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Quando a educação é tomada como “ato subversivo”: a campanha de educação popular – CEPLAR e as ligas camponesas na Paraíba.

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE CENTRO DE HUMANIDADES

UNIDADE ACADÊMICA DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO - PPGEd MESTRADO ACADÊMICO EM EDUCAÇÃO

KELYANA DA SILVA LUSTOSA

QUANDO A EDUCAÇÃO É TOMADA COMO “ATO SUBVERSIVO”: A

CAMPANHA DE EDUCAÇÃO POPULAR – CEPLAR E AS LIGAS CAMPONESAS NA PARAÍBA

CAMPINA GRANDE - PB 2018

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KELYANA DA SILVA LUSTOSA

QUANDO A EDUCAÇÃO É TOMADA COMO “ATO SUBVERSIVO”: a Campanha de Educação Popular– CEPLAR e as Ligas Camponesas na

Paraíba

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação do Centro de Humanidades da Universidade Federal de Campina Grande, como requisito para obtenção do título de Mestre em Educação.

Linha de pesquisa: 1- História, política e gestão educacionais.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Maria do Socorro Silva

Campina Grande 2018

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KELYANA DA SILVA LUSTOSA

QUANDO A EDUCAÇÃO É TOMADA COMO “ATO SUBVERSIVO”: a Campanha de Educação Popular – CEPLAR e as Ligas Camponesas na

Paraíba

Dissertação aprovada em 23/04/2018

BANCA EXAMINADORA

____________________________________________________

Prof.ª Dra. Maria do Socorro Silva – UFCG/ PPGEd

Orientadora

_________________________________________________________ Prof. Dr. Severino Bezerra Silva – UFPB/PPGE

Examinador externo

___________________________________________________________ Prof.ª Dra. Melânia Mendonça Rodrigues – UFCG/PPGEd

Examinadora interna

____________________________________________________

Prof.ª Dra. Maria do Socorro Xavier Batista - UFPB

Suplente externo

_______________________________________________________ Prof.ª Dra. Niédja Maria Ferreira de Lima – UFCG/PPGEd

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AGRADECIMENTOS

Apesar de a construção de uma dissertação ser um caminho trilhado muito individualmente, resultante direto do pensar, do sentir e esculpir da pesquisadora, acredito que toda construção de conhecimento é um processo coletivo, e neste sentido, é também consequência da contribuição de cada um e cada uma que se dispôs a me ajudar no contexto da pesquisa.

Por isso, inicio a apresentação do produto final da pesquisa tentando expressar, nas breves linhas que seguem – mesmo sabendo que não são suficientes – a minha gratidão àqueles que considero terem sido fundamentais nesse processo.

Agradeço à orientadora, Maria do Socorro Silva, pela paciência e compreensão ao longo de cada passo trilhado nesse árduo e gratificante caminho de pesquisa. Suas orientações foram fundamentais, não só para a realização deste trabalho, mas também para meu crescimento acadêmico.

Agradeço à professora Melânia Mendonça Rodrigues, por ter acreditado na minha capacidade e me incentivado a realizar esta pesquisa e por todo apoio ao longo do processo, sempre disponível e solícita em ajudar no que pôde. Sua presença instigante é, para mim, exemplo de amorosidade e referência profissional onde busco inspirações para me tornar melhor em tudo o que faço e farei daqui por diante.

Agradeço a todos os professores do PPGEd/UFCG que contribuíram com minha formação nas aulas ministradas, nas indicações de leituras, nas críticas e sugestões nos momentos de socialização do andamento da pesquisa.

Agradeço os colegas da turma pioneira do PPGEd, pelo compartilhamento de ideias, experiências e angustias que contribuíram com meu amadurecimento pessoal e como pesquisadora. Dentre estes, cito especialmente Pâmella Tamires, companheira nos estudos de História da Educação, com quem partilhei tantas angústias e descobertas ao longo da pesquisa.

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Aos sujeitos da pesquisa, por aceitarem contribuir compartilhando suas memórias.

Ao professor Luciano Mendonça, do PPGH/UFCG, que ainda na gestação do projeto de pesquisa que resultaria nesta dissertação, me incentivou e me disponibilizou material de sua pesquisa.

Agradeço ao Programa de Educação Tutorial (PET-PEDAGOGIA) da UFCG, na pessoa da tutora Prof.ª Dr.ª Niédja Maria Ferreira de Lima, por disponibilizar o acesso à materiais de seu arquivo para constituírem fontes desta pesquisa.

Ao professor Severino Bezerra Silva, pelas contribuições na banca de qualificação e pela disponibilidade em ajudar sempre que solicitado com o desenvolvimento da pesquisa.

À Capes pela bolsa que financiou a pesquisa.

Ao Grupo de Estudos Paulo Freire (GESPAUF), cujo ambiente me proporcionou o mergulho no mar das ideias do mestre Paulo Freire, cujas águas eu até então só admirava da praia sem molhar os pés. Desse grupo, guardo a presença marcante de cada um de seus membros, em especial, os professores Cícero Agostinho e José Luiz Ferreira, e suas contribuições no aprendizado da atitude de dialogar.

Agradeço, – por último, mas não por ser de menor importância, e sim pela relutância em falar dele sem que ocorram as lágrimas – a Guilherme, por vivenciar comigo todos os passos desta pesquisa e por partilhar a vida comigo. Obrigada pelo auxílio sempre disponível, pelo abraço acolhedor, pela escuta sensível, pela paciência amorosa, pelas palavras de encorajamento quando nada parecia dar certo, palavras que me nutriram a esperança de que era possível quando eu não acreditei que seria. Por tudo isso, posso dizer seguramente: essa conquista não é minha, é nossa, companheiro!

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RESUMO

O objetivo desta dissertação foi compreender como a Campanha de Educação Popular (Ceplar) se constituiu e desenvolveu sua prática político-educativa na Paraíba, no período de 1961 a 1964, e, nesta atuação, que diálogos estabeleceu com as Ligas Camponesas da Paraíba. Visando atender a este objetivo maior, definimos os seguintes objetivos específicos: 1- Contextualizar a Educação Popular no Brasil, no cenário político-social e educacional na década de 1960, e a influência do pensamento freireano nos movimentos educativos populares do período, dentre estes a Ceplar; 2- Situar e analisar a emergência dos movimentos campesinos e movimentos educativos populares na década de 1960, e quais as articulações e fundamentos político-pedagógicos que os influenciaram; 3- Analisar a vinculação estabelecida entre a Ceplar e as Ligas Camponesas da Paraíba, e refletir sobre o porquê da prática educativa da Ceplar ter sido considerada como uma atividade de caráter subversivo. Do ponto de vista teórico, nos referenciamos na abordagem dialética, numa perspectiva do materialismo histórico para tecer nossas análises e reflexões. As categorias analíticas Estado Ampliado, Intelectual Orgânico de Antônio Gramsci e Conscientização de Paulo Freire, orientaram o esforço de apropriação e entendimento do objeto de estudo. Do ponto de vista metodológico, o processo investigativo que resultou nesta dissertação esteve ancorado em um tripé formado por três grandes procedimentos de pesquisa: o estudo exploratório, a análise documental e os relatos orais de memória. Ao longo do trabalho foi possível compreender o momento histórico e teórico que provocaram e orientaram as formulações da Ceplar, que foram: a reorientação do capitalismo na perspectiva desenvolvimentista, a efervescência política e social dos anos 1960 na Paraíba, e em todo o Brasil, o surgimento de organizações sociais campesinas, e de uma nova concepção de Educação Popular, principalmente a partir do pensamento de Paulo Freire. A prática educativo-cultural da Ceplar, embora curta e abortada pelo golpe militar, foi uma experiência muito rica ao acenar ao horizonte de possibilidade. A sua contribuição para a organização camponesa na Paraíba apontou a possibilidade de que os sujeitos campesinos, considerados invisíveis assumissem um protagonismo social. A existência de pensamentos e práticas que contribuíam para suscitar essa ideia emancipatória assustou o latifúndio e as propostas conservadoras, fazendo com que sua prática educativa fosse considerada ―subversiva‖.

