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Juventudes em debate: uma análise teórica a partir da relação escola, culturas juvenis e gênero.

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Academic year: 2021

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E GÊNERO

Ana Paula Leite Nascimento1

Maria Helena Santana Cruz2

RESUMO

O artigo realiza uma análise teórica sobre a relação escola, culturas juvenis e gênero, objetivando trazer para a arena da discussão os desafi os do diálogo entre as juventudes e os demais sujeitos escolares, dada as contradições e ten-sões cotidianas preponderantes na relação escola e juventudes. Apresenta a intencionalidade de contribuir com referenciais teóricos para o entendi-mento das manifestações e estilos de vida das juventudes na perspectiva de demarcar as possibilidades de enfrentamento da invisibilidade das culturas juvenis na escola. Problematizamos sobre juventudes e sua cotidianidade na

1 Graduada em Serviço Social pela Universidade Federal de Sergipe (UFS/2009). Especialista em Escola e Comunidade (UFS/2010). Mestra em Serviço Social (UFS/2014). Doutoranda em Educação (UFS/2015). Assistente Social do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Sergipe (IFS), lotada no Campus Lagarto. E-mail: paulajcbrasil@yahoo.com.br 2 Professora Emérita da Universidade Federal de Sergipe (UFS). Pós-Doutora em Sociologia da Educação. Doutora e Mestra em Educação (Universidade Federal da Bahia – UFBA). Especialização em Psicologia; Especialização em Modelos de Prática nos Campos de Aplicação do Serviço Social; Especialização em Ciências Sociais. Atualmente é professora dos Programas de Pós-Graduação em Educação (NPGED) e Serviço Social (PROSS). E-mail: helenacruz@uol.com.br

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escola e registramos os elementos teóricos que perpassam a relação escola, culturas juvenis e a categoria gênero. O trabalho caracterizou-se como uma pesquisa bibliográfica. Destacou-se como predominante a natureza quali-tativa da pesquisa. A análise e interpretação dos dados foram realizadas a partir de categorias definidas durante o estudo à luz do referencial teórico. A pesquisa foi norteada pelo método histórico dialético. Como resultados e aspectos conclusivos identificamos a necessidade da instituição escolar abrir campos ao entendimento das suas juventudes adotando a investigação e a escuta como ferramentas que possibilitem ao mesmo tempo a compreen-são das identidades e do comportamento das juventudes, e, ainda atente-se para a necessidade de criar mecanismos que garantam maior visibilidade às culturas juvenis. Em se tratando da categoria gênero e seu entrecruzamento com as expressões das culturas juvenis, destacamos que os marcadores cul-turais das juventudes podem estar associados aos papéis sociais de homens e mulheres, os quais recebem influências no âmbito das relações sociais que se dão na família, na escola e na sociedade em geral.

Palavras-Chave: Juventudes; Escola; Culturas Juvenis; Gênero.

YOUTH IN DEBATE: A THEORETICAL ANALYSIS

FROM THE SCHOOL RELATIONSHIP, JUVENILE

CULTURES AND GENDER

ABSTRACT

This article presents a theoretical analysis of the relation school, youth cul-ture and gender, aiming to bring to the arena of discussion the challenges

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of dialogue between youths and other school subjects, given the contradic-tions and preponderant everyday tensions in the relacontradic-tionship school and youths. It shows the intention to contribute to theoretical frameworks for understanding the manifestations and youth lifestyles in perspective to demarcate the coping possibilities of the invisibility of youth culture in the school. We problematize about youths and their daily lives in school and record the theoretical elements that pervade school relationship, youth cul-tures and gender. The work was characterized as a literature search. It stood out as the predominant qualitative research. The analysis and interpretation of data were taken from the categories defined in the study based on the theoretical framework. The research was guided by the historical dialectic method. As results and conclusive aspects identified the need of the school open fields to the understanding of their youth by adopting research and listening as tools that enable the same time understanding the identity and behavior of youths, and also watch out for the need to create mechanisms to ensure greater visibility to youth cultures. In terms of gender and its inter-section category with the expressions of youth culture, we emphasize that cultural youths markers may be associated with social roles of men and women, which are influenced in the social relationships that occur in the family, school and society in general.

Keywords: Youths; School; Youth Cultures; Genre.

INTRODUÇÃO

Esse artigo se propôs a realizar uma análise teórica sobre a relação escola, culturas juvenis e gênero, objetivando trazer para a arena da discussão os desafios do diálogo entre as juventudes e os demais sujeitos escolares, dada as contradições e tensões cotidianas enquanto características preponderan-tes na relação escola e juventudes. Também apresenta a intencionalidade

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de contribuir com referenciais teóricos para o entendimento das manifesta-ções e estilos de vida das juventudes na perspectiva de demarcar as possi-bilidades de enfrentamento da invisibilidade das culturas juvenis na escola. Nesse sentido, inicialmente problematizamos sobre juventudes e sua coti-dianidade na escola. Em seguida, registramos os elementos teóricos que perpassam a relação escola, culturas juvenis e a categoria gênero.

