreto e uréia apresentaram valores elevados
nas fêmeas com DTUI e após o tratamento
dietético o potássio normalizou. No entanto,
o sódio, o cloreto e a uréia permaneceram
com os níveis elevados e a albumina
apresentou os níveis abaixo dos valores
normais.
O magnésio, albumina e o cálcio
reduziram seus valores de acordo com os
parâmetros de normalidade. A diminuição da
concentração sérica do magnésio depois (D)
do tratamento dietético, provavelmente está
relacionada com a dieta consumida pelos
animais. A hipoalbuminemia pode estar
relacionada com a glomerulopatia, e os
valores
de
cálcio
são
afetados
pela
concentração da albumina (MEYER et al.,
1999; OSBORNE et al., 2004). O cálcio
sérico total diminui em animais que
apresentam hipoalbuminemia, o que justifica
as alterações observadas nas fêmeas. Os
níveis elevados do sódio, cloreto e uréia, nas
fêmeas com DTUI, antes (A) e depois (D) do
tratamento dietético, podem refletir as
alterações metabólicas. As concentrações dos
íons cloreto no organismo tendem a seguir as
concentrações de sódio em pacientes com
nefropatias, e a perda de sódio ocorre na
tentativa
orgânica
de
manutenção
do
equilíbrio hídrico (MEYER et al., 1999;
OSBORNE et al., 2004). A uréia é
influenciada pelos fatores catabólicos, o que
não ocorre com a creatinina, e a velocidade de
excreção
é
influenciada
por
qualquer
anormalidade orgânica (MEYER et al., 1999).
A Tabela 3 apresenta o exame
qualitativo do sedimento urinário realizado no
grupo dos machos com DTUI, antes do
tratamento dietético, e mostra que as 8 (100%)
urinálises
dos
animais
apresentaram
cristalúria, sendo que 4 (50%) apresentaram
exclusivamente cristais de estruvita, 2 (25%)
estruvita associada a carbonato de cálcio, 1
(12,50%) fosfato de cálcio e 1 (12,50%)
fosfato
amorfo.
Depois
do
tratamento
dietético, todas as urinálises foram negativas
quanto à presença de cristais. As urinálises do
grupo das fêmeas, com DTUI (n = 12) antes
do tratamento demonstraram que 9 (75%) das
amostras apresentaram cristalúria, sendo que 8
(66,66%) possuíam exclusivamente cristais de
estruvita, 1 (8,33%) estruvita com fosfato
amorfo e 2 (16,66%) não apresentaram
cristalúria. Depois do tratamento dietético,
todas as amostras foram negativas quanto à
presença de cristais. As urinálises dos machos
e das fêmeas evidenciaram que 100%
apresentaram hematúria e proteinúria antes de
serem submetidos ao tratamento dietético.
Após o tratamento não foi observada
hematúria nos machos e fêmeas. No entanto, a
proteinúria foi evidenciada em todos os
machos
após
o
tratamento
dietético,
possivelmente
como
consequência
do
processo obstrutivo nos distúrbios renais.
Tabela 3 - Frequência absoluta (N) e relativa (%) do exame qualitativo da urinálise de machos e fêmeas com
Doença do Trato Urinário Inferior do grupo experimental antes do tratamento dietético.
Machos Fêmeas Especificação N % N % Hematúria 8 100,00 12 100,00 Proteinúria 8 100,00 12 100,00 Cristalúria 8 100,00 9 75,00 Cristais de estruvita 4 50,00 8 66,66
Estruvita + carbonato de cálcio 2 25,00 - -
Estruvita + fosfato de cálcio 1 12,50 - -
Estruvita + fosfato amorfo 1 12,50 1 8,33
Sem cristalúria - - 2 16,66
Ainda por meio da urinálise,
detectou-se nos machos com DTUI, antes (A) e depois
(D) do tratamento, um pH médio de 7,3 ± 0,4
e 6,5 ± 0,5, evidenciando-se diferença
estatisticamente significativa (P < 0,01) entre
o tempo (antes e depois). Nas fêmeas com
DTUI antes do tratamento o pH urinário
médio foi de 7,3 ± 0,9 e depois do tratamento
Lima et al. Avaliação das concentrações séricas dos minerais, proteínas, enzimas e urinálise em gatos domésticos...
Medicina Veterinária, Recife, v.3, n.1, p.1-10, jan-mar, 2009
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dietético 5,9 ± 0,3, evidenciando-se diferença
estatisticamente significativa (P < 0,001) entre
o tempo (antes e depois), como mostra a
Tabela 4.
Tabela 4 - Valores médios da variável quantitativa relacionada com o pH urinário, quadrados médios e
coeficientes de variação em machos e fêmeas, de acordo com a condição antes e depois da Doença do Trato Urinário Inferior.
Condição Sexo
Antes (A) Depois (D) Geral (A + D) Quadrados médios
Coeficientes de variação (%)
Macho 7,3 ± 0,4a 6,5 ± 0,5b 6,8 ± 0,6 3,06** 9,25
Fêmea 7,3 ± 0,9a 5,9 ± 0,3b 6,6 ± 1,0 11,4*** 14,47
Para o mesmo sexo, médias seguidas de letras diferentes, na linha, diferem estatisticamente no nível considerado. **Significativo (P < 0,01).
***Significativo (P < 0,001).