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ABSTRACT

The objective of this dissertation was to understand how the Popular Education Campaign (Ceplar) was constituted and developed its political-educational practice in Paraíba, from 1961 to 1964, and in this work, which dialogues established with the Peasant League of Paraíba. In order to meet this larger objective, we defined the following specific objectives: 1 - To contextualize Popular Education in Brazil, in the politico-social and educational scenario in the 1960s, and the influence of Freirean thought in the popular educational movements of the period, among these to Ceplar; 2- Situate and analyze the emergence of peasant movements and popular educational movements in the 1960s, and what articulations and political-pedagogical foundations that influenced them; 3- Analyze the established link between Ceplar and the Peasant League of Paraíba, and reflect on why Ceplar's educational practice has been considered as an activity of subversive character. From the theoretical point of view, we refer in the dialectical approach, in a perspective of historical materialism to weave our analyzes and reflections. The analytical categories Extended State, Intellectual Organic of Antônio Gramsci and Awareness of Paulo Freire, guided the effort of appropriation and understanding of the object of study. From the methodological point of view, the investigative process that resulted in this dissertation was anchored in a tripod formed by three great research procedures: the exploratory study, the documentary analysis and the oral reports of memory. Throughout the work it was possible to understand the historical and theoretical moment that provoked and guided the formulations of Ceplar, which were: the reorientation of capitalism in the development perspective, the political and social effervescence of the 1960s in Paraíba, and throughout Brazil, the emergence of peasant social organizations, and of a new conception of Popular Education, mainly from the thought of Paulo Freire. The educational-cultural practice of Ceplar, though short and aborted by the military coup, was a very rich experience in waving to the horizon of possibility. His contribution to the peasant organization in Paraíba pointed to the possibility that peasant subjects, considered invisible, would assume a social role. The existence of thoughts and practices that contributed to this emancipatory idea frightened the latifundio and conservative proposals, making its educational practice considered "subversive".

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LISTA DE GRÁFICOS, TABELAS E FIGURAS

Gráfico 1 Temáticas relacionadas à Educação Popular nas produções do Programa de Pós-Graduação em Educação – UFPB (1977-2016)

31

Gráfico 2 Mapeamento das instituições em que se originam os trabalhos da ANPED sobre o tema

35

Quadro 1 Grupos de Trabalho da ANPED analisados 33

Quadro 2 Número de professores selecionados pela CEPLAR, por município (1963/1964)

125

Tabela 1 Mapeamento da Produção dos Grupos Temáticos da ANPED (2006-2015)

34

Figura 1 Fotografia atividade educativa da Ceplar, s/d 108 Figura 2 Encontro da UNE-Volante com o governador Pedro Gondim

(1961)

109

Figura 3 Palavras geradoras para o círculo de operários 111

Figura 1 Quadro sobre as atividades e confrontos das Ligas Camponesas na Paraíba

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ANPED Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em

Educação

AP Ação Popular

API Associação Paraibana de Imprensa

CEAA Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos

CEPLAR Campanha de Educação Popular

CED Conselho Estadual de Desenvolvimento

CNBB Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

CNEA Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo

CNER Campanha Nacional de Educação Rural

CONTAG Confederação Nacional dos Trabalhadores na

Agricultura

CPC Centro Popular de Cultura

CRUZADA ABC Cruzada de Ação Básica Cristã

GT Grupo Temático

IPM Inquérito Policial Militar

JAC Juventude Agrária Católica

JEC Juventude Estudantil Católica

JOC Juventude Operária Católica

JUC Juventude Universitária Católica

MASTER Movimento dos Agricultores Sem Terra

MCP Movimento de Cultura Popular

MEB Movimento de Educação de Base

MOBRAL Movimento Brasileiro de Alfabetização

PCB Partido Comunista Brasileiro

PCdoB Partido Comunista do Brasil

PPGE Programa de Pós-Graduação em Educação

SAR Serviço de Assistência Rural

SEC-UR Serviço de Extensão Cultural da Universidade do Recife

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Contemporâneo

SIREPA Sistema Rádio Educativo da Paraíba

SORPE Serviço de Orientação Rural de Pernambuco

SUDENE Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste

TPI Termo de Perguntas ao Indiciado

UCDB Universidade Católica Dom Bosco

UERJ Universidade do Estado do Rio de Janeiro

UFF Universidade Federal Fluminense

UFCG Universidade Federal de Campina Grande

UFPB Universidade Federal da Paraíba

UFPE Universidade Federal de Pernambuco

UEPG Universidade Estadual de Ponta Grossa

UFMG Universidade Federal de Minas Gerais

UFPel Universidade Federal de Pelotas

ULTAB União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil

UNE União Nacional dos Estudantes

UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

UNISAL Centro Universitário Salesiano de São Paulo

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SUMÁRIO

1. CONSTRUÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO E ASPECTOS

TEÓRICO-METODOLÓGICOS DA PESQUISA...11

1.1 Primeiros passos: da escolha do tema aos objetivos da pesquisa ... 11

1.2 Contextualizando o objeto de estudo ... 14

1.3 Referenciais teórico-metodológicos da pesquisa ... 15

1.3.1 Categorias Analíticas de conteúdo ... 20

1.4 As trilhas da investigação: procedimentos e instrumentos ... 28

1.4.1 O Estudo exploratório: a produção acadêmica na temática...29

1.4.2 A análise documental: aproximação com a história da prática educativa ... 36

1.4.3 Relatos Orais de memória: a narrativa do vivido... 36

1.5 Tratamento das informações: análise de conteúdo ... 38

1.6 A organização do trabalho ... 39

2. A EDUCAÇÃO POPULAR COMO UM NOVO PARADIGMA NA AMÉRICA LATINA: FUNDAMENTOS E DESAFIOS HISTÓRICOS... 41

2.1. A construção conceitual da Educação Popular na América Latina ... 41

2.2. A Educação Popular no Brasil: diferentes conceituações ... 46

2.2.1. Educação Popular como extensão da escolarização pública ... 48

2.2.2. Educação Popular como Educação de Adultos: Campanhas e Programas dos anos 1940-1950 ... 51

2.2.3. Educação Popular como Educação dos Oprimidos ... 55

2.3. Fundamentos da Educação Popular a partir de Paulo Freire... 61

3. EMERGÊNCIA DOS MOVIMENTOS CAMPESINOS E DOS MOVIMENTOS EDUCATIVOS POPULARES: AS LIGAS CAMPONESAS E A CEPLAR ... 67

3.1 Os movimentos campesinos: o aprendizado da classe e da liberdade ... 68

3.2 As influências do Partido Comunista e da Igreja Católica nas lutas camponesas na região Nordeste e na Paraiba ... 77

3.2.1 O Partido Comunista Brasileiro ... 77

3.2.2 A Igreja Católica: o embate entre conservadores e progressistas na relação com o campesinato ... 85

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4. QUANDO ALFABETIZAR CAMPONESES SE TORNA SUBVERSÃO: a

atuação da Ceplar junto as Ligas Camponesas na Paraíba ... 94

4.1 A Campanha de Educação Popular (Ceplar): origem e itinerário ... 94

4.1.1 Primeiras atividades ... 99

4.1.2 A relação com Paulo Freire. ... 102

4.1.3 O trabalho com o teatro ... 105

4.2 O trabalho com a educação de adultos ... 110

4.3 A Liga Camponesa da Paraíba e sua relação com a Ceplar ... 118

4.4 Conflitos internos ... 129

4.5 Conflitos externos: A ação educativa da Ceplar como ato subversivo ... 135

CONSIDERAÇÕES FINAIS: Contribuições da Ceplar para a Educação Popular, desafios e contradições ... 143

REFERÊNCIAS ... 147

APÊNDICE ...154

(14)

1. CONSTRUÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO E ASPECTOS

TEÓRICO-METODOLÓGICOS DA PESQUISA

A presente investigação tem como objeto a Campanha de Educação Popular da Paraíba – Ceplar, que desenvolveu um conjunto de ações no campo da Educação Popular destinado aos jovens e adultos da classe trabalhadora no início da década de 1960, no Estado da Paraíba. Nosso objetivo é compreender como a Ceplar se constituiu e desenvolveu sua prática político-educativa na Paraíba, no período de 1961 a 1964, e, nesta atuação, que diálogos estabeleceram com as Ligas Camponesas da Paraíba. Neste capítulo introdutório, buscamos problematizar nosso objeto do estudo, os objetivos e os caminhos teóricos e metodológicos que construímos para nos acercarmos do mesmo, visando responder as questões e os objetivos delineados para a investigação, questões que trataremos a seguir.