O trabalho em pauta caracterizou-se como uma pesquisa bibliográfica. O estudo foi norteado pela combinação de elementos explicativos e descriti-vos. Destacamos como predominante a natureza qualitativa desta pesquisa. Para a coleta de dados utilizou-se do levantamento bibliográfico, cons-tituindo-se como procedimento metodológico por excelência na coleta de informações, baseado no objetivo proposto. A análise e interpretação dos dados foram realizadas a partir de categorias definidas durante o estudo à luz do referencial teórico, construído no decorrer da investigação.

Em se tratando dos métodos que proporcionam as bases lógicas da investigação, a pesquisa utilizou-se do método histórico dialético3, o qual

procura captar as mediações que explicam as relações dos complexos com a totalidade para desvendar o real a partir de suas contradições e deter-minações. Para tanto, parte-se dos fenômenos aparentes e através de um processo de abstração, busca-se chegar à sua essência, reproduzindo-se a realidade pesquisada no plano do pensamento, enquanto real pensado. (KOSIK, 1995).

3 Sobre o método de pensamento convém demarcarmos que Marx “[...] inverteu de forma a que não mais procedesse do ‘pensamento puro’, mas dos ásperos fatos da realidade, dando assim ao materialismo o método histórico dialético e um ‘princípio energético’, que procu-rasse não apenas explicar a sociedade, mas transformá-la”. (MEHRING, 2013, p.139).

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1. PROBLEMATIZANDO SOBRE JUVENTUDES

E SUA COTIDIANIDADE NA ESCOLA

Observa-se que há uma diversidade conceitual sobre a categoria juventudes e isso se apresenta como “[...] consequência de determinadas condições sociais e de diferentes representações produzidas para e pelos jovens”. (MARTINS; CARRANO, 2011, p.50). A discussão acerca do que vem a ser a juventude deve começar a partir da desmistificação desta categoria enquanto somente natural e biológica, posto que se configura como uma construção social, variando conforme as diferentes culturas e ainda no inte-rior de cada cultura. (CATANI; GILIOLI, 2008).

Tem-se em Costa (2010, p.95) que

ao longo da história, a concepção de juventude passou por inúmeros rótulos referentes ao comportamento dos jovens de cada época, ora estava relacionada a uma determinada faixa etária; em outros momentos, associado a problemas sociais (delinquência juvenil); noutras vezes, foram vistos, também, como alienados, passivos e, até mesmo, como uma juventude protago-nista das transformações políticas, sociais e culturais em determinada época ou como aqueles que teriam a responsabilidade de transformar a sociedade.

Concordamos com Catani e Gilioli (2008, p.12) quando afirmam

que é possível perceber a categoria “juventude” ao menos conforme dois registros. Os sujeitos ou grupos sociais podem se auto-identificar como jovens ou por-tadores de uma cultura juvenil. Podem, também, ser identificados como tais por outros segmentos etários ou instituições (Estado, família, organizações), que os caricaturizam – elegem um ou alguns traços como

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essência que caracterizaria a juventude. Nesse sentido, pode-se dizer que, para a sociedade, o desafio é definir o jovem, enquanto para o jovem é definir-se diante de si próprio, de seus pares e perante a sociedade. Ambas as formas de identificação costumam aparecer juntas na prática, mas sua distinção é útil para delimitar os contornos que a juventude pode tomar em diferentes contextos sociais, políticos e históricos.

Costa (2010, p.95) alude que “[...] os jovens têm se feito ouvir ou têm chamado a atenção de várias maneiras, com atitudes e hábitos diferentes”. Esta autora pondera ainda que a forma como os jovens desfrutam deste momento de vida é pessoal, demarcando que difere não apenas dos des-frutes, mas também por serem jovens integrados em grupos sociais que influem nos acontecimentos da vida.

Esse estudo parte do pressuposto que “não há apenas uma juventude e uma cultura juvenil, mas várias, que diferem segundo condições sociais e históricas específicas”. (CATANI; GILIOLI, 2008, p.11, grifos originais). Desta feita, tomaremos como base para o estudo proposto o termo juventudes, por conseguinte, trataremos de culturas juvenis, dada a ideia de multiplici-dades que constitui a categoria juventudes.

Sabe-se que “nos territórios culturais juvenis delineam-se espaços de autonomia conquistados pelos jovens e que permitem a eles e elas trans-formar esses mesmos ambientes ressignificando-os a partir de suas práticas específicas”. (MARTINS; CARRANO, 2011, p.45). Nota-se que tal processo é presente no contexto das escolas, haja vista que as instituições escolares são espaços eminentemente juvenis.

Carrano (2013, p.190, grifos originais) assinala que

os jovens recebem espaços da cidade prontos e sobre eles elaboram territórios que passam a ser a extensão dos próprios sujeitos: uma praça se transforma em

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campo de futebol, sob um vão de viaduto se improvisa uma pista de skate; o corredor da escola – lugar origi-nalmente de passagem – faz-se ponto de encontro e sociabilidade.

Tem-se que os diferentes territórios juvenis são lugares simbólicos para o reconhecimento das identidades em comum. Logo, a depender de deter-minado território é que vai se constituindo o grupo de iguais, que notada-mente cria suas próprias políticas de visibilidade pública expressadas pela roupa, pela mímica corporal, por um estilo musical, dentre outras categori-zações. (CARRANO, 2013).