1.1 Primeiros passos: da escolha do tema aos objetivos da pesquisa

A motivação por este objeto de estudo remonta da participação de um evento acadêmico denominado: III Seminário Percursos do Pensamento Educacional Contemporâneo (SePPEC)1, realizado na UFCG, em dezembro de 2014, que teve como temática, Memórias da Cultura e Educação dos anos de 1960. Ao enfocar a mobilização social nos campos da Cultura e da Educação Popular, ocorrida nos primeiros anos da década de 1960, conferiu-se especial relevo à Campanha de Educação Popular da Paraíba – Ceplar, por meio de debates e relatos de memórias de pessoas que participaram da referida Campanha.

Esse foi nosso primeiro encontro com o debate da Educação Popular, e, consequentemente, com a Campanha de Educação Popular da Paraíba – Ceplar, o que aguçou nossa curiosidade em conhecer e compreender a atuação política e pedagógica desta Campanha junto à classe trabalhadora do campo e da cidade do

1

O referido evento foi organizado pelo PET-Pedagogia da UFCG e contou, em sua programação com falas de militantes da Ceplar, como Isa Guerra, e estudiosos da Educação Popular, como o professor Osmar Fávero.

(15)

Estado da Paraíba, num contexto marcante da história brasileira como foram os primeiros anos da década de 1960 até o golpe e implantação da ditadura militar, que acarretou no desmantelamento das organizações sociais populares e dos movimentos educativos que atuavam em nosso País.

A esse interesse pessoal, somou-se a intenção de realizar uma pós-graduação, e o aceno à possiblidade de concretização deste desejo surgiu com a criação de um Mestrado em Educação, na UFCG. O ingresso no Programa de Pós-Graduação materializava o desejo de investigar sobre a Ceplar e buscar respostas para as questões que nos acompanhavam, tais como: como se constituiu e se desenvolveu a prática educativa da Ceplar no Estado da Paraíba? Que sujeitos influenciaram a prática da Ceplar? Como se deu a relação da Ceplar com as Ligas Camponesas? Por que a ação da Ceplar foi considerada como subversiva pelo Estado Militar?

O direcionamento do olhar investigativo para a área de História da Educação, a partir dos estudos da Educação Popular, se apresentou como uma novidade teórica e prática para o itinerário acadêmico e profissional que tínhamos até então, similarmente, o interesse e a curiosidade despertada pela temática também nos aproximaram de leituras que contribuíram para o conhecimento do objeto. Dentre estas, destacamos:

- a leitura de Porto e Lage (1995), duas dirigentes da Campanha de Educação Popular que registram, a partir de suas memórias de militantes deste movimento educativo, num diálogo com outras fontes como jornais da época, a origem da Campanha, sua atuação, relações com diferentes instituições e organizações e sua extinção com o golpe militar em 1964.

- a leitura de Scocuglia (2001) abre uma senda nova de investigação sobre Educação Popular ao realizar uma análise documental dos inquéritos policiais militares, realizados com militantes e educadores/as dos movimentos educativos, identificando os dispositivos discursivos contidos nestes documentos, que colocavam a prática educativa destes movimentos, dentre os quais a Ceplar, como ―atividade subversiva‖.

Estas leituras, como um procedimento inicial, nos possibilitaram encarar uma primeira dificuldade, de natureza conceitual, sobre a problemática, e nos ajudou a fazer escolhas sobre os caminhos metodológicos construídos na pesquisa. Assim, definimos a problemática da pesquisa formulada na seguinte questão: Que diálogos a Ceplar estabeleceu com as Ligas Camponesas na Paraíba e em que medida essa

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interação influenciou para que a prática educativa da Campanha fosse considerada como atividade subversiva?

Com a intencionalidade de responder a esta problemática, tivemos como objetivo geral: Compreender a prática educativa da Ceplar na Paraíba na década de 1960, e sua vinculação com as Ligas Camponesas. Nesta direção, definimos os seguintes objetivos específicos para guiar o processo investigativo que buscou responder a questão colocada acima:

1- Contextualizar a Educação Popular no Brasil, no cenário político-social e educacional na década de 1960, e a influência do pensamento freireano nos movimentos educativos populares do período, dentre estes a Ceplar;

2- Situar e analisar a emergência dos movimentos campesinos e movimentos educativos populares na década de 1960, e quais as articulações e fundamentos político-pedagógicos que os influenciaram;

3- Analisar a vinculação estabelecida entre a Ceplar e as Ligas Camponesas da Paraíba, e refletir sobre o porquê da prática educativa da Ceplar ter sido considerada como uma atividade de caráter subversivo.

O recorte temporal escolhido para problematizar a atuação da Ceplar é o período de 1961 e 1964, tendo em vista que se trata, respectivamente, do ano de fundação da Campanha e do ano em que suas ações são interrompidas pela eclosão do golpe militar no Brasil.

A Educação Popular me inquietou, pois, ao longo do curso de História, as disciplinas que tratavam da educação partiam sempre da educação escolar formal e, mesmo quando estudávamos o período pré-ditadura militar no Brasil, nunca foram mencionados os movimentos de Educação Popular, mesmo tendo existido aqui mesmo no Estado da Paraíba um movimento desta natureza. Como se diz, popularmente, aquilo que está encoberto desperta mais curiosidade, e talvez tenha sido isso mesmo que inquietou com relação à Ceplar.

Já os estudos sobre as lutas camponesas e sobre a própria história das Ligas Camponesas são mais descortinados no campo acadêmico, destarte não me cabe, nem interessa aqui recontar essas histórias, o que proponho é buscar, nas encruzilhadas desses caminhos, os encontros, parcerias e as faíscas que surgiram

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entre as ―agitações‖ camponesas e a ―subversão‖ educativa dentro do ―terreno minado‖ do Nordeste Brasileiro dos anos 1950/1960.

1.2 Contextualizando o objeto de estudo

A Ceplar surgiu e atuou em um cenário político tensionado por projetos hegemônicos distintos e esteve mergulhada no contexto de intensa mobilização social que marcou as décadas de 1950 e 1960 da História do Brasil.

Como parte dessa mobilização, ocorreu a organização de vários movimentos educativos populares, dentre os quais: Movimento de Cultura Popular (MCP), em Pernambuco, a Campanha de Pé no Chão Também se Aprende a Ler, no Rio Grande do Norte, e a Campanha de Educação Popular (Ceplar), na Paraíba, objeto de nosso estudo. Todas as práticas protagonizadas por tais movimentos e organizações traduziram possibilidades, seja para aqueles que buscavam transformar as estruturas sociais brasileiras, seja para os que buscavam formar eleitores estabelecendo uma estreita relação entre as ações políticas e as ações educativas (Scocuglia, 2001).

Naqueles anos, especialmente o Nordeste brasileiro foi, também, palco do surgimento de organizações sociais no campo, destacando-se as Ligas Camponesas. Conforme Fávero (1983),

Os anos 1960-64 foram particularmente críticos e criativos em quase tudo. Questionaram-se todos os modos de ser brasileiro, de viver um momento da história desse país, de participar de sua cultura. Pretendeu-se um projeto político que possibilitasse superar a dominação do capital sobre o trabalho e, em decorrência, reformular tudo o que dessa dominação decorre. Tudo isso – e muito mais – foi repensado discutido em círculos cada vez mais amplos, das ligas camponesas às universidades. (FÁVERO, 1983, p. 8-9)

É nesse contexto que se organiza a Campanha de Educação Popular da Paraíba – Ceplar, como resultado de um movimento, presente na sociedade brasileira, de contraposição às condições de vida e expropriação causada pelo modelo hegemônico. Sua origem, no início de 1960, decorre do esforço de engajamento social e do questionamento da realidade social brasileira empreendido por um grupo de estudantes das faculdades de Filosofia, Ciências Sociais e Letras da Universidade Federal da Paraíba ligados à Juventude Universitária Católica

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(JUC), que encontraram no governo do Estado da Paraíba as condições materiais necessárias para o desenvolvimento de seu projeto, que pretendia ―contribuir para a formação de adultos conscientes que participassem do processo de mudança do país‖ (PORTO; LAGE, 1995, p.39).

A atuação da Ceplar, junto aos jovens e adultos da classe trabalhadora, foi desenvolvida, inicialmente, em bairros da capital paraibana e junto a camponeses dos municípios de Sapé, Mari, Miriri, onde era forte a organização das Ligas Camponesas, e Rio Tinto, onde funcionava uma fábrica de tecidos e predominava a organização sindical. Essa diversidade de atuação e de parcerias foi modificando a ação da instituição e ampliando sua ação no Estado da Paraíba, destacando-se, assim,

a vivência e a prática coletivas dessa entidade que começou em João Pessoa, capital do Estado da Paraíba, com um grupo reduzido de estudantes universitários e que terminou com centenas de pessoas de classes, níveis e extratos sociais os mais diversos, atuando em nove cidades do Estado. (PORTO; LAGE, 1995, p. 5).

Em 1964, a Ceplar foi atingida pela repressão que se seguiu ao golpe militar, tendo suas ações interrompidas, assim como as organizações campesinas e outros movimentos sociais.

1.3 Referenciais teórico-metodológicos da pesquisa

A necessidade de uma apropriação analítica e reflexiva do objeto pesquisado nos levou a refletir sobre sua materialização no contexto do Estado desenvolvimentista popular da década de 1960, a partir das características econômicas, sociais, políticas e educacionais que colocavam uma prática educativa popular, como a da Ceplar, numa relação contraditória de parceria com o Estado, com a Igreja, com o Partido Comunista e com as organizações sindicais e as Ligas Camponesas. Assim, nos aproximamos da abordagem dialética, numa perspectiva do materialismo histórico, para empreender uma reflexão que nos possibilitasse compreender tal relação contraditória, que, ao mesmo tempo colocava, por um lado, a necessidade de integração da maioria da população analfabeta rumo ao desenvolvimento do país, através da educação e da cultura, e por outro, ao efetivar

(19)

sua atuação junto à classe trabalhadora do campo e da cidade com o objetivo de contribuir para a formação de adultos conscientes, tensionada pela necessidade de mudanças sociais e políticas no contexto em que estavam inseridos.

Como lembra Minayo (2002), a abordagem dialética considera que o fenômeno social tem de ser entendido nas suas determinações históricas e sociais e nas transformações, nos sujeitos e seu contexto, requerendo que se trabalhe com a complexidade e especificidade que as questões sociais apresentam nos contextos históricos em que se materializam, e quais as relações que se constroem entre os diferentes sujeitos e instituições.

Tratando-se de movimentos educativos, portanto, tal entendimento é crucial, pois, como destaca Paiva (1973), os sistemas educacionais e os movimentos educativos, em geral, refletem as condições sociais, econômicas e políticas da sociedade sobre a qual influem e servem: ―Toda educação provém de uma situação social determinada e as metas educacionais, a política da educação e a orientação do ensino mostram de forma clara o seu caráter histórico‖ (PAIVA, 1973, p.19).

Ao propormos uma análise de um movimento educativo popular cujas práticas educativas se voltaram, num determinado momento histórico, ao questionamento da estrutura estabelecida e à luta pela construção de uma hegemonia popular, entendemos que, para analisar tal movimento, devemos contextualizá-lo em sua historicidade e em sua relação com a totalidade social em que esteve inserida, considerando os determinantes sociais, políticos e econômicos que infligiram sobre ele.

Nesse sentido, as categorias metodológicas – contradição/totalidade/historicidade – fundamentaram o processo investigativo na busca de uma postura crítica ao longo do processo de coleta e análise das informações. As relações entre os fenômenos foram vistas dentro de um processo de conflitos da formação social capitalista e de uma sociedade marcada por um Estado desenvolvimentista, pois,

O regime populista que se instalou nesse período, ao procurar o apoio das massas, no campo e na cidade, levantou importantes bandeiras de luta: dar direitos e formas legais de defesa às massas trabalhadoras, elevar o seu nível cultural, favorecer a sua organização. Em muitas ocasiões o movimento das massas em busca da construção de um país moderno, com um sistema econômico e social mais justo foi além das propostas do populismo gerando, com isso, a exacerbação dos conflitos com as forças de

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oposição e, às vezes, com o próprio regime populista (PORTO; LAGE, 1995, p.20).

Compreender e analisar o objeto dentro desse contexto foi de fundamental importância para o entendimento de sua atuação e dos limites postos pela materialidade histórica, que produziram transformações em sua proposta, pois como nos coloca Frigotto (2000), a metodologia do materialismo histórico não pode constituir-se numa ―doutrina‖ ou numa ―camisa de força‖ fundada sob categorias gerais não-historicizadas. Afirma o autor que:

Para ser materialista e histórica, tem de dar conta da totalidade, do específico, do singular e do particular. Isso implica dizer que as categorias totalidade, contradição, mediação, alienação não são apriorísticas, mas construídas historicamente (FRIGOTTO, 2000, p. 73).

A esse respeito, também se destaca a afirmação de Thompson (1981), de que as categorias adequadas à investigação da história são categorias históricas. Para esse autor, o materialismo histórico distingue-se de outros sistemas interpretativos pela sua ―obstinação teimosa‖ em elaborar tais categorias, articulando-as numa totalidade conceitual. Enfatiza Thompson que:

Essa totalidade não é uma ‗verdade‘ teórica acabada (ou Teoria); mas também não é um "modelo" fictício, é um conhecimento em desenvolvimento, muito embora provisório e aproximado, com muitos silêncios e impurezas. O desenvolvimento desse conhecimento se dá tanto na teoria quanto na pratica: surge de um diálogo e seu discurso de demonstração é conduzido nos termos da lógica histórica. (THOMPSON, 1981, p. 61) (destaques originais do autor).

Nesse sentido, nos referenciamos no aporte teórico do materialismo histórico-dialético, não como uma doutrina a ser seguida, muito menos com a pretensão ingênua de que este referencial nos leve à verdade dos fatos, mas como u m arcabouço consistente que nos ajude a compreender o fenômeno histórico que é objeto de nossa investigação.

A necessidade de subsidiar a nossa argumentação sobre a prática educativa da Ceplar e sua relação com a organização social camponesa nos remeteu, necessariamente, a aprofundar o entendimento da concepção de Educação Popular, visto que, essa concepção influenciou o surgimento de diferentes movimentos educativos, durante a década de 1960, que se efetivaram como prática de resistência ao modelo hegemônico de cultura e educação do período.