Na relação entre juventude e escola evidencia-se a dificuldade que “os jovens encontram para expressar sua maneira de ser e agir em seu cotidiano escolar”. (COSTA, 2010, p.94). Avalia-se que essa dificuldade se impõe em virtude dos significados negativos atribuídos ao ser ou comportar-se como jovem, dos quais podemos destacar: ter menos credibilidade, ser conside-rado menos capaz, menos experiente, precipitado, instável etc. (CATANI; GILIOLI, 2008).

Salienta-se que

a escola conta com mecanismos de silenciamento que promovem a invisibilidade das práticas que não se encaixam nos cotidianos escolares institucionalizados e pouco abertos para as expressividades das culturas juvenis. Nesse contexto, o jovem é homogeneizado na condição de aluno que necessita responder positiva-mente aos padrões do “ser estudante” que a instituição almeja. (MARTINS; CARRANO, 2011, p.45).

No diálogo entre os sujeitos escolares constata-se que os limites e bar-reiras que se mantém no espaço escolar não permitem que as reivindica-ções juvenis sejam ouvidas na medida em que o valor que elas possuem

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é menosprezado, especialmente em decorrência dos representantes dos sistemas educacionais não conseguirem lidar com as diferenças juvenis e por não compreenderem a existência de diversidades de gênero, étnica, regional, religiosa, de orientação sexual, dentre outras, inerentes aos jovens como a todo ser humano (COSTA, 2010).

Cabe ainda registrar que

por mais paradoxal que seja, encontra-se ainda pre-sente na concepção da maioria dos educadores das instituições de ensino brasileiras a visão estereotipada de juventude, que teve influência médica e biológica. Esses profissionais desconhecem, ou mesmo ignoram, as singularidades e diversidades presentes nos diver-sos tempos e espaços do ser jovem. Não os concebem como sujeitos construtores do seu processo de forma-ção, no qual a expressão, a estética, a socializaforma-ção, a música, os vínculos, o corpo, a afetividade, a forma de se vestir, de falar e de se organizar encontram-se imbri-cados nas tramas das relações sociais. (LIMA; LIMA, 2012, p.224).

Demarca-se que a invisibilidade imputada pela escola aos jovens “ao traduzi-los apenas à condição de alunos contribui para adjetivá-los nega-tivamente sempre que expressem suas identidades através de marcadores culturais próprios desse período da vida”. (MARTINS; CARRANO, 2011, p.52).

Corroboramos com Carrano (2013, p.191) quando assinala que:

[...] marcas se relacionam com processos de represen-tação, verdadeiras objetivações simbólicas que per-mitem distinguir os membros dos grupos no tempo e no espaço. As marcas podem ser objetivadas no pró-prio corpo (uma tatuagem) ou mesmo habitar o corpo como adereço de identidade, tal como acontece com os bonés que se transformaram em fonte de tensão

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permanente em algumas escolas que não toleram seu uso, talvez por não enxergarem que esses são signos que representam a extensão da própria subjetividade dos jovens alunos, que reagem ao terem de deixar “parte de si” fora do espaço-tempo da escola.

Considerando o campo de tensões das práticas escolares é premente a necessidade de criar diálogo nas esferas educacionais que “não se baseiem em uma obediência autoritária que enquadre os jovens em normas discipli-nadoras escolares, mas que se desenvolvam nesse espaço escolar um equi-líbrio [...] entre as partes” (COSTA, 2010, p.99).

2. TRAZENDO À BAILA ELEMENTOS TEÓRICOS

QUE PERPASSAM A RELAÇÃO ESCOLA, CULTURAS JUVENIS

E A CATEGORIA GÊNERO

Na perspectiva de atender ao propósito deste artigo, cabe registrarmos neste tópico o marco teórico preliminar relevante para o estudo em discus-são. Desta feita, trataremos de algumas categorias4 e reflexões teóricas que

nos apropriamos no decurso da pesquisa bibliográfica.

A problematização acerca da relação entre escola e juventudes nos remete ao entendimento sobre a vida cotidiana. De acordo com Heller (2008, p.31-32, grifos originais):

4 Para Marx “as categorias são formas de ser, determinações da existência”. As categorias, diz ele, “exprimem [...] formas de modos de ser, determinações de existência, frequentemente aspectos isolados de [uma] sociedade determinada” – ou seja: elas são objetivas, reais (per-tencem à ordem do ser – são categorias ontológicas); mediante procedimentos intelectivos (basicamente, mediante a abstração), o pesquisador as reproduz teoricamente (e, assim, também pertencem à ordem do pensamento – são categorias reflexivas). Por isto mesmo, tanto real quanto teoricamente, as categorias são históricas e transitórias [...]. (NETTO, 2009, p. 685).

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a vida cotidiana é a vida do homem inteiro; ou seja, o homem participa na vida cotidiana com todos os aspectos de sua individualidade, de sua personalidade. Nela, colocam-se “em funcionamento” todos os seus sentidos, todas as suas capacidades intelectuais, suas habilidades manipulativas, seus sentimentos, paixões, idéias, ideologias. O fato de que todas as suas capa-cidades se coloquem em funcionamento determina também, naturalmente, que nenhuma delas possa realizar-se, nem de longe, em toda sua intensidade. O homem da cotidianidade é atuante e fruidor, ativo e receptivo, mas não tem nem tempo nem possibilidade de se absorver inteiramente em nenhum desses aspec-tos; por isso, não pode aguçá-los em toda sua intensi-dade. A vida cotidiana é, em grande medida, heterogê-nea; e isso sob vários aspectos, sobretudo, no que se refere ao conteúdo e à significação ou importância de nossos tipos de atividade.

No caso deste estudo a ênfase centra-se na percepção de como as juventudes participam da vida cotidiana, particularizando as evidências desta participação no contexto da escola, espaço de diferentes manifesta-ções das juventudes. A escola é tomada pela lógica da cultura do adulto, a cultura dominante, e, atribuímos ao imperativo desta cultura a razão da invisibilidade das culturais juvenis nas instituições escolares.

Alude-se que “o adulto deve dominar, antes de mais nada, a manipula-ção das coisas (das coisas, certamente, que são imprescindíveis para a vida da cotidianidade [...])”. (HELLER, 2008, p.33). Assim, convém salientar que o que se procura “padronizar como sendo a principal característica da juven-tude – a rebeldia – pode ser explicada como uma forma de assumir alguma postura diante da cultura dominante, no caso, a dos adultos e, porque não dizer, a escolar”. (MARTINS; CARRANO, 2011, p.52-53).

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Em se tratando da legitimidade e importância do estudo das expressões e manifestações culturais das juventudes, corroboramos com Guimarães e Duarte (2011, p.144-145, grifos originais):

a investigação das diferentes manifestações grupais e individuais dos jovens nas sociedades contemporâ-neas exige, em virtude das transformações operadas nas várias dimensões da vida cotidiana, esforços teó-rico-metodológicos dos estudiosos para decifrar os modos de sociabilidade criados e recriados por esses agentes [...]. As instituições formais têm profunda influ-ência sobre os processos sociais, à medida que socia-lização envolve aspectos abrangentes da condição humana, e cada sociedade seleciona o que as novas gerações irão aprender de forma complexa. Qualquer processo de aprendizagem supõe uma seleta esfera de significados, valores e práticas, de acordo com o que se considera como necessário aprender na dinâmica das relações de forças de uma sociedade.

A escola enquanto território constituído majoritariamente por juventu-des abriga uma série de conflitos e tensões entre os sujeitos jovens e os demais sujeitos escolares, haja vista a invisibilidade imputada pela escola às suas diferentes juventudes. Isso, portanto, nos leva a referendar o ques-tionamento assinalado por Carrano (2013, p.192): “até que ponto os jovens podem se identificar com o espaço escolar, considerá-lo interessante e habitar uma instituição que não permite que suas culturas se realizem ou mesmo sejam visíveis?”. Frente a este contexto concordamos que “a com-preensão do processo de socialização contemporânea dos jovens pode contribuir para o diálogo intergeracional no cotidiano escolar”. (CARRANO, 2013, p.192-193).

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[...] a experiência temporal é marcadamente qualita-tiva, e o tempo é percebido pelos indivíduos a partir de marcos significativos que particularizam momentos do fluxo cotidiano. A descontinuidade entre o tempo social e o tempo vivenciado pelos jovens é um dos problemas enfrentados [...] na definição da juventude. Isso reflete, por exemplo, no problema da definição das faixas etárias. Empiricamente, muitos indivíduos caracterizados, bio-fisiologicamente, como jovens, podem estar vivenciando experiências sociais liga-das à faixa etária adulta ou à infância. Essa dualidade temporal, presente na vida dos jovens, torna difícil a demarcação de conteúdos próprios do que se poderia separar, metodologicamente, como um ethos juvenil homogêneo, ou característica genérica da juventude, pois se os jovens trazem e vivenciam o novo, também apreendem e se orientam pelo antigo, pelo tradicional, através do complexo processo de socialização.

Endossamos, portanto, a assertiva da juventude como “um período da vida impossível de ser contemplado como uniforme, pois ele é constituído por diversas maneiras de ser e viver que variam de acordo com o gênero, a faixa etária, a classe, a raça, dentre outros” [...]. (COSTA, 2010, p.95). Deste modo, concordamos que os estudos sobre os jovens devem considerar as diferentes possibilidades de expressão desses sujeitos, isto é, a existência de juventudes. Como nos propomos ao estudo da relação entre escola e juventudes, é imperativo que abordemos brevemente sobre processos culturais, culturas juvenis e identidade, a fim de compreendermos a multiplicidade dos mar-cadores culturais e estilos de vida das juventudes.

A respeito de processos culturais temos a dizer que

[...] genericamente envolvem construção de símbolos, de representações sociais, de significados e de práti-cas constituintes e constituídas do mundo social. As

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culturas se realizam em processos simultâneos, como produção simbólica objetivada em instituições sociais, valores, normas, crenças, e como processos de sub-jetivação que configuram singularidades de agentes sociais. (GUIMARÃES; DUARTE, 2011, p.145).

Para Laraia (2004, p.101) “[...] cada sistema cultural está sempre em mudança. Entender esta dinâmica é importante para atenuar o choque entre as gerações e evitar comportamentos preconceituosos”. A necessidade de compreender a dinamicidade dos sistemas culturais é indispensável no con-texto escolar, posto que neste território manifesta-se a diversidade cultural, com destaque para a diversidade dos sistemas culturais juvenis.