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Essa perspectiva metodológica suscitou um conceito fundamental para a investigação – a Educação Popular, que neste trabalho foi adotada como ―uma concepção educativa que vincula explicitamente a educação e a política, na busca de contribuir para a construção de processos de resistência e para a emancipação humana, o que requer uma ordem societária que não seja a regida pelo capital‖. (PALUDO, 2015, p.220).

Essa formulação, que emerge na América Latina principalmente a partir da década de 1960, ressignifica a Educação Popular como uma teoria e prática educativa, e desempenha na sociedade um papel de resistência e emancipação ao questionar o conceito hegemônico2 de educação.

Assim, a América Latina se insurge contra a acumulação do capital numa síntese social, que gera assimetrias e subalternidades, na intencionalidade de contribuir na construção da resistência e de outro projeto societário. Portanto, numa perspectiva de descolonização da sociedade e das relações sociais. Constituem-se exemplos deste movimento:

José Martín (Cuba, 1853-1895), que se dedicou à independência e defendia uma educação científica e técnica junto com a formação ética e política do povo; José Carlos Mariátegui (Peru, 1894-1930), que defendia o socialismo, as universidades populares e a escola única para os peruanos; Franz Fanon (Ilha Martinica/Caribe, 1925-1961), que propunha uma pedagogia voltada para a luta concreta e conjunta dos condenados da terra; Ernesto Che Guevara de La Serna (Argentina/Cuba, 1929-1976), em cujas fileiras ninguém poderia continuar sem saber ler e escrever; subcomandante insurgente Marcos (México/Chiapas), defendendo a ideia de uma educação rebelde e autônoma; Paulo Freire (Brasil, 1921-1997), que propunha a educação como prática da liberdade. (PALUDO, 2015, p. 225)

A demanda por esse tipo de educação provém de setores "oprimidos" dentro de uma estrutura e dinâmica social organizadas pela forma capitalista de produção,

o que, historicamente, sempre gerou uma contradição entre estes diferentes interesses e perspectivas. Isto é, ―a relação entre a centralidade da intencionalidade da Educação Popular, o movimento ou direcionalidade do projeto hegemônico e a

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Gramsci (1978) define a hegemonia – e pode-se dizer que no seu âmbito também a resistência – como a capacidade de um grupo social unificar-se em torno de sua proposta política, um bloco mais amplo, não homogêneo, marcado por contradições de classe. A hegemonia seria a direção moral e intelectual de uma sociedade, onde a dominação ―física‖ e corpórea é auxiliada pela instauração do consenso. O poder de coesão, conectado ao consenso, constituiria o predomínio de uma visão social de mundo e de convívio social.

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direcionalidade do movimento do popular, suas lutas e intencionalidades políticas‖.

(PALUDO, 2001, p. 55).

Streck (2013) conceitua a Educação Popular como movimento pedagógico que representa resistência a um processo de dominação, seja de classe, gênero, etnia ou outros modos de subalternização. Essa perspectiva é reafirmada em Silva (2009), quando enfatiza o posicionamento político dessa concepção educativa, visto que, a denominação popular constitui-se como resultante dos processos socioculturais e políticos das lutas das organizações populares, como expressão da resistência às estruturas de dominação e, principalmente, das diferentes práticas educativas desenvolvidas em diferentes espaços, tempos e sujeitos no continente latino-americano.

Segundo Silva (2009), a discussão sobre o popular e sua vinculação com a educação leva também a uma reflexão sobre as classes populares3, os movimentos sociais e a constituição do Campo Popular, que é constituído por estas forças contra hegemônicas.

Para Paludo (2006), o Campo popular são forças políticas e culturais contra hegemônicas que se articulam, conformando campos sociais que guardam relação com a esfera da economia, da cultura, com visões sociais de mundo, orientam sua teorização sobre a realidade e suas ações numa perspectiva de transformação social. Dessa maneira,

O Campo Popular, embora nem sempre de forma explícita nos textos, decorre de um pressuposto de análise da realidade que compreende a sua dinâmica como sendo posta em movimento pela inter-relação entre uma quantidade significativa de forças que são políticas e culturais e se articulam conformando campos sociais, que sempre guardam relação com a esfera da economia. Estes campos possuem ‗visões sociais de mundo‘ que orientam tanto as teorizações da realidade, quanto as ações. (PALUDO, 2006, p.45)

A historicidade se constitui a partir de forças econômicas, política e culturais. Assim, no processo de organização das classes populares, não podemos superestimar o papel da educação, mas também não podemos deixar de perceber o papel que ela pode desempenhar no processo de emancipação humana. Paulo Freire (1995), numa visão sempre dialética acerca do alcance e dos limites de uma prática educativa na construção da cidadania, ressalta que:

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Na conceituação de Wanderley (1987), Classes populares, no plural, compreendendo o operariado industrial, a classe trabalhadora em geral, os desempregados e subempregados, o campesinato, os indígenas, os funcionários públicos, os profissionais e alguns setores da pequena burguesia.

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Não dá para dizer que a educação crie a cidadania de quem quer que seja. Mas, sem a educação, é difícil construir a cidadania. A cidadania se cria com uma presença ativa, crítica, decidida, de todos nós com relação à coisa pública. Isso é dificílimo, mas é possível. A educação não é a chave para a transformação, mas é indispensável. A educação sozinha não faz, mas sem ela também não é feita a cidadania. (FREIRE, 1995, p. 74)

Aqui, a historicidade sempre presente nas formulações de Freire nos ajuda a compreender tal desafio de construção de uma prática educativa contra hegemônica num cenário permanente de curtas vivências democráticas e longos períodos de repressão, o que exige, portanto,

O aprendizado de outra virtude se impõe: a perseverança, tenacidade com que devemos lutar por nosso sonho. Não podemos desistir nos primeiros embates, mas a partir deles aprender como errar menos. Na existência de uma pessoa, cinco, dez, vinte anos representam alguma coisa, às vezes muito. Mas não na história de uma nação. (FREIRE, 1995, p.47)

Essa reflexão contribuiu para buscar entender as lutas e organizações campesinas, em especial, a Liga Camponesa de Sapé, num embate permanente contra a opressão e exploração dos sujeitos do campo, e como num curto período de tempo, de 1955 a 1964, conseguiram travar tantas frentes de lutas e parcerias, inclusive, no entendimento da contribuição que a Educação Popular poderia trazer para a organização da classe e da transformação da realidade tendo como ponto de partida o lugar do oprimido.

1.3.1 Categorias Analíticas de conteúdo

Minayo (1996) esclarece que os conceitos mais importantes dentro de uma teoria são as categorias. As categorias que servem de critério de seleção e organização da teoria e dos fatos a serem investigados, a partir da finalidade da pesquisa, fornecendo-lhe o princípio de sistematização que vai lhe conferir sentido, cientificidade, rigor, importância. Assim, para esta autora, as categorias analíticas são aquelas que retêm as relações sociais fundamentais e podem ser consideradas balizas para o conhecimento do objeto nos seus aspectos gerais.

As categorias analíticas Estado Ampliado, Intelectual Orgânico de Antônio Gramsci e Conscientização de Paulo Freire, orientaram o esforço de apropriação e

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entendimento do nosso objeto de estudo. Consideramos pertinente dizer, brevemente, o que entendemos e o porquê elegemos essas categorias de análise.

a) Concepção de Estado Ampliado

Para os clássicos, como Marx e Lênin, o Estado é entendido com um aparelho de dominação de classe que usa a repressão e a força para exercer essa dominação sobre outra classe. Gramsci não nega o conceito de Estado de Marx: amplia esse conceito acrescentando que além do uso da coerção, tem-se a busca do consentimento. Ou seja, é preciso ganhar a adesão dos dominados através da construção de um projeto ideológico e cultural, manifestado em forma de senso comum, que justifique e legitime o poder do dominador, sem o qual, para Gramsci, não seria possível a manutenção de sua função hegemônica na sociedade. Para ele, o Estado é um composto entre a sociedade política — arena das instituições políticas e do controle legal constitucional que compreende os aparelhos de coerção sob o controle das burocracias executivas e policial-militar — e a sociedade civil, constituída como uma esfera 'privada' ou 'não estatal', ou seja, o conjunto de instituições/organizações responsáveis pela elaboração e/ou difusão de ideologias, por meio do sistema escolar, das igrejas, dos partidos políticos, dos sindicatos, dos meios de comunicação, entre outros.