Acerca das culturas juvenis convém demarcar que são configuradas enquanto resultado de formas específicas que os grupos juvenis possuem de resistir, de responder aos padrões sociais excludentes (desses mesmos grupos), como mecanismo de expressar suas identidades, de chamar a aten-ção para seus problemas, suas necessidades. Além desta configuraaten-ção, as culturas juvenis são resultado de relações intergeracionais que numa con-juntura de reprodução social dão continuidade às culturas de gerações pre-cedentes. (MARTINS; CARRANO, 2011).

Pais (1993 apud MARTINS; CARRANO, 2011, p.51, grifos originais) indica que:

a juventude possui duas tendências de análise. Uma delas está relacionada a uma fase da vida, de caráter transitório que parece responder de maneira uniforme e homogênea às questões que se apresentam para a sociedade. É o sujeito que será sem nunca ter sido. Corresponde a um período de preparação, de gesta-ção do ser adulto, por onde todos deverão necessa-riamente passar para ter direito a uma nova vida – o mundo adulto. Desse modo, pode-se crer que a juven-tude seria o mais longo rito de passagem que o homem

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estaria destinado a vivenciar. A outra possibilidade está relacionada ao fato de que cada grupo juvenil pode ser constituído a partir das diferentes realidades sociais nas quais estão submetidos. O desenho de cada cul-tura juvenil poderá ter não só o contorno como tam-bém as cores determinadas pelas questões de classe, relações de poder, diferentes inserções sociais, econô-micas, políticas e culturais assim como pelos interesses específicos de cada grupo. Essas questões estão postas no espaço escolar e precisam ser enfrentadas para que o jovem torne-se sujeito no processo educacional e sin-ta-se como parte importante nesse contexto.

Não obstante o cenário escolar seja marcado por tensões entre os sujei-tos escolares, cabe registrar que a escola é também um espaço em que a sociabilidade se manifesta, a exemplo do que pode ser observado nas rela-ções entre amigos mais próximos (que muitas vezes são considerados até mais próximos do que um irmão), através de uma cumplicidade entre pro-fessor e jovens, bem como através daqueles relacionamentos mais distantes entre colegas. (COSTA, 2010). Destacamos que essa sociabilidade é mediada pelos processos de identificação e ao mesmo tempo de diferenciação entre os sujeitos e grupos que tais sujeitos estão inseridos.

Todo grupo é dotado de uma identidade que corres-ponde à sua definição social, definição que permite situá-lo no conjunto social. A identidade social é ao mesmo tempo inclusão e exclusão: ela identifica o grupo (são membros do grupo os que são idênticos sob um certo ponto de vista) e o distingue dos outros grupos (cujos membros são diferentes dos primeiros sob o mesmo ponto de vista). (CUCHE, 2002, p.177). Desta feita, concordamos que “a necessidade de pertencimento, de certo exclusivismo, de segurança, de desindividualização e de regras,

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emoções, sentimentos e compromissos comuns aproxima os jovens em tri-bos, gerando assim um diferencial identitário” (TOMAZI, 2013, p.54).

A identidade é

um modo de categorização utilizado pelos grupos para organizar suas trocas. Também, para definir a identi-dade de um grupo, o importante não é inventariar seus traços culturais distintivos, mas localizar aqueles que são utilizados pelos membros do grupo para afirmar e manter uma distinção cultural. Uma cultura particular não produz por si só uma identidade diferenciada: esta identidade resulta unicamente das interações entre os grupos e os procedimentos de diferenciação que eles utilizam em suas relações. (BARTH 1969 apud CUCHE, 2002, p.182).

Segundo Moura (2005, p.89) a identidade “nunca é uma certeza dada, nem resulta simplesmente traço do fenótipo, ou seja, da aparência”. Tem-se que “[...] ao longo da vida [...] em meio às interações e identificações com diferentes pessoas e grupos com que convivemos ou travamos contato, construímos nossas identidades [...]”. (MOREIRA; CÂMARA, 2013, p.41).

Na escola a necessidade de pertencimento, os desejos e os sentimentos das juventudes também se impõem, levando, por sua vez, à constituição dos grupos juvenis a partir de elementos e marcadores culturais que possibilitam identificação e diferenciação dos jovens estudantes, associados, por con-seguinte, aos estilos de vida das juventudes presentes no contexto escolar. Verifica-se em Bennet (2000, p.26 apud CAVALCANTE; PINEZI, 2011, p.9) que “o apelo ao consumismo posiciona o poder que dá ao jovem construir estilos de vida alternativos que poderiam ser vividos fora ou em torno da tradicional base de classes sociais e instituições como família, escola e lugar de trabalho”.