Desse modo, o conceito de Estado, para Gramsci, refere-se à relação dialética entre sociedade política e sociedade civil, a concepção de Estado para esse autor é ampliada, pois ele não considera Estado como restrito apenas ao governo.

Para Coutinho (1992), a teoria ampliada do Estado em Gramsci apoia-se, justamente, na identificação dos ―aparelhos privados de hegemonia‖, responsáveis pela elaboração ou difusão das ideologias. Esses ―aparelhos privados‖ compreenderiam as escolas, igrejas, sindicatos, partidos políticos, revistas, jornais e outros meios de comunicação de massa formando a sociedade civil. Mas a esfera da sociedade civil, por si só, não corresponde ao Estado gramsciano, pois há também a sociedade política, correspondente aos mecanismos pelos quais a classe dominante detém e exerce a repressão e a violência, como o governo, a burocracia, o sistema judiciário e as forças armadas.

O entendimento do conceito de Estado ampliado em Gramsci passa, necessariamente, pela sua concepção de ser humano como um ser de processo,

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imerso na relação com outros seres humanos e com o contexto em que vive. Também é relevante a análise por ele desenvolvida das relações de forças dentro da formação histórica capitalista, relativa à disputa das classes em busca da direção sobre as outras classes.

Para exercer seu domínio sobre as demais classes, a classe dominante impõe seus interesses e concepções de mundo como se fossem universais e pertencentes às demais classes, ou seja,

Esta relação existe em toda a sociedade no seu conjunto e em todo indivíduo com relação aos outros indivíduos, entre camadas intelectuais e não intelectuais, entre governantes e governados, entre elites e seguidores, entre dirigentes e dirigidos, entre vanguardas e corpos de exército. Toda relação de ‗hegemonia‘ é necessariamente uma relação pedagógica, que se verifica não apenas no interior de uma nação, entre as diversas forças que a compõem, mas em todo o campo internacional e mundial, entre conjuntos de civilizações nacionais e continentais (GRAMSCI, 1999, p. 399).

A afirmação de Gramsci de que ―toda relação de hegemonia é necessariamente uma relação pedagógica‖ nos permite pensar a educação numa dupla conceituação: como instrumento de dominação e reprodução das relações de produção capitalistas que serve à manutenção da burguesia no domínio da sociedade e como instrumento emancipatório, quando uma pedagogia é formulada a partir do lugar do oprimido, pode assumir força política que sirva à consolidação de uma contra hegemonia.

Esse referencial torna-se importante para nosso entendimento de como no início da década de 1960, o Estado nacional-populista passa a patrocinar algumas iniciativas de Educação Popular, ou mesmo propor algumas ações com a finalidade de erradicar o analfabetismo no país.

Esta ânsia de mudança crescia e se ampliava. Durante o governo do presidente João Goulart (1961 a 1964) o tema da participação das massas populares no processo de mudança social tornou-se central. A participação dessas massas era a garantia de que a mudança da sociedade brasileira se daria no sentido da justiça social, da criação de uma sociedade socialista, igualitária. A quem interessava a mudança? Às massas desfavorecidas e marginalizadas politicamente. Onde buscar os aliados para a luta transformadora? Nesta massa. Algumas palavras de ordem importantes da luta da época se transformaram em metas governamentais: ‗Extensão do voto para o analfabeto‘. ou ‗Distribuição de terras para os camponeses‘. João Goulart estimulou a organização do campesinato como força política, promovendo a sindicalização rural. Escolheu também a erradicação do analfabetismo como uma das metas de seu governo. Mobilização e organização popular foram às respostas dos que se consideravam forças progressistas, trabalhando no

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sentido da História e com a ‗Força da História‘, às chamadas forças reacionárias. Porque estas existiam, claro, mas seriam vencidas. O futuro estava conosco. Os Movimentos de Cultura Popular espalharam-se rapidamente por todo o país. As Ligas Camponesas, seguindo o exemplo de Pernambuco, alastraram-se, sobretudo, pelo Nordeste. (PORTO; LAGE, 1995, p. 25). (destaques originais)

Esse registro, a partir das memórias de militantes da Ceplar, nos mostra claramente a política de aliança que se estabeleceu na contradição desenvolvimentista populista, entre os movimentos populares e o governo de Jango, e na Paraíba de Pedro Gondim, que se efetiva a partir de uma tensão permanente de jogos de poder, de ambiguidades de interesses e estratégias conforme podemos verificar na fala das autoras:

Todo esse esforço, é claro, não se dava num clima de harmonia, num clima idílico; se havia ajuda, diálogo, havia também desconfiança mútua, luta pelo poder. [...] Visto com a ótica de agora, dir-se-ia que os brasileiros de então foram atacados pelo ‗vírus‘ da ingenuidade. Como não ter consciência da fragilidade de sua organização para enfrentar bases de poder seculares? Não se deve esquecer, entretanto, que nos anos 60 o bloco socialista parecia uma experiência solidificada. Cuba, bem próxima, era outra prova de que mudanças eram possíveis. Era o socialismo implantando-se na América Latina. A pergunta não era se ocorreria a mudança das estruturas sociais injustas da sociedade brasileira. A pergunta era como esta se efetuaria. Pela via pacífica ou revolucionária? Entre aqueles que participaram da luta pela transformação do Brasil havia muita divergência política e ideológica, mas estavam unidos por alguns pontos ‗inquestionáveis‘: as estruturas injustas tinham que ser modificadas; (PORTO; LAGE, 1995, p. 25-26)

As ambiguidades postas pelo governo desenvolvimentista popular, o aumento da tensão rural e urbana, a incorporação pelo governo federal do debate das Reformas de Base, levou o acirramento dos conflitos de classe, com a burguesia nacional, o latifúndio e o capital internacional culminou no golpe militar de 1964, com a formação de um novo bloco no poder4.

b) Intelectual Orgânico

O entendimento sobre o conceito de Estado e do processo de formação da hegemonia passa, necessariamente, pela reflexão Gramsciana de Intelectual Orgânico. Conceito desenvolvido pelo autor, principalmente nos Cadernos dos

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. Usamos bloco no poder aqui, de acordo com a conceituação de Poulantzas (1977), enquanto unidade contraditória de uma classe, ou de frações de classe, politicamente dominante na sua relação com uma forma particular de Estado capitalista.

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Cárceres, cuja reflexão sobre a necessidade da formação de uma consciência crítica, por parte dos grupos subalternos, leva o autor a discutir o papel educativo-cultural a ser desempenhado pelos intelectuais na contribuição para conservar ou mudar o projeto hegemônico, pois,

Uma das características mais marcantes de todo grupo que se desenvolve no sentido do domínio é sua luta pela assimilação e pela conquista ‗ideológica‘ dos intelectuais tradicionais, assimilação e conquista que são tão mais rápidas e eficazes quanto mais o grupo em questão for capaz de elaborar simultaneamente seus próprios intelectuais orgânicos (GRAMSCI, 2001, p. 19) (destaques originais do autor).

Mas quem são os intelectuais? O termo ―intelectual‖, amplamente utilizado no ambiente acadêmico-científico, suscita significados variados e é utilizado para identificar diversos indivíduos ou grupos sociais. Contudo, Gramsci (2001) define o intelectual, não pela erudição pessoal, mas pela função social, explicitando a percepção do caráter mediador dos intelectuais entre as classes sociais e o Estado.

Para Gramsci (2001, p.21), os intelectuais são os ―prepostos do grupo dominante para o exercício das funções subalternas da hegemonia social e do governo político‖. O autor diferencia os intelectuais orgânicos dos intelectuais tradicionais, logo, os intelectuais orgânicos são aqueles criados pela própria classe para organizar e manter sua hegemonia; já os intelectuais tradicionais seriam aqueles que, tendo sido no passado intelectuais orgânicos de dada classe, mantêm, depois, certa independência e autonomia, ajustando-se no interior do bloco dominante.

Gramsci reflete em seus escritos a necessidade da formação de uma consciência crítica e de uma nova concepção de mundo dos grupos subalternos. Pois se a dominação das consciências, através do exercício da hegemonia, é um momento indispensável para que a classe dominante estabilize uma relação de dominação na sociedade, a estratégia política da classe oprimida deve ser també m o controle da sociedade civil. Neste sentido, as classes populares precisam formar os seus intelectuais orgânicos para a formação de uma hegemonia contrária aos interesses do capital.

Aos intelectuais caberia a função de operar para a ‗organicidade de pensamento‘ dos grupos sociais subalternos, ou seja, contribuir para uma relação coerente entre teoria (concepção de mundo) e ação. A possibilidade da construção coerente dessa relação estaria em um atuar ‗orgânico‘ dos intelectuais nesses grupos, ou seja, de elaborarem e tornarem coerentes os princípios e os problemas que

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os ‗simples‘ colocam com a sua atividade prática. É dessa relação orgânica entre os intelectuais e os ‗simples‘ que nasce a elaboração de uma concepção de vida superior ao senso comum, uma elaboração superior dos grupos subalternos da própria concepção do real. (DURIGUETO, 2014, p. 276) (destaques originais da autora).

Esse conceito nos ajudou a compreender como um grupo de estudantes, intelectuais e militantes políticos se comprometeram com uma proposta educativa e cultural de conscientização das classes populares, fazendo parte da Campanha de Educação Popular da Paraíba, inclusive com vinculação aos partidos políticos de esquerda, buscando exercer um papel diretivo, organizativo e educativo junto a estas populações.

c) Conscientização

A categoria conscientização5, para Paulo Freire, evidencia o processo de construção de uma consciência crítica6 em superação a uma consciência ingênua. A consciência estabelece o agir e o estar no mundo dos sujeitos. O fundamental nesta relação é o jogo dialético das relações homem-mundo.

O processo de conscientização requer que os homens7 reconheçam-se enquanto seres que estão no mundo – e com o mundo – que assumam o papel de sujeitos que fazem e refazem o mundo, portanto, sujeitos de transformação. A conscientização não está baseada sobre a consciência de um lado, e o mundo, de outro. Ao contrário, está baseada na relação consciência-mundo.

Freire (1983) denominava três fases no desenvolvimento da consciência dos indivíduos8: intransitiva, transitivo-ingênua e transitivo-crítica, afirmando que a última só se daria pela educação libertadora.

5

Paulo Freire esclarece que não é ele o autor do vocábulo conscientização. Foi no Instituto Superior de Estudos do Brasil – ISEB, que ele ouviu pela primeira vez este vocábulo e seu significado. A difusão internacional da expressão, diz Paulo Freire, se deve ao trabalho de Dom Hélder Câmara que a tornou conhecida, sobretudo, nos Estados Unidos da América e na Europa (FREIRE, 2001, p. 29). 6 A criticidade, para Freire (1983, p.61), implica na ―apropriação crescente pelo homem de sua posição no contexto. Implica na sua inserção, na sua integração, na representação objetiva da realidade‖.

7

O termo homem foi usado para manter a originalidade da obra citada no texto, todavia, o próprio Paulo Freire, reconheceu posteriormente, que se referia a homens e mulheres, e, portanto, utilizar apenas o termo masculino refletia uma visão sexista da linguagem. Posto isto, sempre faremos referência ao masculino e feminino no texto.

8

Esta posição será reestruturada nas suas obras posteriores, reconhecendo que não existe conscientização sem práxis transformadora da realidade.

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Na ―consciência intransitiva‖, o ser humano enxerga o mundo de forma espontânea. Esse estado da consciência é marcado pela centralização dos interesses do homem na sua existência biológica e pela incapacidade de apreensão dos problemas situados além de sua esfera biologicamente vital (FREIRE, 1983). Todavia, isso não significa uma impossibilidade de mudança, pois,

[...] o conceito de ‗intransitividade‘ não corresponde a um fechamento do homem dentro dele mesmo, esmagado, se assim o fosse, por um tempo e um espaço todo poderosos. O homem, qualquer que seja o seu estado, é um ser aberto. O que pretendemos significar com a consciência ‗intransitiva‘ é a limitação de sua esfera de apreensão. É a sua impermeabilidade a desafios situados fora da órbita vegetativa. Neste sentido e só neste sentido, é que a intransitividade representa um quase descompromisso do homem com a existência (FREIRE, 1983, p. 60) (destaques originais do autor).

Segundo Freire (1983), na fase da ―consciência transitivo-ingênua‖, o ser humano alarga as esferas de seus interesses e preocupações, aumentando o seu poder de dialogar, não só com os outros homens, mas com o seu mundo. Contudo, essa fase refere-se a um desenvolvimento ingênuo, caracterizando-se pela simplicidade na interpretação dos problemas, pelas explicações mágicas. Essa fase, segundo Freire (1983),

É a consciência do quase homem massa, em que a dialogação mais amplamente iniciada do que na fase anterior se deturpa e se distorce. É exatamente esta distorção da transitividade ingênua – no caso de não promovida à transitividade crítica, que levará o homem ao tipo de consciência que Marcel chama de ‗fanatizada‘ (FREIRE, 1983, p.61). (destaques originais do autor)

Na ―consciência transitivo-crítica‖, o ser humano possui uma relação de profundidade com o mundo e desenvolve uma reflexão prática com relação aos problemas que identifica no seu contexto. E sua intervenção sobre os mesmos se dá na perspectiva de modificá-los. Nesse sentido, portanto,

[...] a criticidade para nós implica na apropriação crescente de sua posição no contexto. Implica na sua inserção, na sua integração, na representação objetiva da realidade. Daí a conscientização ser o desenvolvimento da tomada de consciência. Não será por isso mesmo, algo apenas resultante das modificações econômicas, por grandes e importantes que sejam. A criticidade, como entendemos, há de resultar de um trabalho pedagógico crítico, apoiando em condições históricas propícias (FREIRE, 2001, p. 61).

Ou seja, a passagem da consciência ingênua para a consciência crítica, para Freire (2001), não se daria automaticamente, mas por meio de um trabalho

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educativo. No entanto, não é qualquer educação que promove a conscientização, apenas uma educação crítica e dialogal, que tem como ponto de partida o lugar do oprimido e orientada no sentido de sua libertação desse lugar, ou seja, uma Educação Popular. Pois, para Freire,

A finalidade da educação será libertar-se da realidade opressiva. A educação visa à libertação, à transformação radical da realidade, para melhorá-la, para torná-la mais humana, para permitir que os homens e as mulheres sejam reconhecidos como sujeitos da sua história e não como objetos (GADOTTI, 1999, p. 9).

Portanto, para Paulo Freire, a conscientização não significa um ato mecânico e/ou instantâneo de tomada de consciência da realidade. Segundo Freire (2001) a tomada de consciência sobre a realidade na qual está inserido se dá numa posição ingênua, portanto, ainda não é conscientização. A conscientização implica que ―ultrapassemos a esfera espontânea de apreensão da realidade, para chegarmos a uma esfera crítica na qual a realidade se dá como objeto cognoscível e na qual o homem assume uma posição epistemológica‖ (FREIRE, 2001, p.30).