Tratando mais especificamente dos estilos de vida das juventudes pre-sentes na escola, na esteira de Peregrino (2007, p. 1 apud Costa, 2010, p.98, grifos originais) podemos compreender

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as diversas maneiras de ser jovem nos espaços esco-lares, que os diferenciam uns dos outros nas maneiras de se expressar e apreciar a vida em meio às múltiplas possibilidades que caracterizam o termo juventude, como, por exemplo, roqueiros, funckeiros, forrozei-ros, punks, pagodeiros; revolucionários, conformistas, “rebeldes sem causa”, militantes; “aviões”, trabalha-dores, estudantes, estagiários; tatuados, modernos, clubbers, darks; “mauricinhos”, “patricinhas”, “fave-lados”, “manos”, “minas”, “sangues” [...]. Inumeráveis expressões de inumeráveis condições de vida.

Carrano (2013, p.185) alerta que “estar atento para os grupos de identidade com os quais os jovens se identificam ou dos quais fazem parte ativamente torna-se condição para o entendimento dos sentidos do agir dos alunos”. Por esta razão concordamos com Dayrell (2007 apud LIMA; LIMA, 2012, p.225):

[...] é preciso diminuir a distância entre o mundo juvenil e o mundo escolar, pois os jovens, na sua diversidade, apresentam características, práticas sociais e modos de vida dentro de um universo simbólico todo próprio. Nesse sentido, cabe aos educadores favorecerem vivên-cias significativas, buscando compreender quem são esses atores e como é constituída a condição juvenil. Os jovens precisam ser compreendidos num contexto mais amplo, como uma categoria sociológica e historica-mente construída. É necessário entender que não existe jovem, mas jovens, nem cultura juvenil, mas culturas juvenis, com suas especificidades, histórias, contextos, necessidades, tempos e espaços próprios e diversos. É imprescindível confirmar que “a escola não pode mais desconsiderar os jovens, nas suas manifestações e nas suas formas de organização, intera-ção, comunicação e expressão”. (LIMA; LIMA, 2012, p.224).

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Convém demarcarmos que a categoria gênero perpassa a cotidianidade das representações das juventudes, implicando, por sua vez, na necessidade de nos apropriarmos da categoria gênero como elemento teórico norteador desse estudo. Trataremos mais especificamente do debate relacionado aos papeis sociais de homens e mulheres por avaliarmos que as manifestações das expressões juvenis se dão também a partir deste referencial.

Sobre o debate com relação aos papéis sociais de homens e mulheres registramos que o processo de compreensão e identificação destes papéis ocorre já na mais tenra idade no convívio familiar, bem como nas relações estabelecidas na escola e nos diferentes espaços de relações sociais em que os sujeitos sociais estão inseridos. Dias (2014, p.47) assinala que “[...] a dis-cussão entre os lugares masculinos e femininos e o papel que esses pode-riam exercer dentro e fora da esfera doméstica foram demarcados historica-mente”. Nesse sentido, é importante pontuarmos que:

em muitas [...] “culturas ocidentais” as pessoas come-çam a aprender desde cedo alguns aspectos relativos à questão do gênero, como a de que a feminilidade está relacionada à responsabilidade pelo lar e pela prole enquanto que a masculinidade está relacionada à res-ponsabilidade pelo sustento do lar. A partir de constru-ções como estas, surgem os estereótipos e preconcei-tos relacionados a vários aspecpreconcei-tos da vida, entre eles, aqueles relacionados ao trabalho, como por exemplo, qual tipo de trabalho deve ser realizado por homens e qual tipo de trabalho deve ser executado por mulhe-res. (FERREIRA, 2000 apud FEITOSA et al, 2013, p.84). Heilborn (1999 apud BELO; SOUZA; CAMINO, 2010, p.24) aponta que

em muitas [...] “culturas ocidentais modernas”, por exemplo, as pessoas aprendem desde cedo concep-ções como a de que as meninas são dóceis, enquanto

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os meninos devem ser assertivos. Daí, são reforçadas as diferenças sob a forma de estereótipos sexistas rela-tivos aos mais diversos aspectos; o trabalho é um deles. Acerca da diferença de papéis sociais de homens e mulheres referenda-mos os argumentos elencados por Cruz (2005, p. 41):

o caráter da diferença atribuído às mulheres se situa especialmente no campo representacional e, por con-seguinte, a divisão sexual do trabalho é um processo que não se limita a indicar o lugar de homens e mulhe-res nas estruturas ocupacionais, perfis de qualificação e tipos de postos de trabalho. A qualificação é uma cons-trução social fortemente sexuada e o sistema de sexo/ gênero é uma dimensão fundamental do processo de construção de categorias que estruturam a definição de postos de trabalho e de perfis de qualificação e de competências a eles associados.

Desta feita, vale ressaltarmos que a escolha da área da qualificação e/ ou da profissão tem uma série de influências que certamente perpassa pela questão de gênero. Neste ponto corroboramos com Santos, Canever e Frotta (2011, p.348, grifos nossos):

dentre os fatores que podem ser considerados influen-ciadores dessa escolha [profissional], podemos citar o ambiente familiar, os amigos, a situação social, a empregabilidade, a experiência profissional (se tiver) e a questão de gênero. Este último fator parece bas-tante pertinente nas escolhas, visto que apesar de os cursos de graduação [e de qualificação profissional] não apresentarem mais exigências quanto ao gênero de seus futuros acadêmicos, as mulheres ainda ten-dem a escolher profissões consideradas femininas e os

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homens a escolher profissões que atendem à comuni-dade masculina.

O debate dos papéis sociais de homens e mulheres implica na necessi-dade de entendimento da divisão sexual do trabalho5. Com relação à

divi-são sexual do trabalho demarcamos que “[...] é uma categoria de análise marxista que procura explicitar as relações sociais de gênero e a divisão sexual presentes nas relações de trabalho”. (CRUZ, 2005, p.40). Para esta dis-cussão nos apropriamos do estudo de Hirata e Kergoat (2007, p.599-600):

a divisão sexual do trabalho é a forma de divisão do trabalho social decorrente das relações sociais entre os sexos; mais do que isso, é um fator prioritário para a sobrevivência da relação social entre os sexos. Essa forma é modulada histórica e socialmente. Tem como características a designação prioritária dos homens à esfera produtiva e das mulheres à esfera reprodu-tiva e, simultaneamente, a apropriação pelos homens das funções com maior valor social adicionado (polí-ticos, religiosos, militares etc.). Sobre essa definição, todo mundo, ou quase, está de acordo. Contudo, do nosso ponto de vista, era necessário ir mais longe no plano conceitual. Por isso, propusemos distinguir

5 Partimos da prerrogativa que “o trabalho [...] é uma categoria central para compreensão do próprio fenômeno humano-social”. (NETTO; BRAZ, 2006, p.29). Para Marx “o trabalho é o fundamento ontológico-social do ser social; é ele que permite o desenvolvimento de mediações que instituem a diferencialidade do ser social em face de outros seres da natu-reza”. (BARROCO, 2006, p.26). O trabalho é “constitutivo do ser social, mas o ser social não se reduz ou esgota no trabalho. Quanto mais se desenvolve o ser social, mais as suas obje-tivações transcendem o espaço ligado diretamente ao trabalho”. (NETTO; BRAZ, 2006, p.43, grifo dos autores). O trabalho configurado como “uma condição de existência do homem, independente de todas as formas de sociedade; é uma necessidade natural eterna, que tem a função de mediatizar o intercâmbio orgânico entre o homem e a natureza, ou seja, a vida dos homens”. (LUKÁCS, 1972, p. 16).

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claramente os princípios da divisão sexual do tra-balho e suas modalidades. Essa forma particular da divisão social do trabalho tem dois princípios organi-zadores: o princípio de separação (existem trabalhos de homens e trabalhos de mulheres) e o princípio hierárquico (um trabalho de homem “vale” mais que um trabalho de mulher). Esses princípios são válidos para todas as sociedades conhecidas, no tempo e no espaço. Podem ser aplicados mediante um processo específico de legitimação, a ideologia naturalista. Esta rebaixa o gênero ao sexo biológico, reduz as práticas sociais a “papéis sociais” sexuados que remetem ao destino natural da espécie. Se os dois princípios (de separação e hierárquico) encontram-se em todas as sociedades conhecidas e são legitimados pela ideo-logia naturalista, isto não significa, no entanto, que a divisão sexual do trabalho seja um dado imutável. Ao contrário, ela tem inclusive uma incrível plasticidade: suas modalidades concretas variam grandemente no tempo e no espaço, como demonstraram fartamente antropólogos e historiadores(as). O que é estável não são as situações (que evoluem sempre), e sim a distân-cia entre os grupos de sexo.

Cumpre salientarmos ainda que

a divisão sexual do trabalho assume formas conjun-turais e históricas, constrói-se como prática social, ora conservando tradições que ordenam tarefas masculi-nas e tarefas feminimasculi-nas na indústria, ora criando moda-lidades da divisão sexual das tarefas. A subordinação de gênero, a assimetria nas relações de trabalho mas-culinas e femininas se manifesta não apenas na divisão de tarefas, mas nos critérios que definem a qualifica-ção das tarefas, nos salários, na disciplina do trabalho.

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A divisão sexual do trabalho não é tão somente uma conseqüência da distribuição do trabalho por ramos ou setores de atividade, senão também o princípio organizador da desigualdade no trabalho. (LOBO, 1991 apud CARLOTO, s.d, n.p).

Com relação à categoria gênero endossamos a assertiva de que gênero é “um elemento constitutivo de relações sociais baseado nas diferenças per-cebidas entre os sexos, e o gênero é uma forma primeira de significar as relações de poder”. (SCOTT, 1990, p.21). Tem-se em Dias (2014, p. 70) que “as relações de poder têm um significado natural de ação dominadora”, haja vista que “o poder pode ser visto sob duas perspectivas: o poder como capacidade de agir sobre as coisas e o poder como capacidade de determinar o comportamento de outros”. (PARO, 2010, p.33, grifos do autor apud DIAS, 2014, p.70). Essas relações de poder também são latentes no cenário esco-lar e permeiam as relações cotidianas das juventudes e dos demais sujeitos escolares, determinando significativamente o processo de normatização da conduta de meninos e meninas na escola.

Nas relações sociais cotidianas identificamos que a predominância da ideologia patriarcal ainda perdura, o que não é diferente nas rela-ções sociais estabelecidas na cotidianidade da escola. Quanto ao debate da ideologia patriarcal, cabe destacarmos as reflexões teóricas de Cruz (2005, p.40) que trata do patriarcado identificando-o “como sistema sexual de poder, como a organização hierárquica masculina da socie-dade, que se perpetua através do matrimônio, da família e da divisão sexual do trabalho” e de Castells (1999, p.169) que alude a respeito do patriarcalismo classificando-o como “[...] uma das estruturas sobre as quais se assentam todas as sociedades contemporâneas. Caracteriza-se pela autoridade, imposta institucionalmente, do homem sobre mulher e filhos no âmbito familiar”.