Assim, estamos compreendendo a conscientização enquanto processo de desenvolvimento crítico da tomada de consciência dos indivíduos acerca de seu papel no mundo, sua posição de classe, e entendendo a educação como o meio pelo qual ocorre a conscientização.

Nesse sentido, Paulo Freire pensou na importância de um processo educativo que levasse os sujeitos a uma posição de tomada de consciência, em especial numa alfabetização que os levasse do estado da ingenuidade à criticidade. Pois,

é preciso que a educação esteja – em seu conteúdo, em seus programas e em seus métodos – adaptada ao fim que se persegue: permitir ao homem chegar a ser sujeito, construir-se como pessoa, transformar o mundo, estabelecer com os outros homens relações de reciprocidade, fazer a cultura e a história. (FREIRE, 2001, p. 45)

Daí sua influência direta e indireta na constituição dos vários movimentos educativos a partir da década de 1960 no Brasil, e em outros países da América Latina e África, onde viveu durante seu exílio. A importância desta categoria analítica também apareceu na proposta da Campanha de Educação Popular da Paraíba, por nós analisada conforme expresso em documentos e nas falas dos sujeitos investigados, inclusive porque um dos documentos importantes para o trabalho da Campanha, e muito investigado pelos os inquéritos militares, denominava-se as ―Dezoito lições de conscientização‖, que eram usadas no trabalho realizado no eixo

(31)

João Pessoa - Sapé. Além disso, na organização do trabalho da Campanha, identificamos que os núcleos de debate organizados pela Ceplar colocavam como finalidade ―formar, informar, conscientizar através da análise dos problemas sociais locais e nacionais‖ (LAGE; PORTO, 1995, p.27, grifo nosso).

1.4 As trilhas da investigação: procedimentos e instrumentos

Muitos foram os obstáculos que enfrentamos ao longo desta pesquisa, tais como medos, limitações, ausência de fontes (documentais e vivas) que, ao mesmo em que se constituíam barreiras, compunham também as motivações para realizá-la.

A abordagem dialética orientou o processo investigativo para três procedimentos de coleta e produção de dados: o estudo exploratório, a análise documental e os relatos orais de memória.

A ―triangulação metodológica‖ foi adotada como um procedimento para obtenção das informações na pesquisa. Flick (2009) afirma que o termo triangulação designa a combinação de diferentes métodos, grupos de estudo, ambientes, períodos de tempo e perspectivas teóricas para lidar com um fenômeno. Para o autor ela tanto pode ser utilizada por meio da aplicação de múltiplos métodos qualitativos, quanto constituir uma mistura destes com procedimentos quantitativos.

Em relação à triangulação metodológica, podem-se usar duas estratégias diferentes, a triangulação de métodos em que se usam escalas diferentes ou formas distintas de obter dados e a entre métodos, em que se usa a combinação de formas de coleta distintas (Flick, 2009). A triangulação presente em nossa pesquisa trata-se do segundo caso referido, na medida em que usamos o estudo exploratório, a análise documental e os relatos orais combinadas para obter informações a respeito de nosso objeto de pesquisa.

Não utilizamos a triangulação como forma de validar ou corroborar os resultados obtidos por diferentes fontes e estratégias, uma vez que a noção de ―verdade‖ não é colocada em questão aqui. Tendo em vista que a realidade é multifacetada, complexa e contraditória, não é possível se atingir uma verdade ―única‖ e ―acabada‖, como bem observa Walter Benjamin: ―Articular historicamente o passado não significa conhece-lo ‗como ele de fato foi‘. Significa apropriar-se de uma reminiscência, tal como ela relampeja no momento de um perigo‖ (BENJAMIN,

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1994, p. 224). Assim, tomamos cada estratégia metodológica a que recorremos como diferentes formas de olhar a realidade, que se complementam possibilitando uma aproximação com o objeto de estudo por diferentes vias.

Como demonstra o esquema abaixo, os três procedimentos adotados constituem o tripé que sustenta e orienta nossa pesquisa.

1.4.1. O Estudo exploratório: a produção acadêmica na temática

A necessidade de aproximação com a temática da Educação Popular, da Ceplar e das Ligas Camponesas, levou-nos a realizar um estudo exploratório sobre a produção acadêmica tratando desta temática. O estudo teve como objetivo central produzir dados primários que oferecessem informações, quantitativas e qualitativas, relevantes para uma compreensão de qual produção acadêmica se tem sobre a temática da pesquisa.

O mapeamento foi realizado em dois contextos de produção acadêmica: o primeiro, de teses e dissertações produzidas no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPB (PPGE/UFPB); o segundo, dos trabalhos apresentados nas reuniões anuais da ANPED9.

9

Sigla da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação. Trata-se de uma sociedade civil, sem fins lucrativos, fundada em 1976 pela iniciativa de alguns programas de pós-graduação da área da educação. A partir de 1979, passou a admitir sócios institucionais e sócios individuais (professores, pesquisadores e estudantes de pós-graduação em educação). O objetivo da Anped é a busca do desenvolvimento e da consolidação do ensino de pós-graduação e da pesquisa

ABORDAGEM DIALÉTICA 1. ESTUDO EXPLORATÓRIO 3. RELATOS ORAIS DE MEMÓRIA 2. ANÁLISE DOCUMENTAL

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A escolha por estes contextos de produção acadêmica se deu pela adoção dos seguintes critérios básicos:

a) o primeiro, por representar a produção acadêmica de pesquisas educacionais em âmbito local – Estado da Paraíba – lócus geográfico da nossa pesquisa. Também por ser um programa de pós-graduação que, desde sua criação, realiza estudos na área da Educação Popular;

b) o segundo, por representar a produção acadêmica de pesquisas educacionais em âmbito nacional, portanto, os dois contextos são lócus epistêmicos privilegiados de produção de conhecimentos sobre Educação, em especial, Educação Popular.

No primeiro caso, das teses e dissertações do PPGE- UFPB, utilizamos duas fontes de acesso ao material: o sítio do PPGE/UFPB e a biblioteca digital da UFPB, no qual realizamos o levantamento da última década – 1977 a 201610; e consulta in loco, de produção bibliográfica que registra a produção discente e docente da criação do Programa em 1977 a 2007 – que retrata os 30 anos de pesquisa do Programa de Pós-Graduação.

Como critério para aproximação do material, utilizamos indicadores vinculados aos conceitos centrais do nosso objeto de estudo: Educação Popular, Movimentos Educativos Populares, Ceplar e Ligas Camponesas, e passamos a organizar o material coletado em quadros. A partir desses indicadores, procuramos organizar e analisar os dados coletados, referenciadas na análise do conteúdo, com ênfase na análise temática Bardin (2016, p. 42), que pode ser definida como:

Um conjunto de técnicas de análise de comunicação visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo as mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção destas mensagens.

No levantamento das teses e dissertações do PPGE/UFPB, pudemos identificar 52 (cinquenta e dois) trabalhos sobre a Educação Popular. Como não nos

na área da educação no país. Atua como fórum de debates das questões científicas e políticas da área, tornando-se referência para acompanhamento da produção brasileira no campo da educação. 10

Incialmente, o recorte temporal levado em consideração para esse levantamento foi o período de uma década anterior ao início desta pesquisa, ou seja, 2006 a 2016. No entanto, em virtude dos poucos trabalhos encontrados neste período, sentimos a necessidade de ampliar o recorte temporal, e nos debruçamos sobre toda a produção de textos acadêmicos do gênero dissertação, produzidos no âmbito do Pós-Graduação em Educação da UFPB de 1977 (criação do programa) até 2016 (início da pesquisa).

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