Em se tratando das relações de poder entre os gêneros no campo da edu-cação, concordamos com a afirmativa de Dias (2014, p.69, grifos originais):

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o pensamento de Michel Foucault, em Vigiar e Punir (1987), contribui com outros olhares para explicar as relações de poder entre os gêneros no campo da edu-cação, através da análise da normatização da conduta de meninos e meninas, professores e professoras, bem como a produção dos saberes sobre sexualidade e os corpos nos múltiplos processos educativos, dando forte contribuição para o campo da educação.

Alertarmos aqui que gênero não se refere ao sexo, pois são conceitos distintos e a apropriação teoricamente e criticamente desses conceitos pos-sibilita ressignificar as relações de poder presentes na sociedade, relações, que, por sua vez, exercem determinações na definição dos papéis sociais de homens e mulheres. Na esteira de Musskopf (2008, n.p) sinalizaremos a diferenciação entre sexo e gênero. Vejamos:

Sexo refere-se ao dado físico-biológico, marcado pela presença de aparelho genital e outras características fisiológicas que diferenciam os seres humanos como machos e fêmeas; além destas, a partir de pesquisas recentes, também o código genético precisa ser consi-derado na constituição do sexo, o que complexifica as definições neste âmbito, cujo principal exemplo são as inúmeras formas de intersexualidade. Gênero refere-se ao dado social, formado por um aparato de regras e padrões de construção corporal e comportamento que configuram a identidade social das pessoas a partir do substrato físico-biológico, do que resultam identifica-ções como masculino e feminino, bem como as múltiplas variantes que desviam da norma, como androginia, tra-vestismo, efeminação ou masculinização, por exemplo. Isto posto, nos cabe referendar que o termo gênero foi proposto como “uma alternativa ao termo sexo, pois homens e mulheres, masculino e

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feminino são categorias sociais historicamente produzidas que não devem ser reduzidas a uma categoria biológica”. (MACHADO, 1999 apud SANTOS; CANEVER; FROTTA, 2011, p.349). É mister demarcarmos que gênero não se resume a uma “categoria de análise, como muitas estudiosas pensam, não obstante apresentar muita utilidade enquanto tal. Gênero também diz res-peito a uma categoria histórica, cuja investigação tem demandado muito investimento intelectual”. (SAFFIOTI, 2004, p. 45, grifo original).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Asseveramos que “desde a primeira reação da sociedade em classificá-los

[as juventudes] como ‘desviantes’, ‘anormativos’, ‘exóticos’, passaram-se déca-das até que começassem a ser reconhecidos como sujeitos sociais legítimos e relevantes”. (CATANI; GILIOLI, 2008, p.105, grifos nossos). Avaliamos que a escola também deve ser este espaço em que as juventudes possam ter suas expressões e manifestações reconhecidas como legítimas e relevantes. Isso nos impulsiona a ratificar que as instituições escolares devem “repensar a realidade dos sujeitos, tanto nos aspectos materiais como simbólicos, vendo as manifestações juvenis como legítimas, dignas de estudo, de compreensão ou de apropriação educativa”. (GUIMARÃES; DUARTE, 2011, p.145).

Urge, portanto, a necessidade da instituição escolar abrir campos ao entendimento das suas juventudes adotando a investigação e a escuta como ferramentas que possibilitem ao mesmo tempo a compreensão das identidades e do comportamento das juventudes, e, ainda atente-se para a necessidade de criar mecanismos que garantam maior visibilidade às cul-turas juvenis.

No que se refere ao debate acerca da categoria gênero e seu entre-cruzamento com as expressões das culturas juvenis, destacamos que os marcadores culturais das juventudes podem estar associados aos papéis sociais de homens e mulheres, os quais recebem influências no âmbito das

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relações sociais que se dão na família, na escola e na sociedade em geral. Identificamos que a depender das bases que fundamentam tais influências os resultados da caracterização dos papéis sociais de homens e mulheres são diferentes, podendo ter resultados de reforço ao escopo das posturas discriminatórias centradas no patriarcalismo, que acabam por segmentar escolhas e cargos profissionais das juventudes em função apenas da dife-rença biológica entre os sexos. Como resultado também podem aparecer determinadas posturas que partem do pressuposto de que gênero pode designar diferenças entre os sexos, mas também se relaciona às caracte-rísticas individuais de cada grupo sexual, ou seja, o gênero não fica restrito somente a questão biológica.

Desta feita, ponderamos que se apropriar teoricamente e criticamente de alguns conceitos nos possibilita ao mesmo tempo significar e ressignifi-car relações de poder latentes na sociedade, o que se apresenta como pri-mordial mais especificamente em se tratando da compreensão das relações de gênero em virtude de historicamente sempre terem se constituído como guetos sexuais.

Recebido em agosto de 2016 Aprovado em outubro de 2016.

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Referencias

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